Onde os Fracos Não Têm Vez

Para Real Madrid não há espaço para fraquezas. Nem para piedade

Guilherme Zocchio Colaboração para o UOL
Kai Pfaffenbach/Reuters

Sempre nos ringues

Absoluto. Não importa quem vai cruzar o caminho do Real Madrid, o resultado é o mesmo. Um adversário caído. Foi essa a história das últimas três temporadas da Liga dos Campeões da Uefa. Juventus, PSG, Bayern de Munique, Manchester City, Atlético de Madri. O número de rivais que ficaram pelo caminho do maior campeão europeu é vasto.

Assim, o time chegou a uma marca que ninguém conseguia há 42 anos, três títulos consecutivos da Liga dos Campeões. O feito veio após a vitória por 3 a 1 contra o Liverpol, no Estádio Olímpico de Kiev. Já são 13 taças na história, seis troféus a mais do que o Milan e oito mais do que o clube inglês, o Bayern de Munique e o arquirrival Barcelona.

O confronto teve teor dramático, despertando lágrimas durante o jogo e depois do apito final. O egípcio Mohamed Salah foi o primeiro a se entregar ao choro — machucado, teve que ser substituído. Foi acompanhado pelo lateral espanhol Daniel Carvajal, que viveu tragédia semelhante. Com falhas em dois gols do Real, o arqueiro Loris  Karius pediu de olhos marejados desculpas aos torcedores. Terminada a partida, atletas das duas equipes se emocionaram, de um lado, pela vitória e, de outro, pela derrota.

Até a conquista, o time merengue seguiu uma trajetória de trancos e barrancos. Classificou-se em segundo na fase de grupos, derrotado pelo Tottenham por 3 a 1, em Londres. Nas oitavas, teve certa facilidade com um 5 a 2 no placar agregado contra o PSG.

Mas passou pelas quartas, contra a Juventus, em duelo de resolução controversa: depois de vencer por 3 a 0 na Itália, contou com um pênalti contestado para marcar na derrota por 3 a 1 no Santiago Bernabéu e avançar de fase. Nas semifinais, não jogou bem contra o Bayern e precisou da sorte, em falhas improváveis da equipe alemã, para chegar à final.

Michael Reagan/Getty Images Michael Reagan/Getty Images

O Homem que Copiava

Ele entrou do banco de reservas para roubar a cena e brilhar como um grande astro do cinema. Pouco após substituir Isco, que vinha bem na partida, o galês Gareth Bale se deslocou à grande área para completar um cruzamento de Marcelo e mudar totalmente o destino da partida.

De bicicleta, o ponta-direita executou o movimento com precisão, fazendo um golaço, uma verdadeira pintura. Marcou o segundo do Real Madrid, colocando o time à frente no placar.

A jogada assemelhou-se com o gol de Cristiano Ronaldo contra a Juventus, nas quartas de final. Quase uma cópia. Os lances foram tão parecidos que a reação do técnico Zinedine Zidane também foi semelhante. Nas duas ocasiões, o treinador bradou e pulou, gesticulando com os braços para comemorar.

Eleito o melhor em campo, Bale ainda fez o terceiro da equipe, contando com uma falha de Loris Karius. O goleiro deixou a bola passar entre as mãos, após um chute forte do galês.

O Real Madrid conseguiu um feito histórico sem ser o melhor time de futebol dos últimos 40 anos. O Barcelona de Guardiola e o Milan do final da década de 1980 parecem ter sido melhores mesmo sem terem ganho tanto quanto o Real. Então por que a "era Zidane" está na história? Porque ela levou a eficiência à infinita potência

Rafael Reis

Rafael Reis

SERGEI SUPINSKY/AFP SERGEI SUPINSKY/AFP

Entrando numa Fria Maior Ainda

Pífia, patética, desprezível... Sobram adjetivos na web para definir a atuação do goleiro alemão Loris  Karius, que falhou feio em dois dos três gols do Real Madrid. Quando o placar ainda marcava 0 a 0 no início da etapa complementar, e o Liverpool ganhava volume de jogo, o arqueiro tentou fazer uma reposição e mandou a bola direto nos pés de Karim  Bezema, que desviou para o gol.

