Roger Cohen: Mario, o que você diria se a chanceler Angela Merkel fosse vê-lo em Roma e falasse: “Agi bem, aceitei um milhão de refugiados; sem isso, a União Europeia teria rachado ainda mais rapidamente. Acho que vou perder as próximas eleições porque a opinião popular está se levantando contra mim. Fiz a coisa errada?”
Mario Monti: Eu diria a ela: “Angela, veja o seu antecessor, Helmut Kohl; hoje ele é lembrado na história europeia como o homem que instaurou o euro na Alemanha. Superou o obstáculo mais difícil, ou seja, a rejeição mental e psicológica do cidadão alemão comum à nova moeda, que suplantaria o adorado marco alemão. Ao fazer isso, perdeu as eleições de 1998 para Gerhard Schröder que, na época, fez campanha contra a nova moeda."
"Você está mais interessada em fazer mais um governo, o que só adiaria o momento da separação entre você e o poder, ou preferiria entrar para a história europeia e alemã sendo respeitada e com moral alto?".
Roger Cohen: Vimos os britânicos, em resolução extraordinária, votarem a favor da saída da UE. Lucas, até que ponto você teme a dissolução da União Europeia por causa da pressão da imigração em massa?
Lucas Papademos: Estou bastante preocupado porque, no momento, a UE enfrenta várias crises simultâneas, sendo que uma delas ainda se refere à fraqueza econômica. Mas a crise da imigração também é resultados de uma grande divisão entre os países – norte e sul, ocidente e oriente. O fluxo parece ter sido contido de forma razoável, mas se o pacto com a Turquia não for obedecido, se as guerras continuarem ou se o êxodo tiver novos picos, acho que isso tudo pode influir decisivamente como ameaça à coesão da Europa e ao seu futuro.
É muito importante lidar com as preocupações econômicas imediatas do povo – ou seja, o alto nível de desemprego e da desigualdade dentro dos países – e cuidar para que elas não ofusquem os benefícios de longo prazo da imigração.
Para que a política de refugiados seja efetiva, é importante que não só haja uma estratégia eficiente, como também que o fardo seja bem dividido, de modo que Itália e Grécia, que recebem um número muito maior de refugiados e imigrantes por causa da proximidade geográfica, não arquem com as consequências sozinhos. Você acha que há chances, principalmente depois do Brexit, de que a União Europeia, mais particularmente a zona do euro, se dissolva? Eu diria que, embora a probabilidade seja alta, é pouco provável.
Stavros Lambrinidis: Se a Europa pode entrar em colapso por causa de imigração? Minha resposta é um "não" enfático. Fiquei surpreso porque uma das primeiras coisas que os defensores do Brexit repudiaram após o resultado do referendo foi que, de alguma forma, o fluxo de imigrantes no Reino Unido mudaria de forma drástica.
A Europa enfrenta uma crise, sim, mas não de políticas específicas, e sim de valores. Inúmeros economistas de todas as partes do mundo analisaram o euro e disseram que era economicamente inviável, que não podia dar certo – e, no entanto, apesar das sérias crises, continua sendo uma das moedas mais fortes do mundo. Por quê? Porque foi criado como política, com uma base sólida de valores.
Essa ideia de que a Europa era uma união solitária e o fato de acharmos que pertencendo a ela teríamos nossos benefícios nacionais multiplicados fez com que as políticas, inclusive até as que eram consideradas instáveis, perfeitamente capazes de vingar. Por outro lado, quando se pensa na imigração e na política sóbria que define a questão, você imagina que alocar dois milhões de pessoas entre os 28 Estados membros seria coisa fácil.
Roger Cohen: Quando há mais de dois milhões de refugiados na Turquia e eles já representam 20% da população do Líbano.
Stavros Lambrinidis: Não está criando raízes com facilidade. Eu digo que isso é porque hoje temos valores instáveis. A imigração é uma questão global, não europeia, e foi por isso que a discuti quando estive nos EUA. Se você tem que combater a guerra e as violações aos direitos humanos, tem de fazer isso em nível global.