por Serge Schmemann
Este caderno especial reúne os frutos de nossa pesquisa anual sobre “fatores de mudança”, ou seja, eventos, tendências, invenções e ideias que mudarão o rumo de nossas vidas. Descobrimos vários, todos importantes, mas, no fim, 2016 entrará para a história como o momento que revelou a profundidade de nossos medos, de nossa alienação e toda a frustração dos nossos tempos, alterando abruptamente muitas de nossas suposições para o futuro.
Talvez devêssemos ter previsto o que estava por vir. O populismo e o nacionalismo vêm se espalhando por vários cantos do mundo, alimentado pela frustração das pessoas e pela globalização, pela perda da identidade e das certezas morais, pelo medo do terrorismo e das hordas de refugiados. Democracias liberais se fecharam, defensivas, antes que crescesse a popularidade de governantes autoritários. O voto britânico aprovando a separação da Europa sinalizou o poder dessas mudanças; e aí veio a eleição norte-americana.
Como a queda do Muro de Berlim, exatamente 27 anos antes, a eleição de Donald J. Trump para presidente dos EUA foi um cataclisma que acabou reunindo vários movimentos, tendências e sinais quase imperceptíveis que acabaram indicando bruscamente uma mudança irrevogável no rumo de nossa vida. Em 1989, tínhamos certeza de que era para melhor; desta vez, não sabemos.
O que não deixa de ser assustador, pois o que vem por aí talvez nem sempre será bonito de se ver. Porém, desde que o mundo é mundo as coisas sempre progrediram na marra, aos solavancos; e quando se lê os fatores de mudança desta seção, fica evidente que há coisa demais mudando em todas das frentes – clima, robótica, cultura, Hollywood, exploração, política – para que um único líder, ou um único país, ou mesmo um único movimento populista reverta ou impeça essas mudanças por muito tempo.
Podemos lastimar ou dar as boas-vindas à revolução digital, à chegada dos carros autônomos, à mudança social ou o movimento em massa dos povos, mas não podemos impedi-los ou pará-los. O que podemos fazer é tentar fazer com que essas mudanças ajam para melhorar nossa vida e nosso planeta.
O mesmo vale para a democracia. Ela não é uma fórmula fixa de governo, mas sim um estilo de vida que está em constante adaptação e mudança, refletindo nossas maiores esperanças e piores medos – que, no momento, estão à tona, mas, com o tempo, a esperança sempre prevalece.
Por isso, mesmo com esse fator de mudança mais chocante de todos, não devemos nos desesperar.
Serge Schmemann é membro do Conselho Editorial do "New York Times"