Bolinhas de gude amontoadas se dividem em três triângulos, desenhados em um campo de terra. O jogo, que parece ser organizado por faixa etária, é a principal diversão das crianças e adolescentes da comunidade Olaria, na região do Campo Limpo, na zona sul de São Paulo. Às vezes, uma das bolinhas acaba caindo dentro do córrego Pirajussara, que atravessa toda a extensão do terreno, o que gera correria para que ela não seja perdida.
O "campinho", como é chamado o lugar da brincadeira, é o maior espaço aberto da comunidade e é, atualmente, o único disponível para o lazer. Mas nem todos os pais defendem a opção. "Eu não deixo meu filho brincar com isso. Dá muita briga e, sempre que as bolas caem no rio, eles pulam para pegar. É o tempo de pegar uma doença", diz a dona de casa Luciene Aparecida Rosa.
Alguns metros para cima, em meio às casas de madeira, uma construção mais propícia para brincadeiras permanece vazia e acumula poças de água. É uma pequena quadra, feita de concreto, com duas traves e sem grades de segurança.
"A quadra foi construída depois de um incêndio, em 2011. A prefeitura quis ocupar aquela parte para ninguém construir outras casas, porque está perto da rede elétrica. Mas acabou cercada de barracos e nunca teve manutenção", diz Regina Ribeiro, líder comunitária em Olaria.
Cansados de esperar por melhorias, os moradores decidiram reformar a quadra, com o apoio de uma ONG. Para arrecadar os R$ 8.000, definidos como valor necessário, eles se dividiram em atividades como bazar, venda de cachorro-quente e outras mercadorias arrecadadas por meio de doações.
O filho de Luciene, Lucas, 7, é um dos mais animados com a reforma da quadra. Frequentador assíduo de ações sociais de ONGs que atendem a comunidade, ele se diz orgulhoso de fazer parte da organização do projeto. "Se você quiser ajudar, eu sei o que cada um está vendendo e que dia você pode comprar."
Rodeada por condomínios luxuosos, a própria comunidade tem características de desigualdade. Parte do terreno, ocupada há mais tempo, tem casas de alvenaria com ligações de eletricidade regular, enquanto o outro lado, constituído em sua maioria por casas de madeira, não tem ligações autorizadas de água ou luz.
A comunidade Olaria iniciou com uma ocupação no começo da década de 1980. O terreno é particular e pertence a uma companhia de energia elétrica, que já entrou com o processo de reintegração. A prefeitura estima que 264 famílias ocupem a área, considerada de alto risco. As moradias foram construídas embaixo de linhas de alta tensão da AES Eletropaulo e acima de dutos de óleo da Petrobras.
Informados sobre a impossibilidade de continuar no terreno, os moradores aguardam por um projeto de moradia popular, relacionado ao plano de urbanização de favelas Programa Renova SP. A favela faz parte das intervenções do Perímetro de Ação Integrada Pirajussara 7, que envolvem comunidades no entorno do córrego.
"Nós estamos aguardando que a prefeitura construa moradias populares para que todos possam se mudar. Mas o projeto está atrasado porque o terreno que eles tinham está contaminado e eles ainda não têm nenhum outro em vista para isso", diz Regina Ribeiro.