Não é fácil ser o menino

Capitão do ouro em 2016, Bruninho fala sobre o peso de ser filho de Bernardinho, vôlei e a amizade com Neymar

Leo Burlá e Leandro Carneiro Do UOL, em São Paulo e no Rio de Janeiro
AFP PHOTO / Juan Mabromata

Bruninho x Bernardinho

"Filho do treinador". "Só está lá por causa do pai". Essas frases fizeram parte da rotina da vida de Bruninho a partir de 2007, quando foi convocado para a vaga de Ricardinho para os Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro. Foram quase dez anos até uma medalha de ouro olímpica, também no Rio, para deixar a desconfiança, definitivamente, para trás.

Durante todo esse período, Bruninho teve ao seu lado o pai Bernardinho. Mas estar próximo de um familiar, neste caso, nem sempre foi positivo. A cobrança foi grande, tanto da torcida como do próprio treinador.

Desconfiança da torcida, aposentadoria de Bernardinho, possibilidade de vê-lo na política, relação com o pai em casa e na seleção, a amizade com Neymar... O capitão da seleção brasileira de vôlei falou sobre muita coisa com o UOL Esporte. A conversa aconteceu antes de Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, ser preso pela Polícia Federal.

Reuters Reuters

Fim do peso após o ouro

Parte de um peso enorme saiu das costas de Bruninho há um ano. Ele foi o capitão da seleção que terminou a Olimpíada do Rio de Janeiro no lugar mais alto do pódio. Não era só a medalha inédita. Era a prova final para quem ainda desconfiava de seu talento.

“Era um título que faltava na minha carreira pela seleção. E ter conquistado todos os títulos pela seleção, de certa forma, me deixa muito mais confiante. Durante anos, essa insegurança que muitas pessoas tinham comigo, desde o início, por ser o filho do técnico, passava para mim”

“Eu era mais jovem, tinha essa insegurança. Será que tenho de estar aqui? Mesmo nos títulos nos clubes eu me perguntava isso. Então, ter conquistado tudo o que conquistei pela seleção demonstrou que eu merecia estar onde eu estou. De certa forma, foi um peso. Era a competição mais importante, era a que faltava e eu sabia que aquilo ali seria a grande redenção não só minha, mas de todo um grupo. Foi, sem dúvida alguma, um marco para aliviar uma geração que ficou marcada por não ter conquistado tanto quanto a geração anterior. Por ter sempre batido na trave”.

Espero que eles tenham parado de me ver só como o filho do Bernardinho. Eu nunca vou deixar de ser filho. Ele é a maior referência do voleibol dos últimos anos. Talvez a maior de todos os tempos, por todos os títulos que ele conquistou. Mas principalmente pelo legado e pela filosofia deixada. Então, não vou deixar de ser filho dele jamais. E nem quero deixar. Mas ser sempre comparado a ele e ouvir que existiam dúvidas sobre a minha chegada na seleção era uma coisa que incomodava

Sobre a pressão de ser "filho do técnico"

André Portugal/VIPCOMM André Portugal/VIPCOMM

Cobrança foi maior no começo

Muito próximos fora de quadra, pai e filho deixavam essa relação de lado em treinos e jogos. Mas nem sempre foi assim. O começo desta relação profissional foi desgastante. "Eu até brinco que os primeiros três ou quatro anos foram de uma relação bem complicada. Ele cobrava demais de mim, mais do que dos outros", diz. "Era uma situação que eu não entendia muito bem. Então, o início da nossa vida de atleta e técnico foi um pouco difícil. Com o tempo, como em qualquer relação, foi melhorando. Você consegue entender melhor as duas partes".

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Saudades na seleção

"Ele sempre foi um cara muito presente, ligava todo dia. Principalmente na época da seleção feminina, quando eu era mais jovem. Ele entrou na seleção em 1993. Eu tinha oito ou nove anos e as viagens para o Grand Prix eram de 40 dias. Intermináveis. E 40 dias longe não é fácil. Eu morava no Rio. A minha mãe morava com meu irmão em Campinas, porque eles já eram separados. Ele me ligava todo dia. Mesmo com fuso horário e tudo. Apesar dessas viagens e da distância, sempre foi um cara muito presente. Sempre cobrou para ir bem na escola".

