O primeiro fenômeno

Belfort não se contenta com pioneirismo e completa 20 anos lutando em alto nível

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De fenômeno a dinossauro

Quando venceu suas quatro primeiras lutas em menos de 3 minutos, somadas, entre 18 e 19 anos, Vitor Belfort ganhou um apelido com a mesma velocidade de seus socos: fenômeno. Pupilo do lendário Carlson Gracie, rapidamente conquistou espaço de destaque no esporte que ainda era chamado de vale-tudo.

Ele chega a 20 anos de carreira tendo ajudado a moldar o esporte que hoje é conhecido como MMA. O aniversário exato de sua vitória em 4 segundos sobre Jon Hess em 1996 é coincidentemente três dias depois de sua luta contra Gegard Mousasi, no UFC 204, em Manchester, que acontece neste sábado.

Com uma longevidade rara para um esporte que maltrata tanto os corpos de seus praticantes, Belfort conseguiu sobreviver aos altos e baixos de uma carreira que refletiu os altos e baixos de sua vida pessoal. De filho adotivo de Carlson, passando por um reality show, desaparecimento de sua irmã, polêmica com doping e depois com tratamento de reposição de testosterona. Do outro lado, manteve-se como um dos principais nomes do esporte, com dois cinturões em duas categorias diferentes do UFC, além de outras quatro disputas de título.

Vitor prefere não usar a palavra aposentadoria neste momento, mas sabe que já não consegue mais repetir as grandes atuações do passado. Até por isso, assumiu mais do que nunca outro lado que o deixou famoso nos últimos anos. Ele agora se define como empreendedor que também luta – sempre levando para o lado do orador motivacional.

Belfort deixou de ser fenômeno, se tornou um leão (como o próprio se definiu) e agora é um dinossauro (como ele também se chama). E deve ser esse o rumo dos próximos anos de sua carreira.

As maiores lutas da carreira

  • UFC 12 - Vitor Belfort vs. Scott Ferrozzo

    07.02.1997 - Ganhou o torneio dos pesos-pesados, em Dothan (EUA). Com apenas 19 anos, Vitor Belfort se consagrava como o mais jovem campeão da história do UFC. Mas não foi tão fácil assim. Em 1997, os eventos da organização ainda funcionavam como torneios, ou seja, o lutador precisava fazer mais de uma luta por noite para ficar com o título. Belfort, que lutava nos pesos-pesados, venceu Tra Telligman por nocaute técnico com pouco mais de um minuto na preliminar. Então, na "final", precisou de precisou de apenas 43 segundos nocautear Scott Ferrozzo e chocar o mundo com o que seria o primeiro de muitos espetáculos dentro do octógono.

    Imagem: Divulgação
  • UFC Brasil - Vitor Belfort vs. Wanderlei Silva

    16.10.1998 - Estreia de Belfort no peso-meio-pesado, em São Paulo (BRA). Além de ser a primeira vez do UFC no Brasil, o combate é uma das lutas mais marcantes da carreira de Vitor. Depois de desistir dos pesos-pesados, Belfort desceu aos meio-pesados e, logo de cara, pegou Wanderlei Silva, que fazia sua estreia na organização. Vitor, que já havia sido campeão do Ultimate, não tomou conhecimento do compatriota: desferiu uma sequência absurda de socos e, com apenas 44 segundos do primeiro round, venceu por nocaute, comprovando o apelido de ?Fenômeno?.

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  • UFC 46 - Randy Couture vs. Vitor Belfort

    31.01.2004 - Válido pelo cinturão dos meio-pesados, em Las Vegas (EUA). A edição 46 do UFC foi a primeira oportunidade de Vitor Belfort ser campeão após sua passagem pelo Pride. E ele não decepcionou. Em uma revanche com a lenda Randy Couture, o brasileiro precisou de apenas 49 segundos do primeiro round para vencer o norte-americano por intervenção médica. Em um dos golpes, Belfort feriu o olho do rival com um soco. Os médicos entraram em ação e alegaram que Couture não tinha condições de continuar no combate. Foi o segundo título do Fenômeno no UFC.

