'Star Wars', 40 anos

Há muito tempo, em uma galáxia nem tão distante, um visionário criou a maior mitologia do cinema moderno

É tempo de celebração na galáxia. Quatro décadas atrás, um grupo de mentes inovadoras imaginou uma ópera espacial, uma fantasia nostálgica e atemporal que se transformou no maior fenômeno pop da história. Foi a construção de um universo sem paralelo, com planetas, raças, línguas, artefatos, criaturas, perigos, heróis e vilões emoldurando a jornada de um herói na eterna luta do bem contra o mal. Cá estamos, 40 anos depois, contando essa história. A história de "Guerra nas Estrelas" 

"É um espetáculo que está a anos-luz de seu tempo"

O ano é 1976. Steve Jobs e Steve Wozniack criam a Apple Computers. A IBM lança a primeira impressora a laser. O mundo está mergulhado na Guerra Fria, com conflitos no Oriente Médio, Ásia, África e nas Américas. E nos cinemas o trailer de "Guerra nas Estrelas" especulava: "Em algum lugar no espaço, isso pode estar acontecendo agora mesmo..."

A gênese do Império

Por Roberto Sadovski

"A aventura em produção há 1 bilhão de anos." O trailer original de "Star Wars" - ou "Guerra nas Estrelas", como ficou conhecido no Brasil - não poupava exageros para a criação de George Lucas, que estreou nos cinemas dos Estados Unidos em 25 de maio de 1977. Os superlativos eram uma necessidade: até ali, ninguém fazia ideia de como a história do diretor de "THX-1138" e "Loucuras de Verão" seria recebida pelas massas. "Star Wars" era uma incógnita, um projeto complexo que passeava pela mente de Lucas desde o começo da década.

Ao compor uma saga espacial do bem contra o mal, o jovem cineasta bolou nomes e lugares, conceitos e situações. As influências iam de "A Fortaleza Escondida", que Akira Kurosawa dirigiu em 1958, a seriados americanos que faziam a alegria da petizada nos anos 30 e 40 e uma dose cavalar de literatura de fantasia e ficção científica, de "John Carter" a "Valerian & Laureline", de "Flash Gordon" a Irmãos Grimm.

Com sua aventura empolgante e otimista, Lucas usou a boa bilheteria de "Loucuras de Verão", lançado em 1973, como barganha para um orçamento de US$ 11 milhões na Fox e garantia para que mantivesse o direito para continuações e o lucro advindo de merchandising.

Colocar no papel era uma coisa, executar as ideias como filme era mais complicado. Como a equipe de efeitos especiais da Fox havia sido desmantelada na época, Lucas começou sua própria empresa, a Industrial Light & Magic, num galpão no subúrbio de Los Angeles. Douglas Trumbull, que fez os efeitos de "2001" para Stanley Kubrick, recusou o convite do diretor (ele já estava atrelado a "Contatos Imediatos do Terceiro Grau", de Steven Spielberg) e sugeriu seu assistente, John Dykstra. O time trazia artistas, estudantes universitários e engenheiros, todos abraçando os conceitos além de seu tempo de "Star Wars" e inventando novas formas para materializá-los.

A pós-produção complicadíssima adiou o lançamento de "Star Wars" de dezembro de 1976 para maio do ano seguinte, em cerca de 32 cinemas – uma piada comparado aos lançamentos globais com milhares de salas hoje em dia. (No Brasil, o longa só chegaria em 30/1/1978).

O estúdio bancou o marketing padrão, com pôsteres e camisetas, mas a própria equipe de Lucas expandiu os horizontes, amarrando contratos com a Marvel para uma adaptação em quadrinhos, com a editora Del Rey para a novelização, e promoções em eventos de fãs de cinema, quadrinhos e cultura pop, como uma San Diego Comic-Con ainda engatinhando.
 

Arte/UOL

O sucesso pegou todos de surpresa. "Star Wars" começou a bater recordes de bilheteria, deixando o próprio Lucas estupefato – e muito, muito rico. Enquanto o fenômeno crescia, e novos cinemas eram construídos pelos Estados Unidos para atender a demanda, a equipe, na frente e atrás das câmeras, via sua popularidade disparar. "Star Wars" dera um salto nas possibilidades narrativas do cinema moderno e o mundo aos poucos entendia e assimilava suas contribuições – técnicas, mercadológicas, inovadoras.

Quando "Star Wars" completou um ano, cerca de 60 cinemas nos Estados Unidos ainda o exibiam para salas lotadas. O filme de George Lucas foi relançado em 1978, 1979, 1981 (então rebatizado para "Episódio IV: Uma Nova Esperança"), 1982 e 1997, quando completou 20 anos, incorporando efeitos digitais no material de 1977 e completando o que Lucas disse ser sua visão original.

Nessa altura, "Guerra nas Estrelas" já havia aberto caminho para a um império pop que abraça todos os veículos e todas as mídias, um colosso que já faturou mais de US$ 42 bilhões e não para de crescer - "Star Wars: Episódio VIII - Os Últimos Jedi", estreia em dezembro deste ano diante da expectativa de quebra de novos recordes.

O verdadeiro visionário, porém, foi Steven Spielberg, amigo de longa data de Lucas. Quando "Star Wars" teve seu primeiro corte exibido para executivos da Fox, com efeitos incompletos e muitas lacunas no filme, a reação dos amigos do cineasta, incluindo Brian De Palma e John Milius, deixou Lucas inseguro. O sentimento aumentou quando ele visitou o set de "Contatos Imediatos", sendo rodado por Spielberg, e teve certeza que seu filme ia comer poeira. Spielberg não só discordou, como apostou que "Star Wars" seria o maior sucesso do ano. Ele ganhou a aposta e, até hoje, recebe 2,5% cento dos lucros de "Guerra nas Estrelas".