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"Foi quem mais me inspirou. Tem defeitos, mas muito mais qualidades"

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Ninguém é eterno

Um dos momentos mais difíceis na relação dos dois foi o momento de dar adeus ao técnico Bernardinho. A decisão de deixar a seleção brasileira após 23 anos (no feminino e no masculino) foi conversada com a família antes de ser anunciada oficialmente.

“A gente teve esse papo pós-Olimpíada em família. Teve um jantar quatro dias depois da final olímpica, era o aniversário do meu pai, na casa dos meus avós. Aí veio esse papo. Todos estavam de acordo de que não era a hora de continuar. Ele já tinha tido alguns problemas de saúde e queríamos prezar por um momento mais tranquilo da vida dele. Não dava para ficar no clube e na seleção, era uma rotina desgastante”, conta.

“Ele é um cara que só vive intensamente o que ele faz. É apaixonado. Então, ele se doa demais. Não consegue ser um cara tranquilo, levar mais ou menos, não existe isso. Ele leva no 100% sempre. Pela saúde, para poder curtir um pouco mais a vida, minhas irmãs, a família e tudo mais, era o momento de dar uma desacelerada. Acho que a gente expôs o que achava que seria correto e ele entendeu que essa era a hora de desacelerar essa vida tão corrida”.

Ele teve um ou dois meses pensando com ele mesmo. Não é fácil também depois de tantos anos você sair daquilo que você mais ama, que é treinar. Eu sinto que nesse primeiro ano ele sentiu muito a falta de tudo isso. Mas era a hora. A gente sabe que fazia parte do processo, que ninguém é eterno, que não vai poder fazer para sempre o que ama

Sobre o processo de convencimento da aposentadoria pelo pai

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Relacionamento difícil com Fernanda Venturini

Filho da ex-jogadora de vôlei Vera Mossa, Bruninho viu a entrada de outra atleta em sua casa no fim da década de 90. Seu pai casou com a ex-levantadora Fernanda Venturini. No começo, a relação foi difícil. Melhorou quando Júlia, filha de Fernanda e Bernardinho, nasceu. E, além de segunda mãe, ela assumiu um papel de conselheira para o atleta.

“A Fernanda foi uma pessoa que, principalmente depois que ela teve a Júlia, em 2001, começou a entender muito mais o que é ter uma família. A gente se aproximou muito mais. Desde então, ela me ajuda, me dá dicas, conselhos. Ela foi uma levantadora, se não foi a maior da história, uma das maiores, então é muito presente. Se tornou mesmo uma segunda mãe, digamos assim”.

“É lógico que a nossa diferença de idade não é tão grande, mas em nenhum momento eu me vi preterido ou qualquer coisa do tipo por ela ser madrasta. A gente tem uma relação muito boa hoje e ela me ajuda. Quando ela quer dar algum pitaco, me manda mensagem, um áudio dizendo: ‘Bruno, por que você não tenta fazer isso?’. Dela eu tenho que escutar também, isso que é bom. Eu tenho o ônus e o bônus de ser de uma família de grandes atletas. O caminho eles sabem”.

Nossa relação era um pouco mais tensa (antes do nascimento da Júlia). A Fernanda é uma pessoa um pouco mais fechada, um pouco mais durona. Na época ela ainda jogava, então a gente não tinha tanta relação. A gente nunca morou no mesmo apartamento. Mas eu senti que, depois do nascimento da Julia, ela deu, digamos assim, uma afrouxada no coração. Ela era bem durona

Sobre a relação com a atual mulher do pai

Bernardinho presidente? É assunto de almoço de família

Por que Temer não saiu também?

Quando o assunto é política, Bruninho é presente não apenas quando o assunto é o pai. Em seu perfil no Twitter, manifestações apoiando operações da Polícia Federal e cobrando autoridades são normais.