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  • UFC 126 - Anderson Silva vs. Vitor Belfort

    05.02.2011 - Válida pelo cinturão dos pesos-médios, em Las Vegas (EUA). O combate com Anderson Silva era considerado a luta do século e foi responsável por fazer o MMA explodir no Brasil. Além de colocar frente a frente dois dos maiores lutadores de todos os tempos, o duelo ainda possuía uma carga a mais de rivalidade, já que ambos treinavam na mesma equipe, e Spider não viu com bons olhos a notícia de que Vitor gostaria de tomar seu cinturão. O final todos lembram: com pouco mais de três minutos do primeiro round, Belfort recebeu um chute frontal no queixo aplicado pelo compatriota e desabou no octógono.

    Imagem: AP/Julie Jacobson
  • UFC 152 - Jon Jones vs. Vitor Belfort

    22.09.2012 - Válida pelo cinturão dos meio-pesados, em Toronto (CAN). O UFC 152 aconteceu depois de muitas reviravoltas. A princípio, Jon Jones defenderia o cinturão dos meio-pesados contra Dan Henderson no 151. Hendo, porém, se machucou. Dana White então sugeriu Chael Sonnen, que foi recusado pelo campeão e o evento acabou cancelado. Então, o card foi todo transferido para a edição seguinte, em Toronto (CAN), e Vitor Belfort foi convocado para subir de categoria para tentar mais um título na organização. Desafio aceito. Em mais uma luta por cinturão em sua carreira, Vitor deu trabalho ao campeão e ficou próximo de conquistar o título. Ainda no primeiro round, Belfort conseguiu encaixar uma chave de braço em Jones, que até assumiu ter ficado perto de uma derrota. No entanto, o norte-americano aguentou a pressão e esperou o brasileiro desistir da posição. Então, no quarto round, conseguiu vencer com uma finalização e manter seu título.

    Imagem: UFC/Divulgação

Entrevista: "Mostrei que lutador tem de ter voz"

Como é para você fazer uma luta tão próxima do aniversário de 20 anos de sua primeira luta profissional? Sério que é agora? Não sabia. Vai ficar melhor ainda então.

E como é para você estar aqui há tanto tempo no esporte e com um espaço de destaque? Mostra aminha relevância, meu valor. Compraram o UFC agora por US$ 4 bilhões, vão ter de aumentar meu cachê (risos)

Qual é o principal legado que você deixa para o esporte? Mostrei que lutador tem de ter voz ativa, tem que pensar que vida dele não se resume só lutar. Hoje eu vejo os lutadores tendo voz ativa, como José Aldo. Respeito muito isso. Isso traz uma satisfação grande, foi uma crítica importante a dele. Hoje acho que as pessoas estão podendo ver que isso é importante.

O próprio Aldo já falou que você deveria liderar uma organização, uma união dos lutadores... Uma pessoa não pode se autodeterminar líder. Mas é preciso, sim, ter uma organização para os lutadores. Eu penso sempre na saúde, penso depois do fim da carreira, na família, na condição física, como fazer com a carreira dele. Acho que os atletas de tem de saber como não serem roubados pela equipe ou colegas, tem de poder ajudar as pessoas. Eles precisam conhecer o mundo dos negócios, como se comportar, ver que isso não é apenas um esporte. Estamos caminhando nesse sentido.

E você esperava estar há tanto tempo nesse esporte? Nunca esperei. Hoje posso dizer que sou um empreendedor que amo lutar, mas amo o mundo dos negócios. Estou criando várias coisas. Quero que minha próxima criação seja uma liga de lendas do MMA. Já pensou ver lutadores das antigas de volta? Ver caras como Chuck Liddell ou Randy Couture de novo. Claro que com regras diferentes, mas queria um torneio de másteres, assim como já tem no jiu-jítsu, por exemplo.

Quais foram os melhores e os piores momentos de sua carreira? Melhor momento são as vitórias, minha primeira vitória, as inúmeras vitórias que conquistei. Ruins foram os momento de tive de lidar com as lesões, dificuldades. Além das derrotas, claro.

