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Rodriguinho condena de Lula a Bolsonaro, diz que cogita ser político no futuro e pede vaga na seleção de Tite

Diego Salgado e Gabriel Carneiro Do UOL, em São Paulo
Arte/UOL sobre foto de Paulo Camilo/UOL Esporte

Rodriguinho foge do clichê do boleiro. Se veste de outra forma e não ostenta tatuagens ou brincos. É um caso raro de jogador de time grande que desabrochou na carreira perto dos 30 anos e atingiu um nível que lhe permite sonhar com a Copa do Mundo na Rússia. A disputa com Arthur, Giuliano, Lucas Lima, Taison, Talisca e outros por um lugar na lista de Tite não é mole, mas poucas coisas foram moles para o melhor jogador do Corinthians.

Esta é a história atípica de quem parecia que ia dar errado, mas está dando certo. De quem lidera uma geração contestada, mas campeã. De quem impôs que uma patrocinadora pessoal ajudasse um projeto social na renovação de seu contrato. De quem troca a sinuca nas concentrações por séries de política e leitura. De um raro caso de atleta de futebol que se posiciona politicamente do lado oposto da maioria. Mais do que isso, fala em se tornar um político no futuro para tentar "tirar o Brasil do buraco".

Ao UOL Esporte, o camisa 26 corintiano falou sobre política. E também falou sobre os motivos da boa fase, seus gols de pé esquerdo, sua reação à mudança tática de Fábio Carille, seu sonho (ainda vivo) de jogar na Europa, a difícil relação com as críticas, o favoritismo corintiano no Brasileirão e até sobre personagens como Sócrates, Jobson, Diogo Vitor, Dudu, Lula e Jair Bolsonaro.

Rodriguinho não se esconde. E antes dos eleitores brasileiros ele tem esperança de ser visto e bem avaliado por um único homem: Tite. Tem seu voto?

"As pessoas deviam acompanhar mais política do que futebol"

Marcello Zambrana/AGIF Marcello Zambrana/AGIF

Nem Lula, nem Bolsonaro

A entrevista com Rodriguinho começou antes mesmo da primeira pergunta. Com a câmera e os gravadores desligados, o jogador corintiano esticou o pescoço para olhar o roteiro dos repórteres. "Vamos falar de política, não é?". Não era uma reclamação. Embora diga que ele mesmo devia estar mais por dentro da política, Rodriguinho desenvolve o tema com naturalidade. 

"O PT fez muita coisa boa pelas pessoas menos favorecidas, por isso que se o Lula saísse candidato seria eleito novamente. Mas acabou sendo manchado pela corrupção. Por isso seria difícil apoiar uma coisa desse tipo", que tampouco se empolga com o outro lado do espectro político. "Não é [bom] ser extremo, tipo Bolsonaro. Um cara que tem uma opinião forte e é muito julgado por isso também. Ser extremo não leva a nada", diz ele. 

Eu acho que se conseguirmos achar um meio termo é bom pra todo mundo

Christof Stache/AFP Christof Stache/AFP

Esquerda ou direita? Rodriguinho concorda com Klopp

Rodriguinho não se define como "de esquerda" ou "de direita". A reportagem, no entanto, comentou com o meia corintiano sobre uma entrevista do técnico Jurgen Klopp, do Liverpool, em que ele diz que jamais votaria na direita e "é de esquerda porque está bem de vida e quer todo mundo bem também". 

É isso que eu penso  

A reação de Rodriguinho entrega como ele pensa sobre política e sobre a próxima eleição. "Se abster do que é bom para você e pensar nas pessoas que não têm as mesmas condições para todo mundo poder subir junto, isso é uma coisa legal que meu candidato, para eu votar, tem que ter".

É a possibilidade de impactar positivamente a vida das pessoas que interessa Rodriguinho, que cogita ser candidato no futuro se as "barreiras" da política não o forçarem a "pular fora". "O que eu gosto nela [política] é pode ajudar as pessoas, é pensar nas pessoas que não têm as mesmas condições que você para todo mundo poder subir junto".

