Vinte e cinco anos depois do auge das democracias liberais e economia neoliberal pós-Guerra Fria, o iliberalismo e o autoritarismo estão em marcha. É temporada aberta para a intolerância generalizada. A violência está no ar, aguardando apenas uma faísca. A estratégica política vencedora – como provou Trump e como Marine Le Pen pode reforçar nas eleições presidenciais francesas de 2017 -- é liderar "o povo" contra um "sistema viciado", barrar a imigração muçulmana e explorar o consenso tirânico de especialistas mais que bem pagos.
A ordem pós-guerra, incluindo as alianças militares, os pactos comerciais, a integração política e a estrutura legal, se mostra fragilizada e a natureza do poder norte-americano, fortalecido por seus aliados, de repente perdeu a clareza. Ninguém entusiasma Trump mais do que o russo Vladimir Putin, que está para a democracia assim como a marreta está para um vaso de porcelana. Homens fortes e autocratas de todas as partes, não mais só no Egito e nos países do Golfo, exaltam a vitória de Trump.
É muito cedo para dizer o que ele fará, quantas promessas malucas de campanha vai cumprir, mas não é difícil prever turbulência. A irascibilidade, impetuosidade e falta de atenção o definem, por mais que o séquito que o cerca e as novas responsabilidades, de certa forma, as limitem. Por enquanto, ele está com a corda no pescoço.
A Otan enfraquecerá; os países bálticos se sentirão mais vulneráveis. Bashar al-Assad, com respaldo da colaboração Putin-Trump, se fortalecerá. As tensões comerciais entre chineses e norte-americanos ficarão mais fortes, da mesma forma que a inquietação militar no mar do Sul da China.
O acordo nuclear com o Irã, negociado cuidadosamente com seis nações líderes, pode desandar, dando ao Oriente Médio potencial para se tornar mais perigoso. Qualquer ataque jihadista ou outra violência nos EUA não será resolvido com cautela ou prudência, já que Trump parece achar que as armas nucleares são uma vantagem pouco utilizada.
Os combustíveis fósseis voltarão com força total. O acordo de Paris, assinado pelo mundo para combater as mudanças climáticas, perderá a força. Os aproximadamente 65 milhões de imigrantes que se movimentam pelo mundo, dos quais pelo menos 30% são refugiados, terão mais dificuldade em encontrar abrigo e recuperar a dignidade, já que o nacionalismo xenófobo ganha espaço político na Europa Central e em outras paragens.
O avanço implacável da tecnologia e o espaço cada vez maior ocupado pela inteligência artificial certamente porão à prova a intenção de Trump de recuperar os empregos do setor industrial. Algumas funções desapareceram para nunca mais voltar e nem um empreendedor salvador pode recuperá-los. A Parceria Transpacífico já parece morta; outros acordos comerciais, incluindo o Nafta, símbolo do sistema aberto das décadas passadas, podem acabar vetados ou substancialmente enfraquecidos.