
Em maio de 2017, Emmanuel Macron era a cara da “mudança agora”, da “França que ousa”, da França que avançava, segundo as capas dos jornais locais no dia seguinte da esmagadora vitória nas urnas com 66% dos votos.
Hoje, um ano e meio depois, o cenário é outro: 66% dos franceses não acham Macron um bom presidente, segundo pesquisa Odoxa. O que aconteceu?
Eleito aos 39 anos (o mais jovem presidente da democracia francesa) em maio de 2017, Emmanuel Macron era visto como prodígio dentro e fora do país e ganhou capas de jornais de todo o mundo. Na revista norte-americana Time Magazine, foi chamado de “próximo líder da Europa”.
Um dia depois de ser empossado, foi recebido pela principal líder da União Europeia, a chanceler alemã Angela Merkel, em Berlim. Alguns dias depois, encontrou-se com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Mas passados pouco mais de um quarto do mandato -- que, na França, dura cinco anos --, Macron enfrenta um turbilhão político após o pedido de demissão de duas figuras do alto escalão. Para tentar apaziguar os ares, o chefe do Palácio do Eliseu anunciou uma reforma na equipe, com novos nomes para o ministério do Interior, da Agricultura, da Cultura e dos Territórios.
Alguns fatores explicam essa impopularidade: reformas políticas que beneficiam os mais ricos, estilo autoritário e falta de transparência no escândalo Benalla –um ex-segurança presidencial flagrado indevidamente com roupa de policial agredindo manifestantes--, analisa Martial Foucault, professor de ciência política da Sciences Po Paris.
Após uma campanha em que surgiu como novidade e conquistou 24% dos votos no primeiro turno, seu movimento En Marche conseguiu a unidade do país ao reunir votos da esquerda e da direita em contraposição à candidata da extrema-direita Marine Le Pen.
Com maioria absoluta na Assembleia Nacional, o governo Macron aproveitou a popularidade e a base para iniciar grandes mudanças. Logo no início do mandato, aprovou a reforma fiscal.
“As primeiras leis votadas tiveram destaque por uma característica particular: eram medidas que favoreciam as classes privilegiadas. Isso levou a oposição a chamar Emmanuel Macron de ‘presidente dos ricos’”, explica Foucault.
Entre as polêmicas, a troca do Imposto Solidário sobre a Fortuna por um imposto apenas sobre os imóveis –o que significa cerca de 3 bilhões de euros (cerca R$ 14 bi) a menos pagos pelos mais ricos--, e um imposto sobre os investimentos que não é progressivo.
Apesar de protestos que pararam a França, uma reforma trabalhista vista como melhor para os patrões do que para os funcionários foi aprovada ainda em setembro do ano passado.
Meses mais tarde, as propostas de reforma previdenciária e de reforma no ensino superior levaram centenas de milhares de trabalhadores e estudantes às ruas em protestos por todo o país. As universidades foram ocupadas, os ferroviários fizeram uma greve intermitente de abril a junho, e os trens paralisaram o país.
No primeiro de maio, a tradicional manifestação de sindicatos virou cenário de violência: confronto entre polícia e manifestantes, bombas de gás lacrimogêneo, carros queimados. Os confrontos desse dia tornaram-se ainda mais relevantes quando o jornal Le Monde divulgou que um homem do grupo de segurança do presidente, Alexandre Benalla, se passou por policial, usando braçadeira e capacetes oficiais, e agrediu manifestantes.
A falta de transparência sobre o caso levou a popularidade do presidente a uma queda vertiginosa.
Mesmo com as férias de verão, a situação não melhorou. No final de setembro, o famoso ativista ambiental Nicolas Hulot deixou o ministério da Ecologia, do Desenvolvimento Sustentável e da Energia -- uma cena que deixava clara a crise dentro do governo. O anúncio de demissão foi feito em entrevista de rádio, antes de falar com o presidente. “Não posso mais mentir para mim mesmo”, disse Hulot na ocasião.
Na sequência, o ministro do Interior, Gérard Collomb (socialista), deixou sua vaga no governo Macron, dizendo querer voltar a Lyon e concorrer às eleições municipais que ocorrem em 2020.
Diante da crise interna, o presidente francês se vê em um braço de ferro com o primeiro-ministro, responsável pela articulação do governo, o republicano Édouard Philippe (de direita). Philippe é visto pela população como mais próximo do povo, mais competente e mais confiável que Macron.
“O risco real para o governo é que seja contestado pela sua maioria parlamentar, insatisfeita com o que os ministros têm feito”, analisa o cientista político. Perder a maioria na Assembleia Nacional acabaria de vez com os planos reformistas de Macron.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística (Insee), o desemprego atinge 9,1% da população - e a meta do governo é baixar o índice para 7% até 2022. Além disso, 14,2% dos franceses vivem com menos de 1.015 euros (R$ 4.300) por mês - o salário mínimo no país é de 1.498 euros.
Empresa diz que energias renováveis não foram causa de apagão na Espanha
Ucrânia propõe ajuda a países com apagão: 'Experiência após ataques russos'
Suspeito de assassinato em mesquita que filmou vítima agonizando é preso
Estudante morta na França recebeu 57 facadas de colega