Bolsonaro e os generais

Militares planejam ações de eventual governo e tentam manter campanha ativa nos estados

Luis Kawaguti Do UOL, no Rio

Enquanto a campanha do presidenciável do PSL, Jair Bolsonaro, que se recupera em hospital de São Paulo de um ataque a faca, tenta apagar incêndio provocado pela defesa da recriação da CPMF pelo economista Paulo Guedes e por declarações polêmicas do candidato a vice, general Hamilton Mourão (PRTB) --o militar foi orientado a reduzir aparições públicas e o "guru econômico" de Bolsonaro cancelou uma série de compromissos--, um grupo de militares de alta patente continua trabalhando para aprofundar o plano de governo e manter a campanha ativa nos estados.

Em posições estratégicas na campanha, ao menos nove generais e um brigadeiro, todos da reserva das Forças Armadas, atuam em duas frentes: uma técnica, que elabora a plataforma de um eventual governo Bolsonaro, e uma política, onde trabalham como articuladores políticos do capitão reformado.

O grupo técnico, coordenado por três generais, um brigadeiro e um civil, é responsável por criar políticas de governo. Nas mãos deles, está a elaboração de diretrizes para as áreas de segurança pública, transportes e infraestrutura, aeroportos, educação, ciência e tecnologia.

Eles se reúnem quase diariamente no Hotel Brasília Imperial, no Distrito Federal, e permanecem em contato via WhatsApp. Juntos, coordenam equipe de cerca de 30 técnicos civis que elaboram diretrizes para um eventual governo.

Na área de infraestrutura, a prioridade é terminar obras não concluídas e resolver problemas nas malhas rodoviária e ferroviária; na educação, o foco é priorizar investimentos no nível básico da rede pública; na ciência e tecnologia, propõem incentivos a pesquisas em áreas estratégicas e, na defesa e segurança, querem integrar as polícias estaduais e federal para a troca de informações de inteligência. Também defendem revisão de benefícios de progressão de pena para condenados de crimes mais graves --a proposta, no entanto, depende de mudança na legislação penal.

Único civil com função de coordenador nesse núcleo, o cientista político Antônio Flávio Testa, doutor pela UNB (Universidade de Brasília) --a instituição diz que atualmente não possui vínculo com o acadêmico--, dedica-se à área de esportes e a questões indígenas. Assuntos relacionados à área econômica são tratados por um grupo à parte do núcleo técnico, sob o comando do economista Paulo Guedes.

O presidenciável disse em agosto que um eventual governo seu terá “um montão de ministro militar (sic)”, selecionados segundo ele, “de acordo com a competência e habilidade deles”. Ao menos dois dos generais que compõem a campanha admitiram ao UOL que aceitariam um possível convite --eles são hoje responsáveis pelas propostas nas áreas de segurança e infraestrutura.

No grupo político, outros seis generais da reserva agem nos estados --todos eles candidatos (a maioria disputando vaga na Câmara dos Deputados pelo PSL). A estratégia é promover Bolsonaro e, com ele, suas próprias candidaturas.

Nesse “front”, está o vice de Bolsonaro, Antônio Hamilton Mourão (PRTB), que tem no currículo passagens pelo Alto Comando do Exército e Comando Militar do Sul, e coleciona declarações polêmicas --entre as mais recentes, falou no começo do mês da possibilidade de um "autogolpe" do presidente com apoio das Forças Armadas em caso de hipotética situação de anarquia, e, na última segunda-feira (17), afirmou que famílias pobres "onde não há pai e avô, mas, sim, mãe e avó" são "fábricas de desajustados" que fornecem mão de obra ao tráfico de drogas.

O Exército diz que os militares engajados na campanha não representam a instituição --que se expressa somente pelas falas de seu comandante, o general Eduardo Villas Boas. O Exército se diz apartidário, mas declarações de Villas Boas têm provocado críticas.

