Entre os 15 representantes de entidades, sindicatos e associações dos setores organizados da nossa economia entrevistados nesta reportagem, todos falam da necessidade de uma reforma tributária ampla. É necessário desonerar o consumo, a renda e a produção.
"Precisamos de uma reforma tributária na qual o rico e a riqueza fossem tributados, para começar", afirma Clemente Ganz Lúcio, diretor-técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). "Isso não acontece hoje no Brasil, quem é rico não paga imposto e faz isso legalmente, sem sonegar. Os ricos, seja pelo salário, seja pela renda financeira, seja aplicação, aluguéis, dividendos, pro labore, não importa... Tudo tinha que ter tributação progressiva, e não tem."
Para ele, outra reforma fundamental na área é tributar mais fortemente as heranças. "A sociedade não tem interesse que essa riqueza se acumule indefinidamente. Tem que ter uma tributação sobre a herança. Hoje o herdeiro paga de 4% a 8% de imposto sobre herança, de acordo com o estado. Seja um carro ou um trilhão de reais, a taxa é 4%. Dessa forma a riqueza é acumulada para sempre", diz Lúcio.
"Nos países ricos, desenvolvidos, você tem uma política clara de tributar progressivamente a herança, evitando que a herança vire um motivo de acumulo de riqueza e desigualdade que a sociedade não quer. É assim nos EUA. Estimulam a criação de fundações. Coloca sua grana lá, e ela vai financiar coisas para o bem coletivo. Tem problemas, não deixa de ser um mecanismo de evitar a cumulação infinita de pessoas físicas", explica o diretor-técnico do Dieese.
"Não faz sentido uma sociedade deixar que as pessoas acumulem algo que não é razoável acumular", diz Lúcio. Para ele, outra distorção é o não-pagamento de impostos sobre dividendos. "Qualquer um que tem CNPJ hoje não paga imposto de renda, recebe tudo como dividendo ou pro labore. Outra coisa é que, mesmo entre quem paga imposto de renda, a distorção é muito grande. Ganhe você R$ 5.000 ou R$ 100 mil, a faixa de imposto é a mesma: 27,5% do seu salário. Está certo isso?"
IR desatualizado: quem paga mais é você
Neste ano, por exemplo, o governo federal não atualizou de novo a tabela do IR (Imposto de Renda) -- o último reajuste foi em 2015. Segundo o Sindifisco (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal), desde 1996 a defasagem na tabela do imposto de renda é de 88,6%. Isso significa que se a tabela fosse corrigida menos gente teria que pagar IR, e a maioria dos contribuintes pagariam um valor menor.
Hoje, não paga IR quem ganha até R$ 1.903,98 por mês. Se a tabela do IR tivesse sido atualizada (de acordo com o Sindifisco), a isenção seria para todos que ganham até R$ 3.556,56 mensais. Esses valores consideram o salário já descontado o INSS. Isso só na renda do cidadão. Tanto no investimento quando no consumo, a tributação elevada também é a regra.
"No Brasil a gente tributa o investimento, a exportação e o consumo final", diz José Augusto Fernandes, diretor de Políticas e Estratégia da CNI (Confederação Nacional da Indústria). "Está errado. Pega esse exemplo: se eu quiser abrir uma siderúrgica no Brasil, no México, na Austrália ou no Reino Unido. No Brasil eu começo com um custo tributário de 8% antes de começar a operar a planta. Nos três outros países, o custo tributário máximo é de 1%. Na maior parte do mundo é assim. O nosso sistema tributário joga contra, é anti-crescimento econômico", afirma Fernandes. "Até na prateleira do mercado. Dependendo do produto, mais de 30%, 40% do valor é imposto."
Na opinião dele, se ocorresse uma ampla reforma tributária -- desonerando consumo, renda e investimento -- apesar de que em um primeiro momento o governo arrecadaria menos, a médio prazo a arrecadação aumentaria bastante em função de um maior crescimento econômico.
"Além de serem muitos tributos e muito caros, as empresas têm uma dificuldade enorme de entender o sistema tributário brasileiro e conseguir pagar os impostos corretamente", José Roriz Coelho, presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). "É muito complicado. Nosso sistema tributário, além de pesadíssimo, é confuso e ineficiente."
O problema é que com um déficit fiscal primário de pelo menos R$ 139 bilhões esperado para 2019, o governo não tem condições de abrir mão de arrecadação, e talvez seja obrigado a aumentar impostos a curto prazo, mesmo que isso significasse uma arrecadação maior no futuro, dizem economistas críticos da ideia.
"Esse raciocínio não faz sentido. Se o governo ajudar o país voltar a crescer, a arrecadação cresce junto. A cada 1% do PIB que cai, a arrecadação cai 1,5%. Aumentar impostos significa derrubar a arrecadação e aumentar o déficit", afirma o presidente da Fiesp.