O chamado do cosmos

Vamos viver tempo o suficiente para fazer contato com extraterrestres?

Bill Nye
Nasa

Este artigo faz parte do especial "Ano em transformação", do "The New York Times News Service & Syndicate", que o UOL publica exclusivamente no Brasil. Ao final desta página você encontrará outros artigos relacionados a esse especial.

Nasa revelou a descoberta de sete planetas

Quanto mais observamos o universo, mais suspeitamos de que há alguém nos observando de volta. E a possibilidade se tornou ainda mais viável há alguns meses, quando uma equipe internacional de astrônomos revelou pelo menos três planetas no sistema estelar Trappist-1 capazes de conter vida.

Na verdade, a descoberta de vida em outro mundo mudaria a nossa; alteraria a maneira com que cada um de nós se sente em relação ao fato de ser um ser vivo no cosmo – e como sempre parece ser o caso com as novidades na astronomia, seria uma lição de humildade.

Vocês devem saber alguns casos: Copérnico provou que a Terra e outros planetas visíveis se moviam ao redor do Sol, e não o contrário. Galileu provou que a Lua é coberta por enormes picos escarpados e vales irregulares. Astrônomos de várias origens mostraram que o nosso sol, a estrela que nos garante a vida, não é nada especial, apenas mais uma entre milhões. Mesmo a nossa galáxia não tem nada de incomum. Há bilhões como ela também.

Monika Aichele Monika Aichele

Imagine encontrar um planeta com uma temperatura de superfície confortável e uma atmosfera com quantidades substanciais não só de vapor de água, mas também de metano, o principal componente do gás natural. Embora nominalmente haja mais de uma maneira de produzi-lo, a principal forma de obter novas moléculas orgânicas e de gás é através dos processos naturais dos organismos – e aqui estou me referindo a micróbios que habitam os mares e os pântanos e os que vivem dentro de criaturas como nós.

Então onde devemos procurar se quisermos encontrar micróbios? Ou, melhor ainda, como fazer isso? Encontrar um planeta não muito diferente do nosso seria o ponto de partida lógico. O que diferencia a Terra de todos os outros que conhecemos bem – Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter, Saturno, Urano e Netuno – é a distância do Sol, que permite que haja água em estado líquido. Tem também uma pressão atmosférica adequada e temperaturas de superfície entre o ponto de congelamento e ebulição da água, de 0 a 100°C (ou entre 32 e 212 daquele “Fahrenheit” esquisito).

Os cientistas que encontraram o sistema Trappist-1 estavam procurando justamente isso – e acharam não um, mas sete exoplanetas – ou seja, fora do nosso sistema solar – em órbita ao redor da estrela. Desses, três parecem oferecer condições para a presença de água líquida em suas superfícies.

Cesar Manso/AFP Cesar Manso/AFP

Nos próximos meses e anos, os astrônomos refinarão a busca, na intenção de apurar os dados espectrais críticos que poderão nos dizer se há vapor de água nessas atmosferas remotas, como também em estado líquido em um oceano.

Apesar disso, as visitas de alienígenas são pouco prováveis. De acordo com todas as leis físicas que conhecemos, não há uma maneira prática de viajarmos, como astronautas, para outro sistema estelar. Há espaço demais no espaço. Uma nave levaria dezenas de milhares de anos para alcançar a Proxima Centauri, estrela mais próxima da nossa; para chegar a Trappist-1, então, seria muito mais, pois são 40 anos-luz de distância. E apesar de décadas de escuta e observação, não obtivemos nenhum sinal inteligível do cosmo. (Insira sua piada particular sobre a política dos terráqueos aqui.)

Qualquer sinal, qualquer brilho, qualquer raio vindo de um sistema estelar distante geraria uma torrente de perguntas: eles têm linguagem escrita? Fazendas? Fazem sexo? Precisam dessas coisas? Vão vir nos visitar? Se sim, o que faremos se eles estiverem a caminho? O que vão achar de nós? Será que valemos a pena e a tentativa de comunicação na vastidão do espaço? Ou nossas questões são tão pequenas e triviais que não interessam a outros seres?

Nasa Nasa

Se esses alienígenas pudessem vir aqui, talvez nos vissem da mesma forma que vemos os cupins: “Esses humanos são interessantes, sem dúvida; constroem [o equivalente a] espaços habitacionais complexos (montes) com apenas instruções rudimentares (governos constitucionais, oligarquias, tecnocracias).”

Mas seria só isso. Afinal de contas, parece que estamos empenhados em tornar nosso próprio lar inabitável para nós mesmos, sem nem falar das dezenas de espécies ameaçadas de extinção. Será que se recebêssemos um sinal de fora, mudaríamos nossa atitude?

Dizem que os pesquisadores do programa Trappist (sigla em inglês para "Pequeno Telescópio para Observação de Planetas e Planetesimais") são pensadores defensores da paz e do amor, como implica o nome da iniciativa: "Trappist", ou "trapista", como os monges. Podemos aprender algo com eles.

O orçamento militar mundial chega a algo em torno de US$1,7 trilhão. Com a inspiração adequada – como manter o planeta inteiro pelo menos até saber o que há do outro lado do tal sinal alienígena hipotético, por exemplo – poderíamos reduzir esse valor pela metade e investir o resto para unir, proteger e reforçar a nossa pobre Terra em vez de destroçá-la.

  • Bill Nye

    É CEO da Planetary Society, ONG dedicada à exploração do Sistema Solar

    Imagem: Jesse DeFlorio

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