Em entrevista publicada no dia 9 pelo jornal “O Estado de S.Paulo”, Villas Boas afirmou que o ataque a Bolsonaro mostra que “nós estamos agora construindo dificuldade para que o novo governo tenha uma estabilidade, para a sua governabilidade e podendo até mesmo ter sua legitimidade questionada”. Na mesma entrevista, ele descartou a hipótese de o Exército provocar uma quebra de ordem institucional.

Quem é quem no núcleo técnico

O núcleo técnico da campanha de Bolsonaro é dirigido por quatro militares da reserva (de alta patente) e um civil. A colaboração não envolve remuneração, segundo os militares.

Eles coordenam mais de 30 pessoas e elaboram planos e estratégias de ação para um eventual governo Bolsonaro --a maioria são técnicos civis, muitos deles servidores públicos de carreira que hoje atuam no governo Michel Temer (MDB).

Da coordenação desse grupo, podem sair ministros de um eventual governo Bolsonaro.

A campanha diz que ainda é cedo para se falar em composição de ministérios, ainda que Paulo Guedes já tenha sido cotado para comandar a área econômica. No entanto, o UOL conversou com três dos quatro militares do grupo técnico e dois deles disseram que aceitariam possíveis convites para assumir ministérios.

O general Augusto Heleno Ribeiro Pereira, que responde pelas áreas de defesa e segurança pública, diz não ter aspirações políticas, mas fala em colaborar com o país. “Se eu for convidado e aceitar, será só mais uma missão”, disse.

“Qualquer um ficaria honrado [com um convite para ser ministro]. Mas deixo Bolsonaro muito à vontade”, afirmou o general Ferreira, responsável pelas áreas de transporte, infraestrutura e mineração.

Já um brigadeiro da Aeronáutica que participa do grupo --e pediu para não ter o nome revelado-- disse que voltará à sua aposentadoria quando os trabalhos forem encerrados.

Segundo Mourão, o núcleo vem trabalhando para que Bolsonaro tenha um planejamento pronto, caso assuma a Presidência da República em 1º de janeiro de 2019. Essas estratégias aprofundam o plano de governo já apresentado.

Cada coordenador cuida de uma área específica, como segurança, transporte e educação. Eles se reúnem quase todos os dias para discutir e receber palestrantes e consultores --inclusive analistas com visões contrárias a Bolsonaro.

“Fizemos muitas reuniões na minha casa até o momento que começou a campanha”, conta o general Ferreira. A partir de março, as reuniões se intensificaram. Antes de Bolsonaro ser esfaqueado, costumava se reunir às quartas-feiras com o grupo técnico. A menos de um mês do pleito, o grupo se reúne no Hotel Brasília Imperial quase diariamente.

Ideias em debate

Na área de segurança, o grupo traça estratégias para combater a lavagem de dinheiro do tráfico de drogas, armas e madeira. Para o grupo, rastrear o dinheiro movimentado nessas atividades é a melhor forma de combater o crime organizado.

Em paralelo, defendem investir em dois programas das Forças Armadas de monitoramento de fronteiras, o Sisfron (Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras) do Exército, e o Sisgaaz (Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul), da Marinha, e aumentar os esforços diplomáticos para convencer países vizinhos a reprimir mais o tráfico.

Eles ainda discutem como integrar a troca de informações de inteligência da Polícia Federal com polícias estaduais. 

Para a equipe técnica de Bolsonaro, as Forças Armadas terão papel de destaque na segurança pública. Eles estudam formas para que militares possam ensinar as polícias estaduais a melhorar suas estruturas logísticas, para evitar por exemplo que veículos, armas e equipamentos fiquem fora de uso por falta de manutenção.

Também entendem que o Exército, a Marinha e a Aeronáutica devam continuar a ser usados em operações de Garantia da Lei e da Ordem e avaliam a possibilidade das escolas militares intensificarem o preparo dos soldados não só para a defesa contra inimigos externos, mas para ações de segurança pública no país.