Como você definiria seu primeiro mestre Carlson Gracie nesses 20 anos de carreira? Carlson teve muita importância, não só para mim, como eu para ele, fizemos história na vidade  um e do outro. O que ele me prometeu ele cumpriu. O que eu prometi, cumpri. Relacionamento é bom quando vem dos dois lados.

O que você acha que ele te falaria nesse momento? (risos) Bora campeão, vamos que dá para ficar um pouco mais, mais uns dez anos (risos)

E você vai ficar mais dez anos? Pagando bem, que mal tem? (risos)

Você ficou muito chateado com seu desempenho na última luta, quando perdeu para o Jacaré. Disse que perdeu sua principal característica, que é o ataque. O que podemos esperar contra o Mousasi? Vocês vão ver um Vitor indo para frente. Sempre disse que meu ataque é minha melhor defesa. Ele é um lutador duro, completo. É uma luta muito interessante, vim esperando um bom combate. Da última vez eu não lutei, dessa vez eu vou lutar.

Belfort fora do octógono

  • Futebol

    Antes de ser lutador, Vitor foi jogador de futebol. O ex-campeão dos pesados e meio-pesados fez dupla com o zagueiro Juan, ex-Inter, Flamengo e seleção brasileira, no antigo CFZ, clube de Zico. Nas palavras do defensor, Belfort o complementava bem e era o cara durão da zaga, que ?batia um pouco? nos atacantes rivais. O próprio lutador admite que o esporte não era muito sua praia, pois não tinha habilidade.

  • Casa dos Artistas e Feiticeira

    Conhecido como o grande lutador brasileiro da época no UFC, Belfort foi convidado e participou da segunda edição do reality show Casa dos Artistas, exibido no SBT em 2002. Durante o programa, ele conheceu a então Feiticeira, Joana Prado, e iniciou um namoro em rede nacional. No entanto, o relacionamento não foi para frente na época e o casal se separou. No ano seguinte, a dupla se encontrou em Los Angeles e reatou o caso, que evoluiu até o casamento em 2003. Juntos desde então, Vitor e Joana tiveram três filhos: Davi, Victoria e Kyara, a mais nova, nascida em 2009.

  • Irmã desaparecida

    Em janeiro de 2004, a família Belfort sofreu um crime que não teve resposta até hoje. A irmã de Vitor, Priscila, desapareceu naquele mês e não foi encontrada em um caso ainda não concluído pela polícia do Rio de Janeiro. Ela teria sido sequestrada por uma dívida de R$ 9 mil com traficantes do Morro da Mangueira e, posteriormente, morta. As suposições partiram de uma denúncia em 2007 feita por Elaine Paiva, mulher que dizia fazer parte da quadrilha que executou o crime. Segundo ela, as ordens partiram do presídio de Bangu 1, mas as informações passadas por Elaine não levaram a polícia a nenhuma conclusão ? o sítio onde os restos mortais de Priscila teriam sido levados não trouxe as respostas esperadas.

  • religião e empreendedorismo

    Evangélico convertido, Belfort é desenvolto com as palavras e costuma falar de religião em entrevistas, nas quais ele está habituado a dar discursos sobre outros assuntos diversos. O lutador aproveitou o destaque dentro do octógono para construir uma marca pessoal baseada em questões motivacionais. Em seu próprio site o atleta reserva um espaço para destacar os serviços de coaching e palestras, ambos com ênfase no estímulo da autoconfiança. Entretanto, não é só com as palavras que ele faz sucesso como empresário. Belfort é dono da academia FORTfit, localizada no Rio de Janeiro, embaixador da empresa OTB Fight, que visa fomentar o crescimento do MMA e tem sedes em São Paulo e Miami, e também investe em outras companhias e atletas, como Cesar Mutante.