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O impacto que "Guerra nas Estrelas" exerceu sobre o imaginário mundial a partir dos anos 70 ainda está para ser medido. Da popularização da ficção científica à redução da faixa etária do público que vai ao cinema, a saga criada por George Lucas transformou a cultura das últimas quatro décadas. Um dos mais importantes efeitos talvez tenha sido a criação de uma mitologia que mexeu tanto com a criatividade de seus fãs, que se tornaram verdadeiros coautores da saga

Antes da web, os fãs de "Star Wars" se encontravam em fóruns e painéis de discussão e foi ali que começaram as primeiras obras não-oficiais sobre a família Skywalker e a tal galáxia muito distante. Mas, ao contrário da maioria dos produtores de entretenimento que se viam nesta situação, a empresa de George Lucas não ameaçava os fãs que se aventuravam pelo universo temático dos três primeiros filmes. Pelo contrário, fazia uma clara vista grossa jurídica pois sabia que aquelas obras não apenas poderiam revelar novos talentos a partir de personagens conhecidos, como funcionavam como propaganda gratuita para a marca.

Com o barateamento das tecnologias digitais durante os anos 90, tarefas caras e complexas como edição e efeitos especiais poderiam ser resolvidas com um único computador. É justamente a época em que o público que era criança na época da primeira trilogia chegava à fase adulta, com dinheiro e disposição para criar obras novíssimas e distribuí-las on-line.

É quando surgem curtas que redefiniram até mesmo o conceito de produções feitas pelos fãs, como o reality show "Chad Vader" (em que Darth Vader aparece como um gerente de supermercado), o hilário "Troops" (em que Stormtroopers são acompanhados como policiais nestes programas matinais de TV) e o excelente "George Lucas in Love" (que parodia o filme "Shakespeare Apaixonado" trocando o bardo inglês pelo criador dos Skywalkers quando ele ainda rascunhava sua saga). 

Este período também coincide com o lançamento da segunda trilogia na virada do século 20 para o 21. A Lucasfilm responde positivamente à novidade criando inclusive um concurso oficial para estimular os fãs a criar seus próprios filmes. 

Com o passar dos anos, a seriedade e o profissionalismo das produções cresceu. Filmes como "Darth Maul: Apprentice, The Unconscious Sith" e "A Smuggler's Tale" poderiam tranquilamente fazer parte do universo criado por Lucas. A nova trilogia, iniciada em 2015, reforçou estes novos produtores com ainda mais outras opções de personagens, cenários e possibilidades. Hoje a safra de filmes como "TK-436", "Hoshino", "Jakku: First Wave", "Exile" e "Rebel Scum" mostra que o universo dos Jedi pode se expandir cada vez mais.

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O primeiro esboço de roteiro do que viria a se tornar "Guerra nas Estrelas", rabiscado em 1974 por George Lucas, trazia uma história tematicamente semelhante, mas radicalmente diferente do começo da saga que agora completa quatro décadas. No texto original, Luke é um Jedi mais velho e o protagonista é Annikin Starkiller, filho de um antigo cavaleiro da mesma ordem. 

A trama teria ficado só no folclore, mas terminou adaptada em 2013. Não para o cinema, mas em uma história em quadrinhos.

"The Star Wars" foi uma minissérie de oito partes que expandia e estruturava a trama original de Lucas. A HQ traz mais semelhanças em tom e escopo com as aventuras de Flash Gordon, que Lucas devorava em tiras de quadrinhos e no seriado dos anos 30, do que com o filme de 1977.

"Foi um barato traduzir os protótipos das ideias de Lucas em forma de arte sequencial", disse à época o roteirista de "The Star Wars", J.W. Rinzler. "Dar vida ao General Luke Skywalker, às tropas imperiais em pássanos nas dunas, à primeiríssima princesa Leia do planeta Aquilae... foi o trabalho dos sonhos." A arte, espetacular, é cortesia de Mike Mayhew.

Publicado no Brasil em duas edições pela Panini, "The Star Wars" impressiona com o volume de nomes e citações que Lucas já havia desenvolvido na gênese de "Guerra nas Estrelas", ideias que, muitas vezes, ele colocou na gaveta e reaproveitou de outras formas em outros filmes, principalmente pela Nova Trilogia lançada entre 1999 e 2005.

Aqui, a ordem dos Jedi-Bendu já protege um imperador benevolente por centenas de milhares de anos. O surgimento dos Cavaleios de Sith força Skywalker e seu aprendiz, Annikin, a voarem até o mundo de Leia para protegê-la. Han Solo é de uma raça de répteis humanóides, Valorum é um Sith, Darth Vader (sem máscara e menos aterrorizante) passa a maior parte do tempo fora da ação e a trama tem uma influência ainda mais explícita do clássico japonês "A Fortaleza Escondida".

"The Star Wars" é curioso não só por mostrar a história que poderia ter sido como também alimenta a especulação sobre os elementos que, alterados por Lucas, deram mais dinamismo à "Guerra nas Estrelas" e ajudaram na criação do fenômeno. "George hesitou antes de deixar a gente adaptar essa versão ainda crua de sua história", lembra Rinzler. "Mas depois que lhe mostramos algumas páginas já finalizadas, ele deu seu OK."

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