“Eu acho que quanto mais operações deste tipo (Lava Jato) forem acontecendo, melhor. A gente tem que colocar tudo isso às claras. Mesmo que a gente dê dois ou três passos para trás, para limpar o nosso país e toda essa baderna, tem de fazer. Que a gente entre numa crise. Eu tenho certeza de que a vontade da mudança política existe. As pessoas se inteiraram muito mais depois de tudo isso”.

“É muito difícil se posicionar em relação ao impeachment, mas eu acho que contra fatos não há argumentos. O que me deixa um pouco encucado é o seguinte: a Dilma entrou lá junto com o Temer, então por que não saíram os dois? O impeachment é da Dilma, mas o Temer continua? São coisas que não batem muito. Como eu disse, eu não sou um cara que entenda do assunto. Se foram comprovados erros em relação a isso, que sejam punidos os culpados. Sou a favor de começar tudo de novo. Os dois chegaram juntos. É um jogo de interesses muito grande na política, é muito complicado lidar com isso”.

Amigo de Neymar, Thiaguinho...

Reprodução Reprodução

Meme ao lado de David Brazil

A amizade com Neymar e Thiaguinho criou uma situação inusitada para Bruninho no final de 2016. Em uma foto, ele aparecia ao lado do promoter David Brazil, cercados de amigos que apareciam acompanhados. Foi o suficiente para que o levantador virasse alvo de diversas brincadeiras.

“A gente teve folga no final de ano. Na primeira parte, fui para Trancoso com uns amigos. Mas queria passar os últimos dois dias mais tranquilos e fui para Angra. Tinha uma galera lá, uns amigos. O Thiaguinho, o Rafael Zulu, o Neymar e tal. Mas todo mundo estava em casa. Eu ia desistir, mas eles me convenceram. ‘Vamos ficar aqui na resenha. Faz tanto tempo, fica dois dias, a gente sai de barco, passa a festa de Réveillon aqui em casa’. Eu aceitei. Assim, não ficaria só nas festas de Trancoso, descansaria mais. Quando cheguei lá, rolou aquela fatídica foto do dia do barco”.

“Cara, eu não reparei que só tinha casal. Estava o David e eu aqui do lado. O David é uma figura, engraçado, superdivertido e tal. Mas virou meme. O que eu recebi de mensagem, da minha família e de todo mundo, me sacaneando... Mas não tem o que falar: foi engraçado para caramba. Depois o David ainda brincou e eu coloquei no Instagram. Mas nada contra, pô! Gosto do David, um cara gente boa para caramba. Mas não faz o meu tipo. Eu gosto de outra coisa”.

No Whatsapp com Neymar, Huck, Thiaguinho...

Reprodução/Instagram Reprodução/Instagram

Diretoria

O grupo Diretoria tem entre seus integrantes nomes como Neymar, Luciano Huck e o campeão mundial de surfe Gabriel Medina. "O Neymar que nos apresentou o Medina. É um moleque do bem. A gente sofre. Assiste jogo de futebol, campeonato de surfe, jogo de vôlei. É engraçado. Fala muito de esporte. E, como em qualquer grupo de homens, de vez em quando pode aparecer um assunto proibido. Mas como agora são 3 solteiros e 3 casados, a gente evita um pouco, por causa dos casados. Mas é normal, né... Papo de homem também, rola de tudo um pouco".

Daniel Vorley/AGIF Daniel Vorley/AGIF

Gigantes da resenha

Outro grupo de famosos de Bruninho é o Gigantes da Resenha, formado por jogadores de futebol. "Só tem figura também. Eu fico mais quieto, só vejo os caras falando de futebol e não posso dar meus pitacos. Eu jogo vôlei, né. Mas a galera é gente boa para caramba também. Tem alguns ali, tem o Kaká, o Thiaguinho faz parte também, o Elano. Entrei no grupo na época que eu encontrei o Elano. A gente estava jogando a fase final da Liga Mundial em Curitiba e ele falou que ia me botar num grupo. Tem o Falcão, uma galera boa, mas é muito futebol, não posso dar meus pitacos".

