Enquanto entra em guerra pelo país afora, o PCC precisa resolver ao mesmo tempo seus problemas internos.
Em um período de três meses, quatro homens, até então apontados como intocáveis na cúpula, foram assassinados por determinação da própria facção criminosa. As mortes geraram grande alarde e viraram tema na opinião pública.
Em dezembro do ano passado, Marcola cumpria o seu último mês de um ano em regime de isolamento. Pouco antes de ele ser liberado da solitária, seu amigo Edilson Borges Nogueira, o Biroska, foi assassinado dentro da penitenciária 1 de Presidente Venceslau.
No enterro de Biroska, houve explosão de fogos e grande presença de público. Dentro das prisões, a morte do criminoso, que havia sido expulso da cúpula do PCC porque sua companheira brigou com outras mulheres de presos dentro de um ônibus, não foi bem recebida.
O MP paulista apontou que a morte de Biroska poderia ter sido ordenada por Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue. Ele era o principal líder da facção em liberdade entre fevereiro de 2017 e fevereiro de 2018, quando foi morto, junto com Fabiano Alves de Souza, o Paca.
Investigação da Polícia Civil aponta que Gegê e Paca estariam roubando dinheiro da própria facção. Alguns envolvidos no duplo homicídio foram presos, porém, detalhes do caso permanecem envoltos em mistério. Não se sabe, por exemplo, quem exatamente da cúpula do PCC deu autorização para as mortes. No enterro deles, e dentro do sistema penitenciário paulista, diferentemente da reação à morte de Biroska, houve silêncio.
"O PCC age como se fosse uma empresa. Porém, as empresas demitem. Eles, dependendo da situação, se consideram que houve uma traição, cumprem o estatuto: dependendo do grau da falta, alguns casos são pagos com a morte. Nos últimos casos [do início de 2018], foi por desvio de dinheiro", afirma o jornalista e escritor Josmar Jozino, autor de uma trilogia sobre o crime organizado paulista: "Cobras e Lagartos" (2005), "Casadas com o crime" (2008) e "Xeque-Mate: O tribunal do crime e os letais boinas pretas – Guerra sem fim" (2012).
Após as mortes de Gegê e Paca, três homens foram fuzilados no bairro do Tatuapé, na zona leste de São Paulo. A suspeita é a de que foram assassinados numa ação de queima de arquivo. Os dois primeiros, ainda em fevereiro, foram Eduardo Ferreira da Silva, o Borel, dentro de uma Mercedes-Benz, e Wagner Ferreira da Silva, o Cabelo Duro, em frente a um hotel.
Cabelo Duro, segundo o MP, estava no helicóptero que levou à morte Gegê e Paca em uma reserva indígena no Ceará. Em 23 de julho, foi a vez de Cláudio Roberto Ferreira, o Galo Cego, ser alvo de 70 tiros de fuzil dentro de um Audi Q3 blindado. Ele também estaria envolvido nas mortes de fevereiro.
Esta não é a primeira vez que o crime organizado de São Paulo mata seus membros mais renomados. Sempre que há um indício de ruptura dentro do grupo, aquele que está gerando discórdia é assassinado. Tem sido esta a regra.
A última crise interna relevante, antes da atual, aconteceu em novembro de 2005, quando o então número 2 da facção, Sandro Henrique da Silva Santos, o Gulu, e outras seis pessoas morreram a tiros em um período de dois dias.
"Em novembro de 2002, quando o Marcola assumiu a liderança do PCC, junto a ele tinha o Gulu --o grande traficante da Baixada. Os dois eram as duas lideranças iminentes. Depois dos sete mortos, o irmão de Gulu foi assassinado, a mãe teve de fugir e Marcola saiu fortalecido como o principal nome do PCC", relembra o pesquisador Bruno Paes Manso, do NEV-USP (Núcleo de Estudos da Violência da USP).