Dor em silêncio
Essa conversa foi às 19h. Às 4h25, aconteceu. Eu lembro da sequência de eventos com detalhes. Primeiro entrou o infectologista. Feliz, falou com o Sócrates sobre o Corinthians, que seriam campeão naquele fim de semana. Chutaram o resultado. O médico disse que tinham identificado a bactéria e que o antibiótico que tinham ministrado três dias antes era o certo. “Fica tranquila que em sete dias ele vai para casa”.
Três horas depois, começou o terror. Uma pneumologista de plantão deu uma medicação e ele entrou em coma induzido. Teve sangramento nasal e foi feita a cauterização na madrugada. Eu acompanhei. Depois disso, ele não voltou.
A partir das 2h, a pressão já era de 3 por 2. O coração estava a 30 batimentos por minuto e, de repente, disparava para 200. O cardiologista se aproximou e falou: “Kátia, ele está só esperando você se despedir”.
Como é que eu ia me despedir se ele saiu tantas vezes de situações assim? Eu acreditava que ele ia conseguir. Só que o quadro era outro e eu não saquei. Eu estava muito angustiada, não pensava e não me despedia. Às 4h25, o médico insistiu: “Kátia, faz isso por ele. Porque ele não vai embora enquanto você não se despedir”.
Sócrates estava com a mão grudada na minha. O médico tirou. A única coisa que eu consegui foi dizer: “Descansa amor, descansa”. Quando terminei, parecia filme. O monitor zerou e surgiu um silêncio que nunca existiu na UTI. Acredito e sempre acreditei no "RESSURGIR DO FEMININO" em nossa sociedade e com urgência, ambiente onde homens e mulheres são complementares e não rivais, competitivos. Sócrates e eu vivemos tudo o que tínhamos para viver. Acabou... e quanto ao legado, depende de todos e cada um de nós. Ele foi um homem do povo, assim sempre será.