Como aqui a morte é tanta,/ só é possível trabalhar/ nessas profissões que fazem/ da morte ofício ou bazar./ Imagine que outra gente/ de profissão similar,/ farmacêuticos, coveiros,/ doutor de anel no anular,/ remando contra a corrente/ da gente que baixa ao mar,/ retirantes às avessas,/ sobem do mar para cá/ Só os roçados da morte/ compensam aqui cultivar,/ e cultivá-los é fácil:/ simples questão de plantar;/ não se precisa de limpa,/ de adubar nem de regar;/ as estiagens e as pragas/ fazem-nos mais prosperar;/ e dão lucro imediato;/ nem é preciso esperar/ pela colheita: recebe-se/ na hora mesma de semear
João Cabral de Melo Neto, em "Morte e Vida Severina"