PT x PSDB: o fim de uma era?

Como terminou uma polarização na disputa presidencial que se estende há mais de 20 anos

Leandro Prazeres Do UOL, em São Paulo
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Desde 1994, PT e PSDB protagonizaram todas as eleições presidenciais no país. Neste ano, porém, os tucanos estão fora do segundo turno e terão de se contentar com seu papel de coadjuvantes na principal disputa pela primeira vez em 24 anos.

Mas o que fez com que o partido que quase venceu as eleições há quatro anos ficasse tão distante do segundo turno agora? E o PT? Como o partido mais atingido pela Operação Lava Jato conseguiu superar essa questão e chegar à nova fase do pleito? A reportagem do UOL conversou com cientistas políticos para apontar os principais pontos dessa longa rivalidade e entender o que fez com que ela fosse interrompida.

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Histórico do PT

Fundado em 1980, o Partido dos Trabalhadores foi formado a partir da união de três grandes grupos políticos: o movimento sindical (representado pelo então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Luiz Inácio Lula da Silva), as comunidades eclesiais de base da Igreja Católica, conhecidas pela militância na esquerda e ancoradas na Teologia da Libertação, e antigos membros de organizações de esquerda que lutaram, com armas ou não, contra a o regime militar.

Em pouco tempo, o PT se converteu no grande partido da esquerda brasileira, superando, ainda que com certo diálogo, legendas mais à esquerda como o PCdoB.

Além disso, o partido se ramificou e deixou de ser apenas uma agremiação do Sudeste para chegar a lugares como o Acre de Chico Mendes e da então professora Marina Silva, que deixaria o PT anos mais tarde e que disputou, neste ano, sua terceira eleição presidencial, sem nunca ter vencido.

Em 1989, com pouco mais de nove anos de vida, o PT chegou ao segundo turno das eleições presidenciais. Lula era o candidato, mas perdeu para Fernando Collor de Mello, à época no PRN. 

As eleições de 1989 foram marcantes não apenas pela chegada de Lula ao segundo turno, mas por ter sido a única vez desde então que PT e PSDB estiveram do mesmo lado em uma disputa presidencial. O PSDB, com Mário Covas como candidato à Presidência, apoiou o PT no segundo turno.

De 1994 a 2014, os dois partidos duelaram pelo comando do país. Se fosse um placar de futebol, a disputa estaria 4 a 2 para o PT.

O PSDB venceu em 1994 e 1998, ambas no primeiro turno. O PT, por sua vez, venceu em 2002, 2006, 2010 e 2014, todas no segundo turno. Em 2018, o PT ainda pode anotar mais um "ponto" nesse placar, desta vez, contra o PSL de Jair Bolsonaro. 

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Histórico do PSDB

O PSDB foi fundado em 1988 a partir de uma dissidência do PMDB --à época o partido mais poderoso da República. Líderes políticos fortes em São Paulo como José Serra, Mário Covas e Fernando Henrique Cardoso foram alguns dos fundadores da agremiação.

"O PMDB está se transformando num grande partido republicano da República Velha, com uma cara diferente em cada estado, conforme o rosto de seus governadores", disse em discurso o então senador Fernando Henrique Cardoso, ao justificar a criação do novo partido.

Historicamente, o PSDB surgiu com uma proposta próxima à das sociais-democracias europeias, conhecidas pela defesa do chamado "Estado de bem-estar social" em contraposição a governos mais à direita e liberais na economia como o de Margaret Thatcher, no Reino Unido.

Ao longo dos anos, porém, o PSDB acabou ficando conhecido como um partido que defende uma agenda liberal na economia, sobretudo depois de executar um programa de privatizações de estatais no início dos anos 1990.

Tradicionalmente muito forte na região Sudeste e, mais recentemente, também no Centro-Oeste e em alguns estados do Nordeste, o PSDB chegou ao comando do Brasil em 1995. No ano anterior, Fernando Henrique Cardoso venceu as eleições contra o PT de Lula no primeiro turno.

FHC estava impulsionado pelo sucesso do Plano Real, que colocou a inflação sob controle.

A estabilização da economia também foi a bandeira de FHC nas eleições de 1998, quando, no primeiro turno, venceu novamente Lula.

O controle da inflação, porém, não foi suficiente para que ele conseguisse eleger seu sucessor em 2002. À época, a economia patinava. 

Nos anos seguintes, o PSDB consolidou seu poder em estados como São Paulo e Minas Gerais, mas não conseguiu repetir o sucesso de FHC e vencer as eleições presidenciais.

Perdeu em 2002 com José Serra, em 2006 com Geraldo Alckmin, em 2010 com Serra (novamente), em 2014 com Aécio Neves e, neste ano, ficou de fora do segundo turno na segunda tentativa de Alckmin.