Wallace Barbosa/AgNews Wallace Barbosa/AgNews

Baladeiro com moderação

Bruninho não se considera uma pessoa da noite. Mas reconhece que em alguns momentos precisou curtir para relaxar a tensão diária da quadra. E isso até chegou a atrapalhar sua situação física:

“Já aconteceu. O ano pós-olímpico, principalmente no início, essa folga de fim de ano... É muito difícil quase não ter folga. Eu tive uma semana e meia após as Olimpíadas e os dez dias do Réveillon. Falei: ‘eu vou dar uma curtida’. Eu precisava, foram anos muito pesados. O ano olímpico foi uma tensão, uma pressão. Queria curtir um pouco mais”.

“Mas acontece, também, de sentir: ‘Pô, Bruno. Deu. Segura’. Eu tenho essa cabeça também, sei me controlar. Lógico que você ser solteiro, com 31 anos, e ter possibilidade de curtir é legal. Tenho uma festa, tenho churrasco na casa dos amigos. Eu vou. Não tenho porque não ir se eu tenho folga no dia seguinte. Não gosto, não faço, já fiz, mas não mais, que é no dia seguinte de manhã tem treino e sair na noite anterior. Não dá. Jogo nunca, jamais. Mas para treinar no dia seguinte de manhã é muito complicado. O seu corpo pesa e tal, é diferente, você precisa estar dormindo bem, se alimentando bem. Mas eu gosto, não nego não”.

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Fama de pegador

Bruninho tem 31 anos e até teve alguns relacionamentos sérios. Mas, o momento do levantador é solteiro. Para quem acha que isso não é um problema, ele se preocupa com a situação.

“Está na hora, eu fico pensando nisso. Não tem ninguém. Mas tem que aparecer uma pessoa bacana e tal. Estou indo jogar fora de novo, em Modena. Lá o ritmo de vida é muito mais tranquilo, você não tem tantas oportunidades de encontrar amigos, de sair, de jantar. Fica muito mais em casa. Seria bom ter alguém, mas preciso ver se vou encontrar”.

“Eu tenho uma suposta fama de pegador (em Florianópolis). Morei muito tempo lá e é uma cidade pequena. As pessoas reparam bem. Eu morei alguns anos solteiros lá e aproveitei bem, tenho que dizer. Mas faz tempo isso, eu era mais novo, mas pegador, pegador, não. Um pouquinho”. 

REUTERS/Dominic Ebenbichler REUTERS/Dominic Ebenbichler

Quase fui jogador de badminton

Apesar da história de Bruninho com o vôlei começar antes mesmo de seu nascimento, ele quase foi jogador de outro esporte: o badminton foi uma realidade até os 15 anos.

“Quando me mudei para Campinas, o clube que frequentava era tradicionalmente de badminton. Comecei a jogar e me dar bem. Na época eu era novo, tinha 10 para 11 anos. Comecei a viajar para Sul-americano não sei onde, Pan-americano. Ganhei um Pan-americano sub-15, em Guadalajara”.

“Chegou uma época em que o meu pai falou: ‘Bruno, você tem que se decidir. Não dá para ficar assim, no sábado tem um jogo de badminton pela manhã e à noite um jogo de vôlei. Não bate’. Foi quando eu vi que o badminton não estava mais andando, já não via mais o crescimento que gostaria. Falei: ‘Quer saber? Vou para aquilo que eu sinto que eu tenho mais talento’. Era o vôlei’.

FIVB/Divulgação FIVB/Divulgação

Nervosismo tomou conta no começo da seleção

Bruninho compunha o grupo da seleção brasileira antes mesmo do corte de Ricardinho, em 2007. Ele era o terceiro levantador da equipe e ficou surpreso ao ficar sabendo da oportunidade de ir para os Jogos Pan-Americanos. A primeira vez de entrar em quadra no Maracanãzinho e escutar uma mistura de aplausos e vaias o deixou apreensivo.

