
Aos 71 anos, Steven Spielberg é um dos poucos cineastas de Hollywood que merece o adjetivo de lenda. Dono de três Oscars, ele tem em sua filmografia verdadeiras obras-primas, como “Tubarão”, “A Lista de Schindler”, “Contatos Imediatos do Terceiro Grau” e “O Resgate do Soldado Ryan”.
Mas são seus títulos de ação e aventura que o transformaram em ícone. A franquia “Indiana Jones”, “E.T. O Extraterrestre”, “Hook - A Volta do Capitão Gancho” e “Parque dos Dinossauros”, são apenas alguns exemplos da habilidade de Spielberg em contar uma história divertida. E o diretor ainda participou da produção de clássicos como "De Volta para o Futuro", "Os Goonies", "Gremlins"...
Nesta semana, estreia mais um típico filme de Spielberg, daqueles para entrar na lista acima. "Jogador Nº 1" é ambientado no futuro, mas com um pé nos anos 1980 e cheio de autorreferências e homenagens aos clássicos da década em que o diretor reinou absoluto em Hollywood. E essa volta ao passado é uma ótima chance para ver que o cineasta ainda consegue entregar uma aventura empolgante e atual.
No final dos anos 70, Spielberg pôde arriscar seu lado geek no clássico “Contatos Imediatos do Terceiro Grau” (1977), quando diversos fenômenos inexplicáveis assustaram os norte-americanos. Já estavam lá a trilha sonora misteriosa, os efeitos de luz, os OVNIS e, claro, a aproximação entre humanos e alienígenas.
O filme serviu como um aperitivo do que viria cinco anos depois em “E.T. – O Extraterrestre” (1982), com uma trama mais inocente e emotiva sobre uma criança que encontrou uma criatura “diferente”, que precisa de um telefone para ligar para a família lá do outro lado da galáxia. A obra-prima que quase chegou a US$ 1 bilhão nas bilheterias ainda tinha uma marca do diretor, o uso de bonecos para driblar a falta de tecnologia da época.
“Guerra dos Mundos” (2005) foi baseado na obra homônima de H.G. Wells, apresentando literalmente uma combate mortal entre os homens e os seres de outro planeta. O diretor atualizou a trama, colocando tripods em meio a carros e antenas gigantescas. Spielberg sempre foi apaixonado pelo livro e não perdeu tempo quando conseguiu os direitos para levá-lo aos cinemas.
Spielberg, assim como diversas crianças, nutria uma paixão gigantesca pelos dinossauros, e é dele o filme definitivo sobre o tema. Em “Parque dos Dinossauros” (1993), o diretor revolucionou Hollywood criando animais ultrarrealistas em computação gráfica. Assim, velociraptors e T-Rexs ganharam vida e iniciaram uma das franquias de maior sucesso do cinema.
O trabalho minucioso da equipe de filmagem, que também contou com gigantescos bonecos animados em algumas cenas, transformou em realidade o sonho do diretor. Spielberg ficou fascinado ao ver os dinossauros correndo nos computadores da época.
O sucesso ainda possibilitou que o cineasta dirigisse a sequência "Jurassic Park: O Mundo Perdido" (1997) e tomasse conta da produção executiva de “Jurassic World” (2015).
Mas o envolvimento de Spielberg com os bichões pré-históricos não começou com "Parque dos Dinoussauros". Nos anos 80 ele produziu, ao lado do amigo George Lucas, um outro filme emblemático sobre os animais: a animação "Em Busca do Vale Encantado" (1988).
Outra questão essencial para o nerd Spielberg é como lidamos com a tecnologia. Esse é, inclusive, um dos temas de "Jogador Número 1".
Em “Minority Report” (2002), ele abordou como os aparatos da polícia e de defesa do Estado teriam controle sobre a população. Já em “A.I.: Inteligência Artificial” (2001), uma criança robô que quer o amor de sua mãe foi o foco, colocando emoção no lugar das engrenagens das máquinas.
A história de "Jogador Número 1" saiu da cabeça do escritor (e nerd) Ernest Cline, autor do livro homônimo. É dele também o roteiro, escrito em parceria com Zak Penn (de "X-Men: O Confronto Final", "O Incrível Hulk" e "Os Vingadores").
A ação se passa no distópico ano de 2045, com boa parte da população vivendo na extrema pobreza. A válvula de escape para praticamente todas as pessoas é o Oasis, uma plataforma de realidade virtual que serve como jogo, entretenimento e rede social, onde qualquer um pode ser o que quiser.
O Oasis foi criado por James Halliday, um homem aficionado pela cultura dos anos 80, que deixou milhares de referências aos filmes, aos games e às músicas daquela década. Com a morte de Halliday, o Oasis também vira uma caça ao tesouro, uma vez que quem encontrar um "easter egg" (no caso literalmente um ovo) dentro do jogo receberá a herança bilionária de Halliday -e o controle total da plataforma.