Outra ideia em debate é a punição de crimes menos graves com penas alternativas e maior rigor em casos mais graves, impedindo que condenados tenham direito à progressão penitenciária [o direito a benefícios, como sair temporariamente da cadeia, após cumprir uma parte da pena]. Essas propostas necessitariam de mudanças na legislação, e os militares não informaram de que forma elas seriam conduzidas.

Nas áreas de infraestrutura e transportes, querem terminar projetos inacabados, como a ferrovia que pretende ligar o país de norte a sul, e identificar gargalos na rede rodoviária --consertando por exemplo rodovias responsáveis por escoar a produção agropecuária das regiões Centro-Oeste e Norte.

Na educação, entendem que o nível básico de educação deve ser melhorado. Na área de pesquisa, querem investir em parcerias com empresas e incentivar o desenvolvimento de tecnologias que tenham aplicação prática, como por exemplo pesquisas da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) para tonar o setor mais eficiente.

Na saúde, o grupo quer reordenar o sistema de dados para identificar desperdícios e desvios na rede pública.

RONALDO SILVA/FUTURA PRESS/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO RONALDO SILVA/FUTURA PRESS/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

General Heleno

Segurança e Defesa

O trabalho de Heleno no grupo técnico não se restringe à segurança. Ele é o encarregado de integrar as estratégias relacionadas às diversas áreas. Também é responsável por repensar procedimentos e sistemas administrativos que possam facilitar, no âmbito da administração pública, a investigação de casos de corrupção.

Mesmo na reserva, o general quatro estrelas é considerado uma das principais lideranças informais da instituição. Em 2004, assumiu o comando da missão de paz da ONU no Haiti, um dos esforços de política externa do governo Lula. Naquele posto, Heleno implementou estratégia que desmobilizou gangues e rebeldes. Em ações em favelas conflagradas, comandou a tropa na linha de frente ao invés de na retaguarda.

De volta ao Brasil, Heleno se envolveu em polêmicas. Divergiu publicamente do então presidente Lula sobre demarcação de terras indígenas. Terminou a carreira no Departamento de Ciência e Tecnologia, área estratégica para o Exército, mas bem diferente de seu perfil de comandante de tropas em terreno.

No dia em que foi para a reserva, em 2011, se envolveu em nova polêmica ao defender o golpe militar de 1964. Na ocasião, disse que o golpe que levou ao regime militar foi necessário para evitar uma ditadura comunista no Brasil. A fala foi interpretada como apologia à ditadura.

Neste ano, defendeu que as Forças Armadas em missão de Garantia da Lei e da Ordem no Rio deveriam ter autorização para atirar em criminosos à distância, caso fossem vistos portando armas. A sugestão, considerada abusiva, foi comparada a execuções extrajudiciais por organizações não governamentais de direitos humanos.

Heleno foi cotado em julho para ser o vice de Bolsonaro, mas o PRP, seu partido à época, foi contrário e o plano não vingou. O general da reserva continuou então atuando no núcleo técnico da campanha.

O general diz que quer usar sua experiência como comandante da força de paz no Haiti para elaborar estratégias de combate a facções criminosas. Também quer se valer de experiência como comandante militar da Amazônia para traçar planos de proteção das fronteiras.

Especialistas em segurança já defenderam que a formação militar é inadequada ao trabalho de segurança pública, pois daria ênfase a uma política de confrontos entre forças policiais e criminosos. Por outro lado, apoiadores dizem que sua formação acadêmica e experiência prática o tornam apto para planejar estratégias onde é preciso integrar as polícias, Forças Armadas e as diversas agências do governo para combater facções em cenários urbanos complexos.

General Ferreira

Transportes e Infraestrutura

Oswaldo Ferreira foi convidado por Bolsonaro para elaborar planos nas áreas de transporte, infraestrutura e mineração. 

General de quatro estrelas na reserva desde 2017, Ferreira fez carreira militar na área de engenharia do Exército, setor que constrói estradas, pontes, fortificações e outras obras. Ele foi o chefe do Departamento de Engenharia e Construção, órgão responsável pela gestão de obras e ações de meio ambiente do Exército.