“Lembro que eu peguei um voo quinta à noite ou sexta de manhã, fiz o treino de sexta, de sábado, e o Ricardinho não tinha chegado. Foi quando aconteceu a briga. No sábado à noite, fiquei sabendo que ficaria para o Pan. Aquilo ali foi um susto. Tinha marcado um paintball com meu time em Florianópolis. Falei gente, meu voo de volta para Floripa está marcado, como eu fico agora numa situação dessa? E aí que começou tudo. No dia seguinte, televisões e toda aquela bomba”.

“Como eu já fazia parte daquilo, todos me deixaram muito tranquilos. Eu seria o levantador reserva. O Marcelinho era o titular”.

Naquele momento, sozinho, eu pensava que podia estar tranquilo em Floripa, só pensando no time. Mas estava ali, na beira de um Pan-americano no Brasil, com uma pressão violenta. Gente dizendo que o corte foi feito só para colocar o filho do cara. Fiquei pensando que era muito mais fácil estar em casa. Ou, de repente, ser advogado. Ou não ser nada para não botar meu pai numa situação como essa. Porque muitos falaram da ética dele. Então, você vê o seu pai, que é um cara que, poxa, é seu maior exemplo, ser colocado em discussão pela ética. Aquilo incomodava bastante

Lembrando dos dias no Rio de Janeiro, após a saída de Ricardinho da seleção

Na primeira partida, quando entrei, foi um misto de vaias e aplausos. Mais vaias. Aquilo ali foi marcante. Eu não posso ser hipócrita e dizer que não ouvi

Sobre o primeiro jogo

O jogo entregado no Mundial de 2010

Eu era o único levantador do elenco. O Marlon estava se recuperando da doença de Crohn, que ele teve às vésperas do Mundial. Não jogou os primeiros jogos. Foram quatro partidas. Na quinta seria contra a Bulgária. Eu estava jogando praticamente sozinho durante toda a competição. Aquele jogo da Bulgária não valia absolutamente nada. Estavam tentando beneficiar a Itália para que ela chegasse numa semifinal mais facilmente. Quem perdesse aquela partida entre Brasil e Bulgária pegava um chaveamento um pouco mais fácil, mas que também não garantiria nada.

Eu tinha acordado um dia antes com febre. Imagine se, de repente, piora? Dois dias depois, tem jogo já pela outra chave e eu não posso jogar. O Marlon está em 30%, não consegue jogar também. Como é que faz? E se alguém torce o pé? Então, falar de entrega é muito complicado. Com certeza não jogamos para vencer. Era um corpo mole. Mas, além disso, era poupar. Poupar totalmente. E o time da Bulgária fez a mesma coisa. Os principais três jogadores não foram nem para a quadra. Ficaram do lado de fora, na arquibancada. A Rússia fez a mesma coisa na outra chave.

A maneira que foi feita a competição, o chaveamento e essas coisas, atrapalhou. É horrível jogar sabendo que perder é melhor do que ganhar. Foi um dia ruim. Foi um jogo em que os dois times estavam jogando sem vontade. Mas ficou mais feio porque a gente tinha só um levantador no elenco, que era eu, e eu não joguei. Tivemos que improvisar o Teo naquela situação. O time deles era o reserva. Mas com um levantador. É uma situação horrível que eu espero não passar de novo.

Mark Kolbe/Getty Images Mark Kolbe/Getty Images

Pés no chão para não deslumbrar com medalha

O auge da carreira de Bruninho chegou em 2016, com o ouro olímpico. Mas, um cuidado foi necessário para não perder o foco e pirar com a medalha.

“Eu tive a sorte de, durante toda a minha carreira, ter pessoas que sempre me ensinaram a ter os pés no chão. Por mais que tenha sido uma conquista épica, sei que no próximo campeonato eu vou ter que continuar treinando pra caramba para continuar ganhando. Senão, não vou ganhar o próximo campeonato e minha medalha vai ficar para a história”.

