A terceira via

Com Alisson e Ederson garantidos, por que os brasileiros se importam com quem será o terceiro goleiro de Tite?

Giancarlo Giampietro e Vanderlei Lima Do UOL, em São Paulo
Pedro Martins/MoWa Press

Há vagas?

Em fevereiro, o técnico Tite revelou ao UOL Esporte que já tinha 15 nomes definidos para a seleção que vai disputar a Copa do Mundo. Ou seja, 65% do grupo. A convocação para os amistosos contra Rússia e Alemanha deu indícios de que mais alguns jogadores também estão bem perto de uma garantia. Mesmo que poucas, porém, ainda há vagas disponíveis. Entre elas, a de terceiro goleiro, um papel bastante peculiar em qualquer delegação.

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Figura redundante?

O terceiro goleiro pode ser a figura mais redundante do elenco. Num torneio curto, esse profissional talvez só apareça para a foto oficial da delegação. Não seria necessária, então, a realização de um plebiscito nacional para defini-lo. Mas estamos falando da seleção brasileira e toda e qualquer escolha em torno do time é capaz de suscitar horas e horas de debate.

Ainda mais quando o assunto é o goleiro: desde 1970, quando a Fifa tornou obrigatória a convocação de três jogadores para a função, só dois atletas foram titulares sem ter experiência no banco de reservas em Copas anteriores. Essas exceções são Taffarel (1990, 94 e 98) e Marcos (2002). Em 2018, Alisson deve ser o terceiro.

“Eu fui técnico, mas minha essência é o gol. O problema é o seguinte: nem todos os técnicos pensam da mesma forma. Cada um tem seus goleiros de confiança”, disse Emerson Leão, titular nas Copas de 1974 e 1978 e, curiosamente, terceiro goleiro em 1970 e 1986. Ele é o exemplo vivo de como se trata a escolha do homem para essa função.

Algumas escolas pregam que o escolhido seja um jovem promissor, convocado para ganhar experiência visando as próximas edições. Leão foi esse cara em 1970. Outra linha prefere usar a vaga com atletas mais experientes, alguns realmente veteranos, para dar mais estofo para o grupo em um torneio tão importante. Leão, por coincidência, foi esse cara em 1986.

Tá na regra

Essa história começou no México. A convocação de três goleiros passou a ser regra na Copa de 1970, obedecendo ao artigo 26.3 do regulamento do torneio. Em edições anteriores, de todo modo, algumas seleções já haviam chamado um trio, descartando um atleta de linha.

No Brasil, a escolha já foi pelos jovens, garotos chamados pensando em Mundiais futuros. Como se assistir a uma Copa do Mundo do banco de reservas fosse uma "escolinha". Leão foi o garoto escolhido por Zagallo na lista da seleção tricampeã. Esse perfil de escolha se repetiu com Waldir Peres e Carlos nas duas Copas seguintes.

De 1986 a 1994, porém, Telê, Lazaroni e Parreira preferiram nomes experientes. Felipão fez o mesmo em 2002, com um trio de peso. No meio do caminho, Zagallo voltou a adotar o expediente de incluir um jovem em 1998, com Dida, enquanto Parreira cedeu ao movimento em 2006, com Júlio César. Reserva do reserva em 2006, ele viria a defender a seleção nos dois Mundiais seguintes.

É curioso, então, que o próprio Carlos, que já foi muito jovem para jogar uma Copa, defenda a presença de um terceiro homem experiente em qualquer cenário. Para o titular de 1986, o Mundial não é evento para “experimentações”. “Pode acontecer um imprevisto, e esse terceiro goleiro deve estar no mesmo nível dos demais, dentro do perfil que eles querem na seleção”, disse Carlos.

HEULER ANDREY/Mowa Press HEULER ANDREY/Mowa Press

Troca de geração

Dos goleiros que foram chamados para as últimas Copas, depois de Julio Cesar se despedir do Flamengo e dos gramados no dia 21 de abril, dois deles seguem em atividade: Victor, do Atlético-MG, e Jéfferson, do Botafogo.

Victor ainda é o titular atleticano, enquanto Jéfferson está no banco de Gatito Fernández. Seria o único, realisticamente, com alguma chance de jogar a Copa. Ele, porém, está fora do radar de Tite.

A tendência é que Tite leve para a Rússia três goleiros que nunca jogaram uma Copa. A última vez em que a seleção foi para o Mundial só com estreantes debaixo das traves foi em 1990.

Twitter/CBF Twitter/CBF

Somos tão jovens

Para Tite e Taffarel, o preparador de goleiros da seleção, experiência não parece importar muito. Afinal, Alisson tem 25 anos. Éderson, 24. A juventude da dupla ao menos tira esse fator: com dois garotos, não é necessário um candidato para ser desenvolvido para o futuro.