Se a falha não fosse suficiente, ele deixou a equipe numa fria em uma segunda ocasião. Após um chute forte de Bale de fora da área, Karius não teve firmeza para segurar a bola e a deixou passar por entre seus dedos. Agiu como um famigerado "mãos de alface". O Liverpool perdia por 2 a 1 e buscava o empate. O Real marcou o terceiro e, depois, só teve que administrar o resultado.

O goleiro, no entanto, reconheceu que comprometeu sua equipe. Após o apito final, ele, chorando, seguiu em direção à torcida do Liverpool para pedir desculpas. Errou, mas se arrependeu.

Uma decisão de um torneio tão importante quanto a Champions não merece uma atuação como a do goleiro alemão. Manchou a final.

Rafael Reis

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AFP PHOTO / GENYA SAVILOV AFP PHOTO / GENYA SAVILOV

Karatê Kid

O zagueiro Sergio Ramos, do Real Madrid, enlaçou-se no braço de Mohamed Salah, do Liverpool, e aplicou um verdadeiro golpe de arte marcial, levando o adversário em cheio ao chão, ainda na metade do primeiro tempo. O lance lembrou a execução de um ippon, que é considerado um movimento feito com perfeição no judô.

Após a jogada, o atacante egípcio levou a mão ao ombro, sentindo dores. Ele tentou continuar na partida, mas não conseguiu e teve que ser substituído. Saiu de campo chorando pelo nocaute.

Ramos não levou um cartão amarelo pelo lance digno de Daniel San. Aliás, o juiz sequer deu falta na jogada. O golpe, porém, não foi perdoado pela torcida do Liverpool, maioria no Estádio Olímpico de Kiev. Os ingleses vaiaram o espanhol toda vez que ele pegou na bola até o juiz realizar o apito final.

A falta de Sergio Ramos é uma falta de jogo. Ele não é bonzinho, joga duro, mas não creio que tenha qualquer intenção de lesionar Salah. Intimidar, talvez, mostrar quem manda. Isso é do jogo. Mas não machucar. Foi uma infelicidade.

Júlio Gomes

Júlio Gomes

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Lágrimas do Sol

Principal referência no ataque do Liverpool, e grande responsável pela classificação da equipe à final, o egípcio Mohamed Salah também era o melhor na partida quando foi derrubado por Sergio Ramos.

Após cair, Salah levou a mão ao ombro direito, com dores. Ele recebeu atendimento médico em campo, saiu para mais cuidados e tentou retornar para o confronto. Entretanto, quatro minutos depois da queda, voltou a sentir que o membro estava lesionado. Então, caiu, dessa vez, em lágrimas.

Sem poder continuar no duelo, o atacante, que é considerado nos gramados como o príncipe do Egito, o filho do Sol, pediu, aos prantos, para ser substituído. A contusão dele comprometeu o desempenho do Liverpool, que caiu muito de rendimento. Além disso, Salah poderá, devido à lesão, desfalcar seu país na Copa do Mundo da Rússia.

O dia mais importante de sua carreira terminou da pior maneira possível. Até os torcedores do Real se comoveram com seu choro. Tomara que consiga disputar a Copa.

Rafael Reis

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PAUL ELLIS/AFP PAUL ELLIS/AFP

Bravura Indômita

Após Salah sair contundido, Sadio Mané chamou para si a responsabilidade de comandar o ataque do Liverpool. Como o Rooster Cogburn, de John Wayne (na versão original) ou o de Jeff Bridges (na refilmagem dos irmãos Cohen), o atacante assumiu a missão, contando com seu talento, por mais difícil que esta parecesse.

O senegalês obteve algum sucesso. Minutos depois de o time inglês sofrer o primeiro gol, ele empatou a partida, fazendo 1 a 1. Também mandou uma bola na trave e conseguiu, ainda, um gosto de vingança ao derrubar no fim do jogo Sergio Ramos, que machucou Salah e o tirou de campo.

Apesar dos esforços heroicos, o desfecho para Mané na partida não foi exatamente feliz, assim como foi para Cogburn no cinema. O Liverpool não conseguiu reverter o placar e ainda sofreu o terceiro gol, amargando a derrota.