“Essa fome de continuar vencendo motiva a gente para estar sempre trabalhando. Eu tive muitos exemplos, dentro da seleção mesmo, com Serginho, Gustavo, Giba, que foram caras que ganhavam e eles queriam mais. Então, você não tem tempo para ficar pensando: ‘eu sou o cara’ ou alguma coisa do tipo. Você tem que continuar trabalhando, se dedicando e buscando. E meu pai é um exemplo vivo disso. Uma semana depois que tinha ganho a Olimpíada ele já estava pensando no que ia fazer depois. Eu ainda me dei duas semanas”.
 

É o meu maior bem. Às vezes a minha empresária diz que, em algum evento de patrocinador, tem que levar a medalha e eu falo: 'Putz, tem que tirar a medalha de casa?' Dá dó ter que levar a medalha no avião

Sobre o ciúme com a medalha

AFP PHOTO / Fabrice COFFRINI

Fomos traídos pela Olimpíada?

A Olimpíada não é motivo apenas de orgulho. Quando olha o legado que sobrou depois da passagem dos Jogos por sua cidade de origem, Bruninho fica completamente decepcionado.

“É uma decepção olhar o Rio de Janeiro depois dos Jogos. A gente, lá atrás, quando saiu que o Brasil seria um candidato, ficamos pensando: Será que vai ser bom pra gente? Às vezes, as pessoas falavam que tinham que gravar um vídeo para dar uma força e eu falava: Será que é bom? Quando o Rio ganhou para ser a cidade sede, eu falei: Agora não tem mais o que fazer, a gente tem que dar força, fazer com que o negócio seja bacana e que fique um legado.”

“Mas você vê agora as coisas jogadas as traças. Ninguém usa nada, não ficou nada. Muita pouca coisa para a comunidade. O metrô melhorou. Dizem que está funcionando legal. Eu não tive a oportunidade ainda de ver, não estou morando no Rio. Aumentaram as linhas, algumas obras de infraestrutura, a Transolímpica, os BRTs, o aeroporto que aumentou. Mas e o resto? Quanto de dinheiro que a gente gastou ali e que não estamos vendo nada ser usado? Nenhuma contrapartida para o povo. Temos que fazer alguma coisa em relação a isso. Por que isso não foi pensado antes? Até o que foi pensado antes. O ginásio vai virar escola? Nada, cara. A gente acaba sendo traído por isso. Sendo enganado”.

Divulgação/FIVB Divulgação/FIVB

Futuro como treinador

Bruninho está na seleção brasileira há mais de 10 anos. Mas, aos 31 de idade, o levantador ainda não pensa em parar. Aliás, o projeto do levantador é encarar pelo menos mais uma década de vôlei - se o corpo permitir.

“Eu não sei se quero ser técnico, sinceramente. Vivo um passo de cada vez. Espero poder jogar enquanto o meu corpo aguentar e minha cabeça estiver feliz. Coloco na minha cabeça ainda mais uns 10 anos de vôlei. Estou com 31, vamos ver se vai ser possível. Não posso também garantir. E depois eu não sei ainda, tem muito tempo para acontecer”.

“Eu adoro vôlei, amo o vôlei. Sou um cara que estuda. Acho que se eu estudasse mais ainda, fizesse cursos, poderia ser um bom treinador. Não sei em que nível, mas um bom treinador. Mas não sei se é isso que eu quero. Continuar na mesma pegada durante tantos anos”.

Existem outras prioridades na vida. Eu pretendo ter uma família. Então, sei o quanto é difícil virar treinador. Sei o quanto a família sofre. Essas coisas têm que ser muito bem pensadas”.

A ameaça de Ary Graça

Escândalos na CBV ficaram baratos

Quantos milhões poderiam ter sido investidos na nossa base, no nosso campeonato? Quem vai ter certeza, hoje, sobre a CBV? Ela está sofrendo com isso. Tem a crise econômica, mas também tem um passado em que pessoas com contratos multimilionários criaram uma dúvida. O Banco do Brasil diminuiu em quase 40% o investimento. Você acha que foi só por causa da crise? Com certeza tem um resquício do que aconteceu lá atrás...

