Alguns chamam de protesto, outros de antipolítica. Há quem diga que é um recado e quem avalie como desilusão. Para cientistas políticos e pesquisadores do tema, o eleitor que não vota está inserido numa categoria que vem crescendo e não apenas no Brasil: a da alienação eleitoral. Em 2014, 37,2 milhões brasileiros votaram nulo, em branco ou não votaram. Ou seja, 33% dos votos apurados no segundo turno da última eleição presidencial foram de eleitores que escolheram… não escolher.
Pesquisadora dos elevados números de votos brancos e nulos nas eleições brasileiras, a cientista política Márcia Dias, da Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro), diz que o aumento da alienação eleitoral acaba fragilizando as instituições democráticas. "Se as eleições legitimam a ação governamental, a redução da participação eleitoral faz com que os eleitores deem um recado para a classe política. Se eles dizem que esses candidatos não os representam, isso tem um significado muito importante", afirma.
A discussão sobre o significado e a relevância dos eleitores que optam por não votar é antiga: desde o Código Eleitoral de 1932, que introduziu o sistema proporcional no Brasil, votos brancos alimentam o debate jurídico sobre como deve ser tratado o brasileiro que vai à urna e escolhe votar em branco. Para cidadãos leigos no direito eleitoral, é uma questão mais simples: se um terço dos votos apurados não são válidos, o resultado das urnas não se torna menos válido?
"Ao mesmo tempo em que o eleitor se abstém, anula o voto ou vota em branco --e isso legitima o próprio sistema que ele não está aceitando--, isso cria uma dificuldade muito grande de tornar o sistema mais eficaz", alerta Silvana Krause, doutora em ciência política pela Katholische Universität Eichstätt, na Alemanha.
No Brasil, os votos nulos, brancos e abstenções são descartados para fins de definição dos eleitos. Mas uma cartilha distribuída pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em 2014 reconhece que um número maior de votos nulos e brancos reduz a quantidade de votos válidos necessários para que um candidato se eleja. E alerta: ao anular seu voto, o eleitor pode possibilitar a vitória de um candidato que não venceria com os votos válidos que recebeu.
Para o pesquisador Julian Borba, pós-doutor em ciências sociais pela Universidade de Lisboa, seria de esperar que quanto menores os índices de brancos, nulos e abstenções, mais legítimo o processo eleitoral --mesmo que o ponto de vista da legalidade não esteja sendo afetado porque esses votos são considerados inválidos. Mas isso não é uma exclusividade da democracia brasileira, observa. "Votos inválidos existem em qualquer regime democrático, fazem parte das regras do jogo. Em países de voto não obrigatório, em torno de 60%, 65% do eleitorado comparece às urnas. Nós [brasileiros] temos experimentado em torno de 80%, 85% de comparecimento", afirma.
Essa taxa de comparecimento do eleitorado às urnas não deve mudar em 2018, avalia a pesquisadora Cíntia Ribeiro de Souza, pós-doutora em sociologia política pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). "Deve se manter a tendência dos últimos 20 anos, que gira em torno de 80%, porque já tivemos escândalos antes e isso não mudou muito. A dúvida maior está nos votos brancos e nulos", avisa.
Três pesquisas Datafolha divulgadas entre 22 de agosto e 2 de outubro mostraram que o percentual de eleitores que declararam voto em branco, nulo ou nenhum já foi de 22% e vem caindo, chegando a 8% na consulta mais recente.
Ainda assim, o cientista político Homero Costa, da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), vê os índices de brancos e nulos com preocupação. "São muitas pessoas. Elas não estão nem indecisas. Elas estão decididas a votar nulo ou branco", observa.
A reportagem procurou eleitores deste perfil para saber o que os levou a tomar tal decisão. Veja a seguir os depoimentos.