O melhor do Liverpool. Supriu parte da ausência de Salah e da pouca participação de Firmino. Se não fosse Karius, poderia ter levado os Reds para a prorrogação

Rafael Reis

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Justiça Vermelha

Os deuses do futebol não deixaram a contusão de Salah passar em branco e fizeram uma intervenção nos rumos da partida no Estádio Olímpico de Kiev. Pouco tempo após o egípcio sair chorando machucado, foi a vez do lateral espanhol Daniel Carvajal. Ele tropeçou e caiu sozinho gramado, sentindo dores no tornozelo esquerdo.

Ele também teve que ser substituído. Deu lugar para Nacho. A contusão pode fazer o jogador do Real Madrid desfalcar a seleção espanhola para a Copa do Mundo.

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Sangue de Heróis

Com o título obtido neste sábado (26), Zinedine Zidane se tornou uma figura tão importante para o futebol quanto são os personagens de John Ford para os filmes do gênero western. O francês de origem argelina é o primeiro treinador a vencer três edições seguidas da Liga dos Campeões da Europa.

Em número de títulos do torneio como técnico, ele se igualou a Bob Paisley e a Carlo Ancelotti. Some-se ainda a vitória como jogador, também pelo Real Madrid, na temporada 2001-2002.

Zidane, cada vez mais, imprime sua marca na história do esporte não só como um dos melhores atletas de todos os tempos, mas como um treinador jovem que já tem muitos feitos dos quais se orgulhar.

Muitos foram rápidos ao decretar o Barcelona como melhor time da história após o título de 2011. Onde colocar este Real Madrid na história? Por resultados, no topo. Acima de qualquer outro

Júlio Gomes

Júlio Gomes

AP Photo/Pavel Golovkin AP Photo/Pavel Golovkin

À Procura da Felicidade

Se Zidane se consagrou na final em Kiev como um dos técnicos mais vencedores, Jürgen Klopp garantiu o posto de um dos principais vice-campeões. Pela terceira vez, em três tentativas, o comandante do Liverpool terminou como segundo colocado de uma competição interclubes do Velho Continente.

Na temporada 2015-2016, perdeu a final da Liga Europa da UEFA para o Sevilla. E, enquanto estava à frente do Borussia Dortmund foi derrotado na final, na edição 2012-2013 da Liga dos Campeões, pelo Bayern de Munique.

Entre uma competição e outra, Klopp prossegue como Chris Gardner, interpretado por Will Smith em “À Procura da Felicidade”. Enfrenta as dificuldades que o futebol lhe impõe, buscando, apesar dos insucessos, o seu lugar ao sol. O esforço, apesar de tudo, merece ser reconhecido.

Bateu na trave pela segunda vez, novamente com um time bem inferior ao adversário. Tem tudo para ganhar a Champions quando tiver um elenco condizente com sua capacidade

Júlio Gomes

Júlio Gomes

REUTERS/Hannah McKay REUTERS/Hannah McKay

Ghost: Do Outro Lado da Vida

Tal qual nas partidas das semifinais contra o Bayern de Munique, Cristiano Ronaldo entrou, mas pareceu não estar em campo na final de sábado (26) contra o Liverpool. O jogador não foi decisivo, como se espera do vencedor da última edição da Bola de Ouro.

Numa das poucas chances que teve, estava livre na área do Liverpool e, quando foi chutar, o árbitro interrompeu o lance porque um torcedor invadiu o gramado.
De toda forma, como Sam Wheat, em “Ghost”, sua presença (ou ausência, a depender da perspectiva) foi importante para a conquista da Liga dos Campeões.

Como o protagonista do filme, o português ainda roubou a cena, no final do jogo, insinuando que o confronto poderia ter sido uma despedida dele da equipe espanhola. “Foi muito bonito jogar no Real Madrid”, disse.

Cristiano Ronaldo foi monstruoso na campanha do Real Madrid, mas deu uma desaparecida nas partidas contra Juventus (volta), Bayern e Liverpool. De qualquer forma, o título lhe deixa mais perto da Bola de Ouro. E, ao que parece, mudar de ares

Júlio Gomes

Júlio Gomes

Com orquestra ao vivo, público acompanha final da Liga dos Campeões em SP

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