No Pará, o que poderia ser uma oportunidade única para mais de 750 estudantes carentes da rede pública acabou se transformando em um bom negócio para duas empresas.
Elas foram contratadas sem licitação pela Prefeitura de Marituba, a 11 km de Belém, para ministrar aulas de inglês nas escolas e fornecer o material didático, composto por três livros e três DVDs.
Além da dispensa de licitação, a Operação Lesson descobriu que o esquema envolvia empresários e servidores públicos apontados como responsáveis pelo superfaturamento de preços, emissão de notas fiscais falsas e pagamentos por serviços não prestados.
Cada um dos kits, adquiridos pelas firmas a R$ 36, foi vendido ao município por R$ 1.800 --um superfaturamento de quase 5.000%
Segundo o Ministério Público Federal no Pará, as irregularidades tiveram aval da Secretaria de Educação de Marituba e, apesar do superfaturamento, o município adquiriu 500 livros desses fornecedores a R$ 900 mil.
Em nota, a Prefeitura de Marituba disse que não tinha contrato de serviço com a empresa envolvida e que contribuiu com as investigações, disponibilizando os documentos necessários para comprovar a legalidade do município no processo licitatório.
Outros municípios que também fizeram negócios com as mesmas empresas foram alvo da Operação Lessons, realizada em junho do ano passado pela Polícia Federal. Oito pessoas, incluindo servidores públicos, foram presas e denunciadas à Justiça pelo MPF. Todos os envolvidos respondem ao processo em liberdade.
Tem fraude que parece pequena e causa um estrago enorme, especialmente na região Norte, onde o desvio de dinheiro no caixa de uma escola pode ser tão relevante quanto uma fraude em licitação pública.
No Amapá, por exemplo, a PF entrou em ação para estancar um rombo no caixa de uma escola, de onde alguns funcionários levaram R$ 400 mil da merenda dos alunos.
Nem a pesca artesanal escapa da corrupção. Criado para ajudar os pescadores durante o período em que a atividade é proibida, o Seguro Defeso envolveu fraudes que chegaram a R$ 1,6 bilhão nos últimos cinco anos. Em dezenas de operações, a PF, a CGU e os ministérios do Trabalho e da Agricultura desvendaram esquemas milionários que poderiam ser ainda maiores.
O Seguro Defeso é um benefício mensal, equivalente a um salário-mínimo, concedido a pescadores artesanais durante o período de reprodução dos peixes, quando a pesca é temporariamente proibida. Somente no Pará, a Operação História de Pescador revelou, em 2016, desvios estimados em R$ 10 milhões, mas uma nova auditoria da CGU apontou um prejuízo potencial muito maior, de R$ 185 milhões. Em apenas um mês, o programa recebeu inscrições de 55 mil pessoas. Os desvios também envolviam dirigentes sindicais e servidores públicos. Alguns deles estavam entre os 17 presos em março de 2017 em sete cidades paraenses.
“O que é de estarrecer mesmo é que, não raro, os servidores envolvidos aludem aos crimes com grande escárnio, em tom jocoso, afrontando os órgãos de controle, a Justiça como um todo, e a própria sociedade”, afirmou o procurador da República Reginaldo Pereira de Trindade.