Rodriguinho fora da caixinha

Acho difícil as pessoas entenderem. Tem aquela coisa, é atleta e tem de se cuidar, mas eu acho que na sua folga tem o direito de fazer as coisas que gosta e se sente feliz ao fazer

Rodriguinho

Rodriguinho, sobre a vida extra-campo

Existe muito clichê no futebol. São sempre as mesmas perguntas e a gente fica sempre na mesma linha. Às vezes acabo quebrando um pouco isso para me divertir, acho bem legal

Rodriguinho

Rodriguinho, sobre a mesmice das entrevistas

Primeiro que casa um monte de vezes, 50 aqui, 50 ali... (risos). Vai dividindo muito e é difícil, então tem que ter certa inteligência para poder administrar o seu dinheiro

Rodriguinho

Rodriguinho, sobre jogadores falidos após o fim da carreira

Paulo Camilo/UOL Paulo Camilo/UOL

Maconha é a única dividida que Rodriguinho não encara

As frases sobre baladas, vida financeira dos atletas e até sobre a própria imprensa mostram que Rodriguinho não é de fugir de assuntos polêmicos. Ao longo de toda a entrevista, o meia optou pelo silêncio só uma vez, quando perguntado sobre a legalização da maconha. A favor ou contra?

"Essa aí eu vou ficar fora. Essa aí já é demais", diz Rodriguinho. 

Embora prefira não tomar partido público sobre o assunto, o meia tratou abertamente do caso do santista Diogo Vitor, flagrado em exame antidoping por uso de cocaína. Para ele, o jovem atacante precisa muito mais de apoio que de uma punição. 

"Depende muito dele também, se ele quer sair dessa situação. Então, você tem que ajudá-lo independentemente se ele quer ou não. Você tem que dar oportunidades para ele", disse Rodriguinho, que citou o exemplo do atacante Jobson como alguém que teve novas chances após casos de consumo de drogas sociais e não aproveitou.

Jogadores deviam falar e pensar mais sobre política

Reprodução/Facebook Reprodução/Facebook

Exigiu apoio a projeto social para renovar patrocínio pessoal

Hoje, Rodriguinho é uma espécie de padrinho de um projeto social ligado ao esporte em Natal (RN), cidade onde nasceu. O empreendimento não nasceu de uma ideia do jogador, mas ele se tornou atuante com sugestões de aperfeiçoamento e doações. Uma destas contribuições veio no processo de renovação de contrato de Rodriguinho com a Adidas, empresa de material esportivo que o patrocina.

Estava entre as condições requeridas pelo jogador do Corinthians para estender o vínculo com a empresa alemã que ela ajudasse o projeto com doação de uniformes, chuteiras e bolas. Para ele, é uma espécie de reencontro com o passado, porque tudo acontece no bairro das Rocas, zona leste de Natal, onde ele foi criado em condições simples. "É uma ideia muito grande que eu tenho de participar mais, de fazer mais coisas pelo projeto", diz ele, que fala em construir uma sede cultural do projeto, com aulas de artes e cursos de línguas.

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Sócrates como espelho

Quando um jogador corintiano decide falar de política, é natural lembrar de Sócrates. Rodriguinho nasceu em 1988, quando o Doutor já se encaminhava o fim da carreira. Mesmo assim, o meia trata o mentor da "Democracia Corinthiana" como uma espécie de espelho para ele.

É um cara que admiro bastante, pela história dele, por tudo. Não só pelo atleta, mas como pessoa. Dele querer buscar sempre mais, se aprimorar, e por ser um cara tão inteligente

O corintiano defende também as manifestações políticas de jogadores fora de campo, seja pelas redes sociais ou por meio de entrevistas. Apesar disso, admite que a política aparece pouco nas rodas de conversas dos boleiros corintianos. "A gente fala mais quando está muito em evidência, mas não é um assunto muito recorrente", lembra, citando que a última vez que o assunto pautou o debate nas concentrações do CT Joaquim Grava foi na época da prisão de Lula.

Ale Cabral/AGIF Ale Cabral/AGIF

Qual o tamanho da "era Carille" para o Corinthians?

Três títulos em menos de um ano. Rodriguinho como craque do time em 2018, com golaço marcado contra o Palmeiras e outros gols essenciais diante dos maiores rivais na reta final do Campeonato Paulista. Mas qual é o tamanho desse Corinthians da era Carille e do próprio camisa 26 na história do clube?

Para Rodriguinho, agora é difícil ter noção do que este time está fazendo. O assunto já foi motivo de conversa entre ele e Cássio, veterano que viveu outros grandes times e títulos no clube alvinegro. "Fizemos história, estamos continuando, temos possibilidade de fazer ainda mais, então levo muito para esse lado. Procuro não pensar tanto no que a gente já fez, procuro buscar mais, porque temos possibilidade muito grande esse ano de fazer melhor do que no ano passado".

Sobre si mesmo, Rodriguinho é categórico ao dizer que não pensa nesta questão. Não dá para negar, no entanto, que o status mudou nos últimos tempos. "Reconhecimento, essas coisas... Fico muito feliz. Você não tem noção. Mas é como eu falei, eu quero mais, eu quero mais. Estou me dedicando muito para que possa deixar meu nome mais ainda na história do clube."

