De volta para o passado

Em "Jogador Nº 1", Spielberg une cultura pop e ficção científica e faz seu filme mais divertido em muitos anos

Felipe Branco Cruz e Rodolfo Vicentini Do UOL, em São Paulo
Warner Bros. Pictures/Divulgação

Aos 71 anos, Steven Spielberg é um dos poucos cineastas de Hollywood que merece o adjetivo de lenda. Dono de três Oscars, ele tem em sua filmografia verdadeiras obras-primas, como “Tubarão”, “A Lista de Schindler”, “Contatos Imediatos do Terceiro Grau” e “O Resgate do Soldado Ryan”.

Mas são seus títulos de ação e aventura que o transformaram em ícone. A franquia “Indiana Jones”, “E.T. O Extraterrestre”, “Hook - A Volta do Capitão Gancho” e “Parque dos Dinossauros”, são apenas alguns exemplos da habilidade de Spielberg em contar uma história divertida. E o diretor ainda participou da produção de clássicos como "De Volta para o Futuro", "Os Goonies", "Gremlins"...

Nesta semana, estreia mais um típico filme de Spielberg, daqueles para entrar na lista acima. "Jogador Nº 1" é ambientado no futuro, mas com um pé nos anos 1980 e cheio de autorreferências e homenagens aos clássicos da década em que o diretor reinou absoluto em Hollywood. E essa volta ao passado é uma ótima chance para ver que o cineasta ainda consegue entregar uma aventura empolgante e atual.

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O maior nerd do cinema

A paixão de Spielberg pelo universo geek é antiga

Extraterrestres

No final dos anos 70, Spielberg pôde arriscar seu lado geek no clássico “Contatos Imediatos do Terceiro Grau” (1977), quando diversos fenômenos inexplicáveis assustaram os norte-americanos. Já estavam lá a trilha sonora misteriosa, os efeitos de luz, os OVNIS e, claro, a aproximação entre humanos e alienígenas.

O filme serviu como um aperitivo do que viria cinco anos depois em “E.T. – O Extraterrestre” (1982), com uma trama mais inocente e emotiva sobre uma criança que encontrou uma criatura “diferente”, que precisa de um telefone para ligar para a família lá do outro lado da galáxia. A obra-prima que quase chegou a US$ 1 bilhão nas bilheterias ainda tinha uma marca do diretor, o uso de bonecos para driblar a falta de tecnologia da época.

Guerra dos Mundos” (2005) foi baseado na obra homônima de H.G. Wells, apresentando literalmente uma combate mortal entre os homens e os seres de outro planeta. O diretor atualizou a trama, colocando tripods em meio a carros e antenas gigantescas. Spielberg sempre foi apaixonado pelo livro e não perdeu tempo quando conseguiu os direitos para levá-lo aos cinemas.

Dinossauros

Spielberg, assim como diversas crianças, nutria uma paixão gigantesca pelos dinossauros, e é dele o filme definitivo sobre o tema. Em “Parque dos Dinossauros” (1993), o diretor revolucionou Hollywood criando animais ultrarrealistas em computação gráfica. Assim, velociraptors e T-Rexs ganharam vida e iniciaram uma das franquias de maior sucesso do cinema.

O trabalho minucioso da equipe de filmagem, que também contou com gigantescos bonecos animados em algumas cenas, transformou em realidade o sonho do diretor. Spielberg ficou fascinado ao ver os dinossauros correndo nos computadores da época.

O sucesso ainda possibilitou que o cineasta dirigisse a sequência "Jurassic Park: O Mundo Perdido" (1997) e tomasse conta da produção executiva de “Jurassic World” (2015).

Mas o envolvimento de Spielberg com os bichões pré-históricos não começou com "Parque dos Dinoussauros". Nos anos 80 ele produziu, ao lado do amigo George Lucas, um outro filme emblemático sobre os animais: a animação "Em Busca do Vale Encantado" (1988).

Mundo tecnológico

Outra questão essencial para o nerd Spielberg é como lidamos com a tecnologia. Esse é, inclusive, um dos temas de "Jogador Número 1".

Em “Minority Report” (2002), ele abordou como os aparatos da polícia e de defesa do Estado teriam controle sobre a população. Já em “A.I.: Inteligência Artificial” (2001), uma criança robô que quer o amor de sua mãe foi o foco, colocando emoção no lugar das engrenagens das máquinas.

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As chaves de "Jogador Número 1"

Warner Bros. Pictures/Divulgação Warner Bros. Pictures/Divulgação

A história de "Jogador Número 1" saiu da cabeça do escritor (e nerd) Ernest Cline, autor do livro homônimo. É dele também o roteiro, escrito em parceria com Zak Penn (de "X-Men: O Confronto Final", "O Incrível Hulk" e "Os Vingadores"). 

A ação se passa no distópico ano de 2045, com boa parte da população vivendo na extrema pobreza. A válvula de escape para praticamente todas as pessoas é o Oasis, uma plataforma de realidade virtual que serve como jogo, entretenimento e rede social, onde qualquer um pode ser o que quiser.

O Oasis foi criado por James Halliday, um homem aficionado pela cultura dos anos 80, que deixou milhares de referências aos filmes, aos games e às músicas daquela década. Com a morte de Halliday, o Oasis também vira uma caça ao tesouro, uma vez que quem encontrar um "easter egg" (no caso literalmente um ovo) dentro do jogo receberá a herança bilionária de Halliday -e o controle total da plataforma.