O filme tem elementos clássicos do cinema de Spielberg, como o elenco juvenil afiado, a trama simples, a caça ao tesouro e o vilão que flerta com o caricato, tudo isso embalado em um espetáculo visual deslumbrante e com centenas de alusões à cultura pop.
A corrida inicial de carros, com Mach 5, Batmóveis e DeLoreans, é incrível. Além da clássica referência ao animê "Speed Racer", é possível também perceber pitadas de "Need For Speed", "Carmageddon" e "Mario Kart", com os personagens fugindo do gorilão de "King Kong" e do T-Rex de "Parque dos Dinossauros".
Spielberg aproveita o filme para prestar homenagens. Não é por acaso que uma parte da aventura se passe dentro do hotel Overlook, do filme “O Iluminado”, dirigido por um de seus maiores ídolos, Stanley Kubrick. Foi Spielberg quem assumiu o projeto de "A.I.: Inteligência Artificial" após a morte de Kubrick, em 1999.
Quem também ganhou o carinho do diretor foi o amigo Robert Zemeckis. Além do DeLorean, uma outra referência a "De Volta para o Futuro" é a utilização de um artefato que permite que os personagens voltem um minuto no tempo.
Freddy Krueger, vilão de "A Hora do Pesadelo", de Wes Craven, lançado em 1984, aparece rapidamente no filme durante uma batalha em que os personagens se envolvem. O clássico do terror até hoje sobrevive no imaginário popular e não poderia ficar de fora de "Jogador Nº 1".
Imagem: DivulgaçãoHá várias referências à franquia "De Volta Para o Futuro", de 1985. Em um momento do filme, Percival aparece usando a jaqueta de Marty MCFly, mas é o seu carro que chama a atenção. O veículo aparece em vários momentos do filme e é bastante semelhante à maquina do tempo de McFly, só que bem mais potente.
Imagem: DivulgaçãoUma cena clássica do filme "Digam o Que Quiserem", de 1989, com John Cusack, é o momento em que ele levanta um toca-fitas da Sharp sobre a cabeça. Em "Jogador Nº 1", Percival usa o aparelho para convocar os usuários do Oasis para uma guerra, ao som de "We're Not Gonna Take It", do Twisted Sister.
Imagem: DivulgaçãoOutro personagem dos filmes de terror dos anos 1980 é Chuck, o brinquedo assassino. Em "Jogador Nº 1", o brinquedo é usado como uma insana arma de guerra. Basta soltá-lo no gramado e aguardar o estrago ser feito. É impossível não dar boas risadas com a cena.
Imagem: DivulgaçãoUm dos games mais lembrados dos anos 80 é Street Fighter. Durante toda a projeção, é possível ver avatares com os personagens do game, como a Chun-Li, o Ryu e o Ken. Afinal de contas, qual criança dos anos 80, viciada em games, nunca quis incorporar um deles?
Imagem: DivulgaçãoO robô gigante Gundam, criado em 1979 para uma série de animês japoneses, também está no filme. O robô, modelo RX-78, protagoniza uma luta épica entre gigantes, digna das melhores séries do gênero.
Imagem: DivulgaçãoA trilha sonora de "Jogador Nº 1" é um caso a parte. Ela resume o que de melhor foi lançado no período. A banda canadense Rush é uma das mais emblemáticas. Com suas letras elaboradas, que falam sobre ficção científica, ela é considerada a banda nerd por excelência. É claro que Tom Sawyer, um dos clássicos do grupo, não poderia ficar de fora.
Imagem: DivulgaçãoO Depeche Mode, que se apresentou em São Paulo recentemente, também está na trilha. Formado nos anos 1980, o grupo inglês de música eletrônica e rock, ajudou a apontar a música para o futuro. No filme, a trilha surge em uma balada moderna onde os dois personagens principais dançam juntos.
Imagem: Paul Bergen/AFPOutra faixa que aparece na balada "top" é "Stayin' Alive", do Bee Gees, clássico do filme "Embalos de Sábado a Noite". No filme, os dois personagens criam uma pista de dança colorida, semelhante àquela em que Tony Manero dança com Stephanie Mangano.
Imagem: APÉ impossível ouvir e não reconhecer os primeiros riffs de "Jump", do Van Halen. A faixa é a primeira a ser tocada em "Jogador Nº 1" e é usada para ajudar o personagem Percival a acordar. Não a toa, ela tem na letra "Eu me levanto, e nada me faz cair". Nada melhor para começar um filme em homenagem aos anos 1980.
Imagem: APNão foi só no Brasil que a-ha fez um sucesso estrondoso. Nos Estados Unidos, o grupo norueguês também dominou as paradas de sucesso oitentistas. Ela está na trilha sonora do filme eé possível ouvi-la ao fundo em diversas cenas.
Imagem: Edu Garcia/UOLO emblemático hit do Twisted Sister é tocado em uma das cenas mais movimentadas do filme, quando Percival e seus amigos vão para batalha. Antes, no entanto, o personagem levanta um toca-fitas Sharp e convoca o seu exército. Aí, não tem como errar.
Imagem: Alex Almeida/ UOL