As polêmicas

TUF/Divulgação TUF/Divulgação

Discussões com Wanderlei

A primeira edição do TUF Brasil colocou Vitor Belfort e Wanderlei Silva como treinadores. E a relação dos dois foi piorando com o decorrer do programa. Quando Belfort optou por casar a luta entre os amigos Rony Jason e Anistávio Medeiros, a inimizade atingiu o ápice: Wanderlei tirou satisfações pelo fato de o carioca ter escolhido amigos para duelarem e os dois chegaram a discutir. Belfort e Wanderlei estavam marcados para se enfrentar na final do programa, na revanche do combate realizado em 1997, quando o ?Fenômeno? venceu por nocaute em 44 segundos. A luta, no entanto, não aconteceu, pois Belfort quebrou a mão, algo que irritou Wanderlei, que o acusou de ?fugir? do combate.

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Doping e TRT

O primeiro caso de doping de Belfort aconteceu em 2006. Depois de perder para Dan Henderson no Pride, o brasileiro caiu no antidoping por uso da substância 4-hidroxitestosterona, um esteroide anabolizante. Em sua defesa, Belfort afirmou que havia usado um suplemento vitamínico que continha o composto e que a substância também poderia involuntariamente usada em injeções no período em que precisou de recuperar de um rompimento no menisco do joelho. Ele acabou suspenso por nove meses e precisou pagar uma multa de US$ 10 mil. Mas uma das maiores polêmicas da carreira de Belfort envolveu o Tratamento de Reposição de Testosterona (TRT). O lutador passou a fazer uso dele após a derrota para Anderson Silva. A partir daí, engatou uma sequência de cinco vitórias em seis lutas, perdendo apenas para Jon Jones. O tratamento, no entanto, foi proibido pela Comissão Atlética de Nevada em 2014. O banimento culminou na saída de Belfort do card em que enfrentaria Chris Weidman pelo cinturão dos médios ? ele foi flagrado no início daquele ano com níveis de testosterona acima do permitido. Ele não foi punido por estar fora do período de lutas. Mais tarde, foi revelado de maneira acidental pelo UFC que Belfort havia enfrentado Jon Jones, em 2012, mesmo tendo sido flagrado em um exame antidoping três semanadas antes do combate. Na ocasião, o lutador apresentou níveis de testosterona duas vezes e meia maior do que o normal para sua idade.

As frases do Pastor

Eu costumo dizer que, se eu honro Deus e honro a minha família, também vou sempre honrar meu 'boss', que é meu chefe

sobre aceitar enfrentar Anthony Johnson, mesmo o adversário não tendo batido o peso da categoria

A sabedoria de um ser humano não está no quanto tem consciência de que sabe, mas no quanto tem consciência de que não sabe

Filosofando

Não deixe seu passado ditar o seu futuro, mas faça seu futuro ditar o seu presente

Sobre os planos de vida

Eu sou como a água. A água se adapta em várias formas e é dessa maneira que a gente tem que ser. Deixou um buraquinho ela entra, botou no fogo ela vira vapor, depois vira gelo. Eu acho que é dessa maneira que a gente tem que viver. Assim se vive com mais alegria

sobre subir de peso para enfrentar para enfrentar Jon Jones

O passado é um cheque cancelado, já aconteceu, não muda. O futuro vai acontecer, é um cheque pré-datado, mas o hoje é o dinheiro que eu tenho. O melhor da minha vida está acontecendo hoje, no pessoal e no profissional

sobre viver o melhor momento de sua vida

Não tenho medo de chorar, de reconhecer um erro. Sou um leão no octógono e um cordeiro fora. Sou sensível

Um leão!

Susumo Nagao/PVT Susumo Nagao/PVT

Os bastidores da estreia de Belfort

Do Portal do Vale-Tudo:

Em sua estreia Belfort enfrentaria um gigante de 2 metros e 134 kg, que antes da luta, tentaria abalar o psicológico do garoto. “Estava no vestiário quando chegou o árbitro e disse que o gigante só ia lutar se valesse tudo. Soco no saco, dedo no olho. Eu lembro que coloquei a mão no saco e falei: “Carlson, eu quero ter filho!”. Mas a experiência de Carlson Gracie acabaria revertendo a tentativa do americano. “O Carlson me mandou calar a boca e disse para o árbitro para avisar a ele para entrar de faca, armado no ringue”, conta Belfort.

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