Capitã planeta

Kahena, que trabalha nas águas, se guia pelo contato com a natureza. Da alimentação ao hobby

Gustavo Franceschini Do UOL, em São Paulo
Saulo Cruz/Exemplus/COB Saulo Cruz/Exemplus/COB

As promessas que você deve conhecer

A vela tem nomes de peso como Robert Scheidt e Torben Grael. Na Rio-2016, porém, é em uma novata que você deve prestar atenção. Ao lado de Martine Grael, com quem forma dupla na classe 49erFX, Kahena Kunze é favorita a uma medalha nos Jogos Olímpicos.

Neste especial, você vai ver que ela não é velejadora por acaso. O contato com a natureza que o esporte permite faz parte do estilo de vida e define hobbies, alimentação e o trabalho de Kahena, que aceitou o desafio de voltar aos barcos há quatro anos após um convite por e-mail de Martine. Dizer sim à aventura tipo faz parte do espírito dessa paulista de 25 anos, que já teve de aprender a esquiar na marra, rolando montanha na Suíça.

São essas e outras histórias que você vai encontrar neste especial, o quarto de uma série que mostra mais sobre as promessas do Brasil que você deve conhecer. Antes dela, Isaquias Queiroz, Robson Conceição e Victor Penalber já foram retratados. Tudo para que você não chegue despreparado para torcer na Olimpíada. 

Por que você deve prestar atenção em Kahena

O que fará a diferença na Olimpíada de Kahena

Jen Edney/EdneyAP/49er Class Jen Edney/EdneyAP/49er Class

Domínio do barco

Um dos desafios de um velejador é ter o domínio constante de seu barco. Saber como ele vai reagir a cada tipo de vento, qual mudança fazer a cada desvio de rota ou mudança climática... Kahena e Martine se destacaram logo cedo na 49erFX justamente por conhecerem essas ferramentas. Agora, essas técnicas terão de ser colocadas em prática na "hora h".

Felipe Dana/AP Felipe Dana/AP

Conhecimento do Rio

A disputa da vela na Rio-2016 é considerada especialmente difícil pela variedade de percursos possíveis na Baía da Guanabara. Conhecer as variações de rota, vento e as particularidades do ambiente, então, é sempre uma vantagem. Bom para Kahena e Martine, que treinam em Niterói e estão em contato constante com o palco das Olimpíadas.

Saulo Cruz/Exemplus/COB Saulo Cruz/Exemplus/COB

Pressão externa

Desde o início do atual ciclo, a dupla é uma das maiores apostas de medalha do COB e, consequentemente, da mídia e do público. Só que tanto Kahena quanto Martine estão estreando em Olimpíadas, e nem sempre é fácil reagir a esse tipo de expectativa. Por isso, saber lidar com o status de favorita é uma das chaves para que a dupla consiga ir ao pódio.

Reprodução/Instagram Reprodução/Instagram

Contato com a natureza, para Kahena, vai além das aulas de ecologia

“Não sujar, não poluir, ser consciente com o meio ambiente...”. Hoje, uma lição de ecologia vai além do que ensinava o “Capitão Planeta”, personagem do desenho animado nos anos 1990. Quem gosta do contato com a natureza pode transformar isso em um estilo de vida bem mais complexo do que simplesmente “fazer a sua parte”. Se você quiser aprender, Kahena Kunze ppderia explicar bem.

Não é de uma hora para outra. Tem a ver com ter crescido no mar, no barco dos pais, como ela mesmo diz. Kahena fala empolgada do barulho das águas em um dia de velejo e desde adolescente se interessava por uma alimentação orgânica. Quiches de banana e lanchinhos com passas e nozes compunham a dieta com a amiga Ana Jungen, hoje nutricionista. A vela sempre fez parte da vida, mas quando fez uma pausa nas competições Kahena usou a lógica para escolher uma faculdade:

Eu saí da escola sem saber muito o que estudar, né? E pelo fato de gostar tanto de estar na natureza achei que seria uma boa fazer engenharia ambiental

Hoje, ela é uma atleta de alto rendimento, mas com uma grande diferença para seus pares. Para a maioria, a vida regrada em nome do sucesso é custosa. Não poder beber, comer ou sair à noite como uma pessoa “normal” são as maiores queixas de quem sonha com conquistas esportivas. Kahena Kunze não vive esse drama. Lazer? Para ela, curtição significa uma noite de sono e um despertar bem cedo para fazer esporte com as amigas.
 

Barco já deu susto em alto-mar e hoje é meio de transporte

Arte/UOL
Arquivo pessoal Arquivo pessoal

Aventureira, aprendeu a esquiar na marra e rodou pela Europa

Lidar bem com riscos no mar e gostar de encarar diferentes esportes são características que ajudam a explicar Kahena. “Ela sempre foi aventureira, tem esse espírito de assumir riscos. Isso também tem a ver com a vela, você vai adquirindo essa personalidade”, conta o irmão Erik. Ana viveu isso na pele.

“Nós passamos um inverno trabalhando numa estação de esqui. A Kahena não tinha noção, nunca tinha pisado em um snowboard. Ela trabalhava num restaurante no topo da montanha e eu no vale. Teve de aprender na marra. Quando acabava o dia eu ficava esperando e só via uma bolinha preta descendo a montanha meio rolando, meio empacando. Eu só escutava os berros [risos]”, relembra Ana.

A viagem foi no começo de uma “folga” do esporte. Ao passar de júnior para adulta, ela deu um tempo no esporte, foi viajar e começou a faculdade. Esse hiato acabou há pouco menos de quatro anos, às vésperas de uma nova viagem. Kahena e Ana estavam a caminho de uma fazenda no interior de Portugal onde trabalhariam na colheita de produtos do local em troca de hospedagem. Foi quando chegou um email que mudou tudo:

Era a Martine perguntando: ‘Você estaria interessada em velejar comigo e começar uma campanha?’ E ela: ‘Caraca, Ana, o que você acha? Acha que eu devo fazer isso?’. É claro, né?
 

Bruno Ryfer/Omega Bruno Ryfer/Omega

"História de amor", relação com Martine supera qualquer instabilidade

Kahena foi à fazenda em Portugal, terminou sua viagem e voltou ao Brasil para buscar o sonho olímpico. Velejar com Martine era reviver uma parceria que deu certo na adolescência. Juntas, elas conquistaram o Mundial júnior na classe 420. O desempenho na 49erFX mostrou que elas estavam afinadas, com títulos e mais títulos. Só que nem tudo são flores, é claro.

“É que nem uma história de amor. No começo é muito bom: ‘Vamos sair juntos, vamos fazer tudo junto’. E aí tem uma hora que tudo começa a te irritar: ‘Não, você fez isso, isso me irritou’. Com o passar do tempo, você começa a aceitar mais as coisas”, define Martine, que se diz “mandona”. “Nos últimos quatro anos o que eu mais aprendi foi comunicação e relacionamento. Quando você convive muito tempo com a pessoa qualquer palavrinha que você fale pode atingir. Você tem de saber se expressar”, completa Kahena.

Nada disso significa um mau relacionamento. Pelo contrário. Além das horas de treino e preparação, elas ainda convivem nos momentos de lazer. O último Reveillon, por exemplo, Kahena e Martine passaram juntas, com a companhia da amiga Juliana, um dos elos que as unem no dia a dia. Na Rio-2016, elas não terão companhia. O sucesso até agora, no entanto, indica que a parceria deve seguir funcionando mesmo assim.  

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