“Eles são jovens, então a comissão não precisa se preocupar com a idade do terceiro goleiro. O que resta é mais chamar pela condição em que (as alternativas) estão”, disse Zetti, goleiro reserva em 1994.

Isso é boa notícia para os candidatos mais lembrados pela torcida. A reportagem, então, foi falar com ex-goleiros que foram para Copas do Mundo, como Zetti (1994), Carlos (1978 a 1986), Carlos Germano (1998) ou o recordista Leão (1970, 1974, 1978 e 1986) para saber quem eles levariam. E todos os nomes lembrados já passaram dos 30 anos (ou estão chegando lá).

Pedro Martins/MoWA Press Pedro Martins/MoWA Press

Cássio está garantido?

Há um consenso entre os ex-goleiros ouvidos pela reportagem: a seleção estará bem servida, seja qual for o escolhido. “O Tite pode convocar três goleiros e, se chegar outro técnico e convocar outros três, é a mesma coisa, porque todos são de um nível parecido. Depende do momento, de marketing, se o clube ajuda, nada mais que isso”, disse Leão.

Para Zetti, todavia, não há mais dilema algum na cabeça de Tite: as luvas e a terceira vaga já estão com Cássio. “Ele marcou presença na fase final do Paulista e estava precisando disso, porque o Vanderlei e o Grohe estavam melhores no começo do ano”, afirmou. “O Tite o conhece bem, e o título paulista e tudo o que fez nas decisões o colocam entre os 23 convocados.”

Leão é outro que acredita que a decisão já esteja tomada. “Está na cara que já está definido. Tem o homem de confiança? Fique com ele, é a melhor coisa que pode fazer”, completou.

Lembrando: Cássio foi o goleiro de Tite em seus principais títulos, defendendo o gol do Corinthians na Libertadores e no Mundial de clubes de 2012.

Andre Mourao/Mowapress Andre Mourao/Mowapress

Neto, uma surpresa?

"Corre por fora pela convocação que teve", disse Zetti. "Vou até ligar para o Taffarel para saber do Neto, que não tenho visto", disse Carlos Germano, reserva em 1998.

Marcello Zambrana/AGIF Marcello Zambrana/AGIF

Vanderlei, agora azarão

"Deveria ter tido chance ao menos em amistoso, mesmo que não jogasse. Penso ser um pouco difícil agora, já que não foi convocado", afirmou Carlos Germano.

Laurence Griffiths/Getty Images Laurence Griffiths/Getty Images

Processo seletivo

Tanto Zetti como Carlos ressaltam o processo minucioso que a comissão técnica vem adotando para fechar sua convocação, com participação decisiva de Taffarel, que tem acompanhado de perto a rotina dos candidatos.

Foi algo que aconteceu, por exemplo, com Vanderlei, ídolo do Santos, que conta hoje com relativa pressão midiática a seu favor. “Taffarel viu o treino do Vanderlei. Ele ficou lá uma semana e acabou não o chamando”, disse Zetti. “Eles estão fazendo suas observações, acompanhando tudo. Ninguém vai ter mais consciência do que essa comissão técnica para saber o perfil que querem”, disse Carlos.

Já Leão questiona o processo seletivo, mostrando clara preferência pelo próprio Vanderlei. “O Tite tem de manter a filosofia que sempre falou. É por mérito? Se for por mérito, espera um pouquinho: o goleiro do Santos deveria ser convocado. Já cansei de dar minha opinião”, afirmou.

Juca Varella / Folhapress Juca Varella / Folhapress

Gente boa

Pela seleção brasileira, o terceiro goleiro nunca foi usado em um jogo de Copa. É até mesmo raro que o reserva imediato vá a campo. Em 2006, em vitória tranquila sobre o Japão, Parreira até deu uma chance a Rogério Ceni no finalzinho do segundo tempo, substituindo Dida. Foi basicamente um gesto de cortesia ao veterano são-paulino, que nunca havia jogado pelo torneio.

Por isso, um ponto a ser considerado: o temperamento e comportamento desse terceiro goleiro. Para alguém que dificilmente vai jogar, é preciso um nome que se conforme com essa condição, sem perder a dedicação. “A comissão técnica vai avaliar intimamente: sua postura, aspectos de liderança, relacionamento... Tudo isso aí é colocado em questão na hora de se convocar”, disse Carlos.

Só não peçam a Carlos qual seria sua opção. Ao contrário do que pensam Zetti e Leão, para ele a terceira vaga ainda estaria aberta. “Todos esses já comprovaram que são competentes. Qualquer um pode ser seguramente convocado. Não sei escolher entre eles (risos)”, afirmou.

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