As diferenças no SUS não se limitam ao tempo do diagnóstico do câncer. O tratamento, segundo um estudo realizado pelo Instituto Oncoguia, varia de maneira significativa entre os mais de 288 centros habilitados no tratamento da doença no SUS.
"Além do descompasso em relação aos tratamentos oferecidos na rede privada --que, por exemplo, já recorre à imunoterapia para cerca de dez tipos de câncer (medicamentos não disponíveis na rede pública)--, o sistema que teoricamente deveria ser igualitário não o é", relata Kaliks, que, além de oncologista, é diretor científico do Oncoguia.
O estudo avaliou as diretrizes de tratamento dos tipos mais incidentes de câncer (mama, colorretal, próstata e pulmão). Os pesquisadores identificaram um padrão de tratamento inferior ao recomendado pelo Ministério da Saúde em 16 dos 29 centros para o câncer de pulmão e em 8 dos 33 centros para câncer de mama. Mas, em contrapartida, 45 dos protocolos avaliados (8 de pulmão, 13 de mama, 10 de colorretal e 14 de próstata) eram superiores ao recomendado.
"Notamos que, em uma mesma cidade, há padrões muito diferentes de tratamento", afirma Tiago Farina Matos, um dos autores do estudo, que afirma que essa heterogeneidade atinge todas as regiões do país. Problema que, na opinião dele, foi intensificado com o início da compra decentralizada dos medicamentos.
"O SUS paga um valor fixo para cada paciente e a decisão do tipo de tratamento fica a cargo do hospital. E, se ele recebe R$ 1.100 por paciente, como adotar o uso de um medicamento no valor de R$ 3.000?", questiona Matos, que diz que essa liberdade dada ao hospital acaba colocando em xeque o tratamento igualitário.
Uma desigualdade que, para Farina, incentiva o "jeitinho" --como procurar a Justiça e furar a fila de atendimento nos centros de referência.
Nesse cenário, ganha quem tem a sorte de morar na região atendida por um dos centros de referência, onde terá mais chance de cura, de qualidade de vida e maior tempo de sobrevida caso venha a desenvolver um câncer.
Rafael Kaliks, oncologista