Esse setor assume obras federais de infraestrutura, como por exemplo a construção de trechos de rodovias federais pelos quais empresas não se interessam em licitações. Também atua em projetos de engenharia de grandes proporções, como a construção de ferrovias, aeroportos e a transposição do rio São Francisco.

"Na área de infraestrutura, a prioridade de um [eventual] governo Bolsonaro será terminar as obras que já foram começadas", disse Ferreira. Ele citou como exemplo a ferrovia Norte-Sul, projetada para ser o principal eixo ferroviário do país, mas que teve apenas parte das obras concluídas.

Outras propostas, segundo Ferreira, seriam investir na construção de mais ferrovias e resolver "gargalos" da malha rodoviária.

Seu braço direito para infraestrutura é o professor de economia da UNB (Universidade de Brasília) Paulo Coutinho.

General Ribeiro Souto

Educação e Ciência

O general da reserva Aléssio Ribeiro Souto é o coordenador no grupo técnico de Bolsonaro das áreas de ciência, tecnologia e educação.

Ele foi escolhido para assumir essas áreas porque chefiou o CTEx (Centro Tecnológico do Exército) entre 2006 e 2009, segundo justificaram outros coordenadores do grupo técnico ouvidos pelo UOL.

O órgão se dedica a pesquisas científicas aplicadas na defesa do país. Entre os projetos do CTEx, estão o desenvolvimento de armas (foguetes, mísseis, morteiros, entre outros), radares e veículos. Segundo seus colegas, uma das prioridades seria fomentar pesquisas científicas em áreas estratégicas, como a agrícola, e incentivar parcerias do poder público com empresas privadas.

A reportagem não conseguiu localizar Ribeiro Souto para falar sobre as propostas. O militar chegou ao posto de general de divisão (três estrelas), o segundo maior nível hierárquico do Exército.

No programa de governo do candidato do PSL consta: "Teremos em dois anos um colégio militar em todas as capitais de estado". O UOL Confere checou a viabilidade e avaliou o impacto da proposta na educação do país.

Flávio Testa

Política

No grupo técnico, o cientista político Antônio Flávio Testa, que se apresenta como pesquisador da UNB (Universidade de Brasília) --a instituição nega ter atualmente vínculos com o acadêmico-- presta “apoio geral em todas as áreas”, segundo outros coordenadores.

Testa já atuou na Funai (Fundação Nacional do Índio) e no Serpro, serviço de tecnologia da informação vinculado ao governo federal, além de exercer funções técnicas por cerca de 30 anos no Senado.

Professor de caratê, Testa coordena técnicos que definem políticas para esportes e questões indígenas. Ele também ajuda o grupo a pensar em como deve ser a relação do Executivo com o Congresso, para facilitar a relação entre os poderes e tentar fazer com que projetos sejam aprovados.

A reportagem procurou Testa, mas não conseguiu entrevistá-lo.

Os militares do núcleo político

O núcleo político de Bolsonaro é centrado em seus filhos, no advogado Gustavo Bebianno, presidente em exercício do PSL e principal articulador político da campanha, e no candidato a vice, general Hamilton Mourão.

Chamado pelo presidenciável de 02, Flávio é deputado estadual no Rio e candidato ao Senado pelo PSL. Carlos, o 03, é vereador no Rio e responsável pela campanha do pai nas mídias sociais. O 04 é Eduardo, deputado federal (PSL-SP) e candidato à reeleição. 

Em torno desse "núcleo duro" orbitam uma série de aliados, a maioria deles civil e vinculados ao PSL, que promovem o candidato, articulam sua campanha e/ou trabalham em suas próprias candidaturas nos estados. Entre eles, estão o deputado federal Major Olímpio Gomes (PSL-SP), o presidente da União Democrática Ruralista, Luiz Antônio Nabhan Garcia e o vice nacional do PSL, Julian Lemos.