Pedro Vilela/Agif Pedro Vilela/Agif

Para dar certo no clube, Rodriguinho teve de mudar

Rodriguinho chegou ao Corinthians em 2013. Jogou pouco, foi emprestado duas vezes no ano seguinte e tinha tudo para virar estatística entre jogadores que chegam e não dão certo. A reviravolta ocorreu no terceiro ano de contrato, quando ele foi um reserva de peso no título brasileiro de 2015 e desabrochou após a saída de Renato Augusto e Jadson. Finalmente titular, ele virou peça-chave após a chegada de Fábio Carille e hoje entende como tudo mudou. 

"Eu tive que amadurecer, óbvio. Aqui no Corinthians prezam muito pela intensidade, de ser aguerrido. Eu não era. Tive que evoluir e chegar num patamar que eu merecesse tudo isso", diz Rodriguinho, em um mea culpa. 

"É muito difícil você chegar aqui e jogar. Até jogadores consagrados levam um certo tempo até poder acostumar e produzir o que podem. Eu cheguei de uma Série B [do América-MG], para um time que era multicampeão, vários jogadores no clube há muito tempo, então seria difícil chegar e já jogar, ainda mais com um treinador que respeita muito essa hierarquia de quem está há mais tempo no clube [Tite]", justifica Rodriguinho, hoje.

Boa fase? "É difícil falar de você mesmo"

Rodrigo Gazzanel/Ag. Corinthians Rodrigo Gazzanel/Ag. Corinthians

Rodriguinho achou estranho ter virado "falso 9"

Sem Jô desde 2017, Fábio Carille inovou antes de um clássico contra o Palmeiras e colocou Rodriguinho como um "falso 9". O camisa 26 não entendeu. "O Carille chamou a gente na sala e explicou a situação. Eu fiquei olhando para o quadro e falei: 'Será que isso vai dar certo?'. Porque a gente não teria nenhum cara de referência ali, e estávamos jogando há mais de um ano assim. Eu achei meio estranho", admite.

Rodriguinho foi o destaque do jogo, com direito a golaço driblando Borja e Antônio Carlos. Hoje, ele tem consciência de que esse esquema, o 4-2-4, ajudou na sua própria evolução. "Ele [Carille] foi muito feliz no que ele fez, tanto que estamos jogando assim até agora. Eu estou fazendo gol para caramba [risos]", disse o meia. 

Daniel Augusto Jr. / Ag. Corinthians Daniel Augusto Jr. / Ag. Corinthians

Aos 30, ainda tem o sonho de jogar na Europa

Quando tinha 28 anos e ainda não estava no nível atual, Rodriguinho deu uma entrevista dizendo que pensava em jogar só até os 33 ou 34. O problema é que ele está no auge aos 30. E agora?

O meia riu quando lembrado da declaração. Em time grande há apenas seis temporadas, ele se lembra dos planos traçados quando ainda defendia ABC, Bragantino ou América-MG para dizer que não dá mais prazo para pendurar as chuteiras. "Só o tempo vai dizer, não tem jeito. E a condição que eu estiver também. Eu pretendo jogar o máximo que eu puder, porque eu gosto, me dá muito prazer", diz o jogador, que não tem histórico de lesões graves e acha que "o corpinho aguenta um tempo mais".

O menino que via Libertadores e Mundial só pela TV há poucos anos já realizou a maioria de seus sonhos dentro do futebol. Um dos que não foram realizados é o de jogar na Europa. Até agora foram seis clubes na carreira, e só um fora do Brasil: o Al-Sharjah, dos Emirados Árabes. Como decidiu "prolongar" a vida útil, uma nova experiência longe de casa não está descartada.

Se eu perdi ansiedade de jogar na Europa? Não. Estou ficando velhinho, mas acho que ainda dá tempo. Vamos ver isso aí. Mas não é uma coisa que vai me deixar triste se não acontecer, por exemplo, porque a grandeza que tem o Corinthians já me deixa satisfeito com o que tenho aqui, com uma representatividade grande.

Rodriguinho

Rodriguinho, Meia do Corinthians, sobre sonho de jogar na Europa

"Rodriguices"

Reprodução/Instagram Reprodução/Instagram

Redes sociais

Rodriguinho é avesso às redes sociais e bem discreto no Instagram - ele mesmo postava fotos em um perfil, mas passou a ter um novo em agosto de 2017. A conta é gerida por seu irmão mais novo, Alexandre, que é advogado e mora em Natal. O perfil leva o nome de "Reidriguinho" e tem um viés cômico. O irmão de Rodriguinho, aliás, é um espécie de assessor de imprensa do jogador e manda para ele tudo o que sai na mídia.