O filme tem elementos clássicos do cinema de Spielberg, como o elenco juvenil afiado, a trama simples, a caça ao tesouro e o vilão que flerta com o caricato, tudo isso embalado em um espetáculo visual deslumbrante e com centenas de alusões à cultura pop. 

A corrida inicial de carros, com Mach 5, Batmóveis e DeLoreans, é incrível. Além da clássica referência ao animê "Speed Racer", é possível também perceber pitadas de "Need For Speed", "Carmageddon" e "Mario Kart", com os personagens fugindo do gorilão de "King Kong" e do T-Rex de "Parque dos Dinossauros". 

Spielberg aproveita o filme para prestar homenagens. Não é por acaso que uma parte da aventura se passe dentro do hotel Overlook, do filme “O Iluminado”, dirigido por um de seus maiores ídolos, Stanley Kubrick. Foi Spielberg quem assumiu o projeto de "A.I.: Inteligência Artificial" após a morte de Kubrick, em 1999.

Quem também ganhou o carinho do diretor foi o amigo Robert Zemeckis. Além do DeLorean, uma outra referência a "De Volta para o Futuro" é a utilização de um artefato que permite que os personagens voltem um minuto no tempo.

Seis referências aos anos 80

  • Freddy Krueger

    Freddy Krueger, vilão de "A Hora do Pesadelo", de Wes Craven, lançado em 1984, aparece rapidamente no filme durante uma batalha em que os personagens se envolvem. O clássico do terror até hoje sobrevive no imaginário popular e não poderia ficar de fora de "Jogador Nº 1".

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  • De Volta para o Futuro

    Há várias referências à franquia "De Volta Para o Futuro", de 1985. Em um momento do filme, Percival aparece usando a jaqueta de Marty MCFly, mas é o seu carro que chama a atenção. O veículo aparece em vários momentos do filme e é bastante semelhante à maquina do tempo de McFly, só que bem mais potente.

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  • Digam o Que Quiserem

    Uma cena clássica do filme "Digam o Que Quiserem", de 1989, com John Cusack, é o momento em que ele levanta um toca-fitas da Sharp sobre a cabeça. Em "Jogador Nº 1", Percival usa o aparelho para convocar os usuários do Oasis para uma guerra, ao som de "We're Not Gonna Take It", do Twisted Sister.

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  • Brinquedo Assassino

    Outro personagem dos filmes de terror dos anos 1980 é Chuck, o brinquedo assassino. Em "Jogador Nº 1", o brinquedo é usado como uma insana arma de guerra. Basta soltá-lo no gramado e aguardar o estrago ser feito. É impossível não dar boas risadas com a cena.

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  • Street Fighter

    Um dos games mais lembrados dos anos 80 é Street Fighter. Durante toda a projeção, é possível ver avatares com os personagens do game, como a Chun-Li, o Ryu e o Ken. Afinal de contas, qual criança dos anos 80, viciada em games, nunca quis incorporar um deles?

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  • Gundam

    O robô gigante Gundam, criado em 1979 para uma série de animês japoneses, também está no filme. O robô, modelo RX-78, protagoniza uma luta épica entre gigantes, digna das melhores séries do gênero.

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Ficção ou realidade?

Spielberg acredita que o mundo retratado em "Jogador Número 1" pode acontecer

Do fundo do baú

  • "Tom Sawyer", Rush

    A trilha sonora de "Jogador Nº 1" é um caso a parte. Ela resume o que de melhor foi lançado no período. A banda canadense Rush é uma das mais emblemáticas. Com suas letras elaboradas, que falam sobre ficção científica, ela é considerada a banda nerd por excelência. É claro que Tom Sawyer, um dos clássicos do grupo, não poderia ficar de fora.

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  • "World in My Eyes", Depeche Mode

    O Depeche Mode, que se apresentou em São Paulo recentemente, também está na trilha. Formado nos anos 1980, o grupo inglês de música eletrônica e rock, ajudou a apontar a música para o futuro. No filme, a trilha surge em uma balada moderna onde os dois personagens principais dançam juntos.

    Imagem: Paul Bergen/AFP
  • "Stayin' Alive", Bee Gees

    Outra faixa que aparece na balada "top" é "Stayin' Alive", do Bee Gees, clássico do filme "Embalos de Sábado a Noite". No filme, os dois personagens criam uma pista de dança colorida, semelhante àquela em que Tony Manero dança com Stephanie Mangano.

    Imagem: AP
  • "Jump", Van Halen

    É impossível ouvir e não reconhecer os primeiros riffs de "Jump", do Van Halen. A faixa é a primeira a ser tocada em "Jogador Nº 1" e é usada para ajudar o personagem Percival a acordar. Não a toa, ela tem na letra "Eu me levanto, e nada me faz cair". Nada melhor para começar um filme em homenagem aos anos 1980.

    Imagem: AP
  • "Take on Me", a-ha

    Não foi só no Brasil que a-ha fez um sucesso estrondoso. Nos Estados Unidos, o grupo norueguês também dominou as paradas de sucesso oitentistas. Ela está na trilha sonora do filme eé possível ouvi-la ao fundo em diversas cenas.

    Imagem: Edu Garcia/UOL
  • "We're Not Gonna Take It", Twisted Sister

    O emblemático hit do Twisted Sister é tocado em uma das cenas mais movimentadas do filme, quando Percival e seus amigos vão para batalha. Antes, no entanto, o personagem levanta um toca-fitas Sharp e convoca o seu exército. Aí, não tem como errar.

    Imagem: Alex Almeida/ UOL

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