Ao redor do núcleo familiar, também estão cinco generais da reserva. Parte deles se envolveu em polêmicas como a defesa do golpe de 1964 e divergências políticas com o PT. Quatro são candidatos a deputado federal e um deles concorre ao governo do DF (todos pelo PSL). Eles promovem suas próprias candidaturas e a de Bolsonaro usando prioritariamente as redes sociais.

Além deles, há militares simpatizantes (da reserva e da ativa) que não integram a campanha, mas já declararam apoio ao presidenciável.

Conheça os principais deles:

  • General Peternelli

    O general da reserva Sebastião Roberto Peternelli é um dos principais incentivadores das candidaturas militares. Ele elaborou uma lista identificando 148 candidaturas miliares, incluindo a dele (deputado federal por São Paulo). Em 2016, foi indicado à presidência da Funai (Fundação Nacional do Índio) pelo PSC. Criticado por ter publicado na internet mensagem apoiando o golpe de 64, o militar veio a público para declarar que não apoiaria um novo golpe. Após a repercussão negativa, o governo Temer desistiu de sua indicação para o cargo. General de divisão, Peternelli foi piloto de helicóptero na Amazônia e chefiou o Comando de Aviação do Exército, no interior de São Paulo. Ele também comandou tropas na missão de paz da ONU no Haiti.

  • General Paulo Chagas

    O general Paulo Chagas é candidato ao governo do Distrito Federal pelo PRP. Desde que deixou o serviço ativo no Exército, começou a atrair atenção por publicações em blogs e nas redes sociais. Ele classificou de "caluniosos" resultados da Comissão Nacional da Verdade, que investigou crimes durante a ditadura. Uma de suas publicações que mais repercutiram foi uma resposta a um tuíte do comandante do Exército, em abril. Villas Boas publicou no Twitter mensagem na véspera do julgamento pelo STF (Supremo Tribunal Federal) de recurso de Lula contra condenação no caso do triplex. Villas Boas disse, na ocasião, "repudiar a impunidade". Diversos generais da ativa e da reserva declararam apoio a Villas Boas. "Tenho a espada ao lado, a sela equipada, o cavalo trabalhado e aguardo suas ordens", escreveu Chagas. "Eu falei como cidadão. Para votar, você tem que ter opinião. Durante o julgamento, acalmei os ânimos de manifestantes que queriam invadir o plenário do STF", justificou ele à reportagem. Em 17 de setembro, ele tinha 5% das intenções de voto no DF, segundo o Ibope. Chagas comandou o regimento Dragões da Independência, responsável pela guarda das instalações da Presidência.

  • General Girão Monteiro

    O general da reserva Elieser Girão Monteiro é candidato a deputado federal pelo PSL no Rio Grande do Norte. Ele pediu para ir para a reserva após se desentender com o governo do PT sobre a demarcação de terras indígenas na fronteira de Roraima, onde era comandante de uma brigada do Exército. Girão Monteiro e o general Heleno eram contrários à demarcação da reserva Raposa Serra do Sol de forma contínua e à retirada de não indígenas da região. Afirmaram à época que a criação da reserva nos moldes em que era proposta poderia deixar a fronteira vulnerável. Girão Monteiro deixou o Exército e trabalhou em governos civis. No Rio Grande do Norte, passou a fazer parte de um grupo político inicialmente apartidário que depois aderiu ao PSL para apoiar a candidatura de Bolsonaro fazendo parte do que chama de "Exército Bolsonariano".

  • General Araújo

    O general da reserva Mário Araújo comandou unidades militares em Minas Gerais, São Paulo e Pará. Também participou de missão de paz da ONU para verificar o cumprimento do acordo de paz em Angola e foi adido militar no Uruguai. O militar coordenou em 2009 a logística de uma das fases de busca por ossadas de guerrilheiros na região do Araguaia (TO). As Forças Armadas reprimiram guerrilheiros na região entre 1972 e 1975. Para Mário Araújo, Bolsonaro sempre falou publicamente o que militares pensavam, mas não podiam dizer. Ao UOL, o general, que é candidato a deputado federal pelo PSL em Minas Gerais, afirmou que "o único caminho para salvar o Brasil é a via política".