Reprodução/Instagram Reprodução/Instagram

Camisa 26

O número 26 do Corinthians é de Rodriguinho por um questão de superstição. E ele chegou às mãos do meio-campista por acaso, depois de uma temporada com o 17. "Deu uma zica da porra, não fiz gol, não fiz porra nenhuma", contou. No ano seguinte, ele foi questionado sobre usar ou não o 17 de novo. "Eu ia pedir a 27, dia do meu aniversário, mas já tinha [dono]. Aí falei 'dá a 26 mesmo' e ficou a 26", explica.

Nelson Almeida/AFP Nelson Almeida/AFP

Mal-entendido

Uma declaração de Rodriguinho sobre a premiação recebida pelos jogadores do Corinthians pela conquista do Paulistão gerou confusão um dia depois da final com o Palmeiras. Algumas pessoas entenderam que ele tinha se referido ao rival. O meia foi acordado cedo no dia seguinte à declaração e teve de explicar o sentido da declaração. "Não sei o que acontece lá (no Palmeiras) e nem quero saber também".

Divulgação/Netflix Divulgação/Netflix

Sinuca x Netflix

Rodriguinho nunca está nos vídeos postados por jogadores do Corinthians em concentrações jogando sinuca, ping pong ou cartas. Reservado, ele diz que fica no quarto lendo ou assistindo seriados no tempo livre. Dois de seus preferidos são Vikings, sobre a sociedade nórdica do século 9, e Designated Survivor, que mostra bastidores da política e da presidência dos Estados Unidos por meio de uma narrativa ficcional.

O sonho de estar na Copa da Rússia

Ale Cabral/AGIF Ale Cabral/AGIF

Corinthians atual e sua relação complicada com os críticos

A relação desta geração de jogadores do Corinthians com a crítica nunca foi fácil. No percurso até o título brasileiro de 2017, #NuncaFoiFácil foi uma campanha de marketing do próprio Corinthians, exaltando a dificuldade de um título que já parecia garantido desde o fim do primeiro turno. Da mesma forma, #PrimeiraForça foi a marca do Paulistão de 2017 e #BicampeãoDaFé estampou o Paulistão de 2018, em mais uma tentativa de demonstrar força diante dos críticos. Um grupo de jogadores contestados comandado por um treinador que só chegou à função por falta de opções já ganhou três títulos em um ano e meio. E ainda não aprendeu a ser chamado de favorito.

"Isso é cultural do futebol, de querer jogar a responsabilidade para os outros. Corintiano também sempre foi muito sofredor, tem esse lado, por isso que rolam coisas desse tipo, "nunca foi fácil". Mas nossa equipe já demonstrou que para ser derrotada é muito difícil, porque é uma equipe consistente, concentrada, que toma poucos gols, então num campeonato de pontos corridos isso é muito valioso. No mata-mata se pegar um dia ruim, jogo ruim, pode ser desclassificado basicamente nesse jogo. Mas em pontos corridos, como é o Brasileiro, nossa equipe se comporta bem tanto dentro de casa quanto fora", conta Rodriguinho, que em 2018 decidiu assumir a bronca.

Entramos como favoritos para ser campeões outra vez, sim. Eu não tenho problema em assumir favoritismo

Isso não significa, no entanto, que as porradas levadas no caminho são ignoradas. E não só da imprensa. "A paixão é uma linha muito complicada, um dia o cara te ama, no outro te odeia. Para mostrar que não é só aqui tem o Dudu, do Palmeiras, que foi hostilizado na Argentina agora há pouco, mas há um tempo atrás tinha sido ovacionado por ficar no Palmeiras e rejeitado a proposta da China. Meses depois já esqueceram. É difícil, mas temos que aprender a conviver com isso, porque é uma gangorra grande e temos que nos manter sóbrios", diz o jogador que já foi alvo de ironia de comentaristas, protestos, correu de invasão de torcedores ao CT, apagou conta no Instagram por causa do excesso de xingamentos e superou a fama de baladeiro para triunfar.

Para ser sincero, eu não ligo muito. Porque quando vem o resultado não tem jeito, por mais que alguém tenha falado que nossa equipe não era boa, vai ter que dar o braço a torcer quando o resultado vier. É o que estamos conseguindo fazer, já ganhamos o Paulista, o Brasileiro, o Paulista esse ano de novo, estamos bem nas competições que disputamos. Eles acabam se calando por si só.

Rodriguinho

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