No imaginário popular, política de saúde é sinônimo de hospital. A associação está relacionada com a história da atenção à saúde no Brasil. A construção de pequenos hospitais por fazendeiros e irmandades religiosas remonta ao início da colonização, quando foi criada a Santa Casa de Misericórdia de Santos, em 1543 --a mais antiga instituição hospitalar em funcionamento no país.
Já no começo do século 20, começam a surgir as grandes unidades hospitalares públicas, como os sanatórios e os hospitais universitários. Uma dessas unidades foi o Hospital do Mandaqui, fundado em 1938 pelo governo paulista para tratamento de tuberculose. Assim, a construção de hospitais pelo poder público é mais antiga que as políticas de atenção básica à saúde, que se consolidaram apenas com a criação do SUS. Isso tudo explica a proliferação de pequenos hospitais e a centralidade dos complexos hospitalares como principal lugar para o tratamento de doenças.
Para Quitéria dos Santos, 87, sempre foi assim. Quando precisa sair de casa para passar por algum atendimento médico, prefere ir ao Hospital do Mandaqui do que a uma unidade de atendimento básico. "Ela não gosta de passar na AMA (Assistência Médica Ambulatorial) porque, se precisar fazer qualquer coisa, vão mandar para cá. O legal de vir aqui [no Hospital do Mandaqui] é que tem tudo: exame de sangue, raio-X, todos os exames", conta a aposentada Odete dos Santos, que acompanha a mãe às consultas e exames.
As redes de saúde são organizadas de acordo com o grau de complexidade que são capazes de atender --baixa em postos de saúde, média em AMAs e pequenos hospitais, e alta em hospitais de referência. "Alguém com um agravo de saúde agudo deveria ir para a AMA, não para o hospital [de referência]", diz Antônio Jorge. Contudo, o Hospital do Mandaqui, além de receber pacientes transferidos, possui portas abertas para qualquer pessoa que busque atendimento espontaneamente.
"Há um movimento errático do usuário, e ele tem uma legitimidade. Se a atenção básica não dá resposta, ele vai para a porta do hospital", acrescenta Maria do Carmo. Para Gatti, a atenção básica é mal provida de unidades e pouco resolutiva. "Isso sobrecarrega a assistência hospitalar. Não é certo o Hospital do Mandaqui estar atendendo resfriados", completa Gatti.
Os hospitais pequenos têm função estratégica na rede, quando se especializam no atendimento de pequenas urgências e na estabilização do paciente para encaminhamento para estabelecimentos maiores.
"Ele resolve bem casos pouco graves de descompensação diabética, hipertensão, crise asmática, apendicite, pequenas cirurgias, parto normal e cólica renal. E precisa do que todo hospital geral precisa: material e equipe básica. Ninguém vai levar um politraumatizado para um hospital desses", diz Carmo.
Mas, quando está mal posicionado ou sem função definida na região em que presta serviço, hospitais com menos de 50 leitos são de fato ineficientes.