Quando o futebol é terapêutico
Erick fala como um boleiro, mas ele não tem só jeitão de jogador. O cara mete um gol atrás do outro nos treinos do Meninos Bons de Bola. A entrega ao futebol existe porque o esporte ajudou a superar uma tragédia pessoal. Aconteceu na infância.
Ele morava em Campinas e vendia balas no centro com a bisavó. Um dia, insistiu em ficar e garantiu que sabia voltar sozinho. Não era verdade.
“Minha vontade era terminar (as balas) e ir para casa. Umas 7 horas da noite, eu procurando onde era o 554. Eu não achei e veio um fulano e falou 'pega aquele ônibus que chega mais rápido. Quer que te leve?' Eu inocente fui. E caminha, caminha, caminha e nada. Daqui a pouco levou eu pro mato, fez tirar toda roupa.”
Erick aproveitou um vacilo do homem para escapar. Mas a devastação emocional estava concretizada.
“Fiquei todo machucado. Quem me barrou no meio da rua, que era de terra, foi um caminhão de lixeiro. Pedia 'socorro, socorro, socorro’. Chovendo, o cara desceu do caminhão, arrancou aquela capa amarela e jogou em cima de mim."
"Fiquei com vergonha de passar por uma situação daquela e olhar para família. Eu não queria olhar na cara da minha bisavó quando ela foi no hospital. Minha bisavó não era igual minha mãe”
Erick estava com a bisavó como alternativa da Justiça para não morar num abrigo. A mãe usava crack e o obrigava a bater de porta em porta pedindo dinheiro que era convertido em drogas. Com a bisavó, era diferente.
“Ela pegava o dinheiro das balas e me dava. 'Compra o que você quiser'. No hospital eu dizia 'tenho nojo de mim mesmo'. Não devia existir isso.”
Mas Erick diz onde encontrou a redenção: “Foi aí que passei a morar no abrigo e passei a conhecer o futebol. Foi minha terapia, quando voltei a ser feliz.”