  • General Marco Felício

    Superior de Bolsonaro no Exército, o general da reserva Marco Felício diz que decidiu apoiar o antigo subordinado se candidatando a deputado federal pelo PSL em Minas Gerais. Já na reserva, ele reagiu publicamente a pedido do Ministério da Defesa de retirada do site do Clube Militar de artigos criticando a então presidente Dilma Rousseff (PT) em 2012. O general também fez críticas à Comissão Nacional da Verdade. Ele criticou o fato de apenas crimes cometidos por representantes do estado terem sido investigados. Integrantes da comissão dizem que crimes cometidos por ativistas civis já teriam sido investigados por autoridades competentes.

  • General Santos Cruz

    Sob a bandeira da ONU, o general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz chefiou a primeira unidade de caráter ofensivo das Nações Unidas, na República Democrática do Congo, e venceu batalhas que levaram à derrota do M23, o Exército Revolucionário do Congo, em 2013. Ele foi um dos generais responsáveis pela pacificação do Haiti, consultor da ONU e secretário nacional de Segurança Pública no governo Temer. A biografia fez dele um dos generais mais populares nas Forças Armadas. Sem vínculo com partidos políticos ou participação em campanhas, Santos Cruz declarou apoio como "simpatizante" à candidatura Bolsonaro.

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Como Bolsonaro criou sua rede de apoio

Os aliados militares de Bolsonaro foram arregimentados aos poucos. Alguns tiveram contato direto com Bolsonaro durante a carreira militar. Outros foram procurados pelo político e seus aliados ao irem para a reserva.

Bolsonaro e Heleno se conhecem do convívio nos departamentos de esporte militar. Desde que foi para a reserva, o general passou a ser cortejado pelo deputado que, em diversas ocasiões, o convidou para almoçar em sua casa na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro.

Heleno acabou convencido por Bolsonaro e sua adesão à campanha levou outros militares a dar seu apoio.

Mourão, Peternelli e Araújo conviveram com Bolsonaro nos ambientes das escolas militares ou na Brigada Paraquedista, unidade de elite do Exército no Rio.

Peternelli se juntou ao PSC, antigo partido de Bolsonaro, ao entrar para a reserva. Passou então a arregimentar mais colegas, como o general Paulo Chagas.

O general Ferreira, do núcleo técnico, nunca teve contato com Bolsonaro, mas ao passar para a reserva foi procurado por ele. “Ele veio ao meu apartamento dizendo que queria um oficial general para trabalhar com ele em um plano, na parte de transportes”, relembra o militar.

Geraldo Bubniak / AGB / Agência O Globo

Mourão: 'Campanha tende a descambar para lado pessoal'

O nome do general Mourão se tornou conhecido do público entre 2015 e 2017 quando, ainda no serviço e integrando o Alto Comando do Exército, fez declarações criticando a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e sugerindo uma intervenção militar em caso de caos na sociedade.

Após o ataque a Bolsonaro, intensificou as agendas, e declarações suas em palestras voltadas a empresários geraram polêmica.

Em um dos casos mais recentes, Mourão disse que famílias pobres "sem pai e avô, mas com mãe e avó" são "fábricas de desajustados" para o tráfico de drogas. Aliados de Mourão disseram que ele teria sido mal interpretado. Mourão também usou a expressão "mulambada" para se referir a países emergentes que foram aliados do Brasil durante governos anteriores.

No dia seguinte, Mourão negou ter feito uma crítica às mulheres. "Estou fazendo uma constatação de algo que ocorre notadamente nas nossas comunidades carentes. Porque essas mães e avós saem para trabalhar [...] e não têm com quem deixar os seus filhos, porque o estado não está presente para dar uma creche, uma escola de tempo integral onde essa criança possa permanecer. E essa criança vira presa fácil do narcotráfico. Essa é a visão", justificou o candidato a vice.