Sobre os desvios denunciados

Ficou muito barato para os envolvidos. Tudo o que fizeram e nada mudou para eles. Cadê aquele dinheiro todo? Eram muitos milhões que a gente não sabe onde foram parar. Times que tinham de jogar aqui no Rio e não tinham dinheiro para contratar uma empresa de ônibus para ir do hotel para o treino. Iam de metrô. Isso é um absurdo. Via certas coisas acontecendo e gente enriquecendo cada vez mais. Isso é o que me deixava mau mesmo

Falando como os jogadores sentiam o problema

Lá no início, em 2007, quando eu e o Éder chegamos à seleção, fomos chamados pelo presidente: ?Vocês não podem pensar em dinheiro como esses caras pensam hoje?. Estava falando dos medalhões. Eles buscavam premiações, porque em algumas competições o prêmio vinha da FIVB, em outras dos CBV. Ele disse que aqueles jogadores só pensavam em dinheiro. Mas não é verdade: eles pediam o que era o merecido. Depois de alguns anos, você vê o mesmo cara que pediu para não pensar em dinheiro e no meio de todos aqueles escândalos

Sobre um encontro com a direção da CBV

Flickr/Ministério do Esporte Flickr/Ministério do Esporte

Atletas têm dificuldade para se mobilizar

Bruninho acredita que uma participação mais ativa de atletas poderia ajudar a coibir algumas situações. A linha seguida pelo capitão da seleção brasileira é compartilhada por outros atletas brasileiros. O problema para o levantador é desviar o foco principal.

“Meu objetivo é jogar vôlei. Meu foco é sempre esse. Trabalhar, treinar para conquistar títulos e vencer. É muito complicado buscar outras coisas. Isso não deveria ser uma preocupação nossa. Outras pessoas deveriam se mobilizar. Que pudessem, de certa forma, explorar esse lado mais político da situação do esporte brasileiro”.

O levantador cita o velejador Lars Grael como exemplo: “Ele está fazendo um conselho de pessoas do esporte, com outros ex-atletas. A gente precisa dessas pessoas para fazer com que o esporte possa melhorar na parte política e ter mais voz. Porque nós sabemos o que é importante para o esporte, mas é muito difícil ficar se colocando em situações delicadas. A gente é atleta ainda, o foco é outro”.

A gente tem muito ex-atleta que já passou por inúmeros problemas e pode ajudar. Eu já conversei com Meligeni, Guga e Lars Grael. Você vê que as pessoas querem melhorar, mas a gente ainda fica batendo muito em legislações e estatutos de federações, confederações. Presidentes de federações estão há mais de 20 anos no cargo, então quando é que isso vai mudar?

Sobre as possibilidades de mobilização do esporte

Segue ou bloqueia?

  • Bernardinho

    Um exemplo, uma inspiração. Meu pai e o cara que deixou um legado não só para o esporte, mas para as pessoas, de paixão pelo que faz. É um grande exemplo para todos nós e para mim principalmente. Eu tenho o maior orgulho dele.

    Imagem: FIVB/Divulgação
  • José Roberto Guimarães

    Um vencedor, tricampeão olímpico, o cara tem estrela. Nunca tive a oportunidade de trabalhar com o cara, mas ele é uma estrela e tanto. Multicampeão sem dúvida alguma. Todo o respeito. Tiro o chapéu.

    Imagem: REUTERS/Yves Herman
  • Ricardinho

    Craque e que virou um amigo também. A gente se fala e tal, brinca, é um cara muito bacana.

    Imagem: Flavio Florido/UOL
  • Neymar

    Amigo, craque, dono no hexa. Botei uma pressão nele agora...

    Imagem: Dean Mouhtaropoulos/Getty Images
  • Luciano Huck

    Um cara muito gente boa, solidário, você percebe pelos programas dele. Um cara gente boa que também tem ideias e espera fazer alguma coisa pelo Brasil também. Vamos ver se é possível.

    Imagem: Reprodução/UOL/Raquel Cunha/Divulgação/TV Globo
  • Ary Graça

    Decepção. Decepção total. É isso

    Imagem: Divulgação/FIVB

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