Era um outro momento do Brasil quando a biomédica Lais Baptista, 28, deixou o Rio de Janeiro, em 2013, para fazer um doutorado por intermédio do programa Ciência sem Fronteiras na University of Central Lancashire, no Reino Unido.
"No ano em que eu entrei no doutorado, a pesquisa no Brasil estava no seu melhor momento nas últimas décadas, muitos artigos publicados, várias oportunidades. Foi nessa realidade que eu fui [viajar]", conta.
Quando voltou ao Brasil, no final do ano passado, tudo havia mudado.
"A troca para o governo Temer trouxe mudanças na política [para a produção científica]. Foi muito abrupto e os investimentos em pesquisa andam cada vez menores. Fui afetada. Quero seguir na pesquisa acadêmica, mas não há oportunidade", diz a biomédica.
Segundo os dados disponíveis no site da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), vinculada ao Ministério da Educação e que coordena a distribuição de bolsas para mestrado, doutorado e outras, houve uma redução de 16% nas bolsas concedidas para pesquisa. Foram de 96.110 em 2013 para 80.613 neste ano.
Em fevereiro, o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações anunciou um corte de 11% nas bolsas (de R$ 4,5 bilhões para cerca de R$ 4 bilhões).
O investimento em pesquisa já havia sofrido uma redução de 25% em relação ao ano anterior, de acordo com a proposta orçamentária para 2018.
Os cortes financeiros na ciência têm gerado o que se chama de "fuga de cérebros", ou seja, o êxodo de profissionais altamente qualificados do país para outros lugares do mundo.
Desde que concluiu o doutorado em genética forense, no começo deste ano, a pesquisadora reduziu gastos em lazer e cultura, mas diz que a ajuda dos pais não deixa a situação piorar. Ela também faz biscoitos amanteigados para pagar as contas.
"É uma forma de me ocupar. Sempre gostei de 'bakery' [panificação], é um hobby. Aí tive a ideia de vender para tirar um dinheiro extra", afirma.
Para as próximas eleições, ela diz que prestará atenção nos candidatos que se comprometam a revogar a PEC do Teto, que congelou os gastos em saúde e educação.
"Aquilo ali está praticamente matando a pesquisa científica brasileira nos próximos 20 anos --e sabe-se lá quantos anos vai demorar para se recuperar esse tempo perdido", opina.
"Sei que não se dá muita bola para a ciência em eleições, mas a pesquisa científica é um investimento a longo prazo para o país. No caso das ciências exatas, podemos criar tecnologias, trazer patentes."
Também está preocupada com uma proposta menos genérica para o alto contingente de desempregados. "Chamaria a minha atenção um candidato que tivesse um plano de ação, menos aberto do que simplesmente 'vamos diminuir o desemprego', mas com ações concretas e realistas."
Apesar da crise e da falta de oportunidade, Lais faz planos: conta que está tentando uma bolsa de pesquisa de pós-doutorado junto a um laboratório fluminense. Se não conseguir, vai tentar novamente em março do ano que vem.
"O Ciência sem Fronteiras exige a contrapartida de que se fique no país o período do doutorado, ou seja, quatro anos. É justo. Mas, caso não dê certo, vou pagar parte da dívida dos meus estudos de doutorado e vou embora do Brasil. Meu maior receio é perder habilidades pela falta de contato com a pesquisa", diz.