Declarações desse tipo também fizeram o general se tornar alvo de ataques de outros candidatos. Ele foi chamado por Ciro Gomes de “jumento de carga”, quando o candidato do PDT disse ao jornal "O Globo" que, em um eventual governo seu, militares não poderão falar de política.

Marina Silva (Rede) afirmou que proposta apresentada por Mourão em uma palestra poderia ser classificada como “uma forma de golpe”. Ela se referia ao fato de Mourão ter defendido a elaboração de uma Constituição mais enxuta, sem participação obrigatória de constituintes eleitos. O texto seria então submetido a aprovação popular por meio de um plebiscito, segundo a proposta do militar.

Mourão diz acreditar que muitos dos temas que estão na Constituição de 1988 devam ser tratados em leis ordinárias, para evitar que diversas discussões jurídicas sobrecarreguem o STF, instância da Justiça responsável por decidir sobre questões constitucionais. 

“No caso do Ciro era de tão baixo nível que não era o caso de responder. Quanto à Marina, eu externo a minha opinião e vem logo aquela coisa: ‘Ah, é antidemocrático. Ora, nada mais democrático do que submeter ao povo a nova Constituição. Aí ele [povo] vai dizer: 'eu quero ou não quero'. Até porque o presidente não tem poder para fazer isso”, disse Mourão ao UOL.

“A campanha eleitoral tende a descambar para um lado muito pessoal, como foi o caso do Ciro”, disse.

Após as polêmicas, Bolsonaro pediu que Mourão e Paulo Guedes reduzissem suas agendas públicas e não falassem sobre temas de governo que ainda não estão totalmente definidos. Guedes cancelou compromissos e Mourão moderou o discurso.

A carreira militar e a relação de Bolsonaro com o Exército

Bolsonaro não é unanimidade no Exército

A presença de oficiais generais da reserva nas campanhas preocupa o comando do Exército, pois o desempenho deles pode afetar, seja positiva ou negativamente, a imagem da instituição, segundo afirmou ao UOL uma fonte ligada ao Alto Comando.

O comandante do Exército, Eduardo Villas Boas, determinou à sua equipe a elaboração de uma campanha de mídia voltada ao público interno do Exército, baseada em vídeos em mídias sociais. Ela reforça a ideia de que nenhum candidato fala em nome do Exército e que a instituição tem sua agenda própria, que inclui questões ligadas ao financiamento da força, projetos estratégicos de defesa e pagamentos de salários e aposentadorias.

Villas Boas declarou ao jornal "O Estado de S.Paulo", logo após o ataque a Bolsonaro, que o crime confirma o acirramento das divergências no Brasil. Na opinião dele, esse processo pode fazer com que a legitimidade do futuro governo seja questionada, seja qual for o vencedor da eleição.

Nos bastidores, aliados do comandante defendem que ele assuma cada vez mais uma posição política em relação assuntos de estado ou que afetem as Forças Armadas, mas dizem que deve haver um cuidado para que declarações não sejam interpretadas como preferência politico partidária.

Eles também dizem que entre militares do serviço ativo e da reserva do Exército “há muitos apoiando Bolsonaro, mas ele não é unanimidade”. Seus apoiadores aplaudem especialmente o fato de Bolsonaro não estar envolvido em escândalos de corrupção. 

O UOL apurou que membros da alta cúpula do Exército se comunicavam com Bolsonaro com certa frequência antes do ataque. Mas o contato era de caráter individual, por serem simpatizantes do deputado, e não institucional.

Por outro lado, Bolsonaro também enfrenta críticas entre os militares. Parte deles acha algumas de suas propostas exageradas e potencialmente perigosas, como por exemplo armar fazendeiros para que se defendam de invasores de terras.

Outra preocupação não diz respeito a Bolsonaro em específico, mas à eleição de um candidato identificado com a direita ou a esquerda em um ambiente de alta polarização no país.

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