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Pontos altos do PT

A chegada do PT ao poder em 2003, com a vitória de Lula sobre José Serra (PSDB), é considerada, até hoje, o ponto alto da história do PT. Ela inaugurou um período de quase 14 anos de hegemonia na chefia do país. Lula foi eleito e reeleito (2002 e 2006), assim como Dilma Rousseff (2010 e 2014). 

Esse comando só acabou em 2016, quando Dilma foi afastada por meio de um processo de impeachment

Durante o governo do PT, o Brasil viu seus índices econômicos oscilarem positivamente, durante a maior parte do tempo, e caírem vertiginosamente a partir da reeleição de Dilma Rousseff.

Crescimento do PIB

Em média, nos 13 anos em que o PT ficou no poder (2016 não entra na conta porque Dilma foi afastada em abril daquele ano), a economia cresceu 2,9% ao ano. A média é superior aos 2,5% por ano durante os oito anos de governo FHC.

Queda do desemprego

Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o bom resultado do PIB (Produto Interno Bruto) se refletiu na taxa de desemprego.

No final do governo FHC, a taxa de desemprego era de 10,5%. Lula entregou o governo a Dilma em 2010 com uma taxa de 5,3%.

O índice se manteve relativamente baixo até a reeleição de Dilma, em 2014, e aí começou a subir. Quando foi afastada, a taxa medida pela Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) Contínua estava em 11,2%.

Queda da pobreza

Outra conquista obtida sob o PT foi a redução da população em estado de pobreza. De acordo com o Banco Mundial, a taxa de pessoas que viviam com menos US$ 1,90 por dia no Brasil caiu de 11,1% em 2003 para 3,4% em 2015.

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Pontos altos do PSDB

A eleição e a reeleição de Fernando Henrique Cardoso como presidente da República marcaram o ápice do poder do PSDB no Brasil.

Ainda que depois disso o partido tenha mantido sua hegemonia no estado de São Paulo e conquistado governos importantes como o de Minas Gerais, os oito anos do governo PSDB foram o período em que as lideranças tucanas, de fato, "deram as cartas" no país

Sob o mando de FHC, o Brasil conseguiu controlar suas taxas de inflação e promoveu um amplo programa de desestatização que, muitos economistas afirmam, foram as bases para o crescimento econômico registrado durante os anos do governo do PT.

Controle da inflação 

Ainda que o Plano Real tenha sido implementado em 1994, durante o governo do presidente Itamar Franco, coube a Fernando Henrique Cardoso, um dos criadores da proposta, manter a nova moeda e a inflação sob controle.

Durante sua gestão, a inflação ficou relativamente controlada, sobretudo considerando o período imediatamente anterior. O ano de 1994, por exemplo, terminou com uma inflação estimada em mais de 2.000%. 

Desde então, a inflação caiu para 22,41% em 1995 e chegou a 1,65% em 1998, ano da reeleição de FHC. A partir de então, a inflação oscilou entre 5,97% em 2000 e 12,53% em 2002, último ano do governo tucano. 

Privatizações

O programa de privatizações de empresas estatais foi iniciado no começo dos anos 1990 com Collor, mas ganhou novo impulso durante os dois governos de FHC.

Entre 1991 e 2002, o governo privatizou mais de cem empresas estatais, reunindo US$ 105 bilhões. Quase 90% disso, US$ 93,4 bilhões, foi arrecadado durante os oito anos do tucano no governo.

Entre os setores mais atingidos pelo programa estavam telecomunicações, elétrico, mineração e financeiro. Os recursos ajudaram a aumentar as reservas internacionais do país, ainda que isso não tenha sido suficiente para acalmar os investidores durante as crises do período.

Programas sociais

No governo do PSDB foram criados alguns dos programas sociais que, anos mais tarde, passaram a fazer parte do que hoje é conhecido como "Bolsa Família".

No final do segundo governo de FHC, foram criados o "Bolsa-Escola" e o "Vale-Gás", programas que pagavam pequenos valores a famílias pobres. 

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Pontos baixos do PT

Entre os pontos negativos dos governos petistas estão, sem dúvida, os dois principais escândalos de corrupção da história recente brasileira: o mensalão e o petrolão

Questão ética: mensalão e petrolão

O mensalão foi revelado em 2005 quando o então deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) contou que havia um esquema de compra de apoio parlamentar por meio de pagamento de propina para que o PT conseguisse aprovar projetos de seu interesse.

O caso levou a um longo processo judicial que terminou na condenação de alguns dos principais líderes do PT, entre eles o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e o ex-presidente do PT José Genoino.

O petrolão, por sua vez, começou a vir à tona em 2014, durante a Operação Lava Jato. Segundo as investigações, empresas pagavam propina a agentes públicos e políticos para conseguir contratos com o governo federal. O escândalo atingiu outros partidos como o PMDB, PP, PR e o arquirrival petista: PSDB.

Para o PT, o impacto do petrolão foi mais forte. Diversos integrantes do partido foram presos e condenados, entre eles, o ex-presidente Lula, que foi preso em abril depois de ter sido condenado em primeira e segunda instâncias por corrupção e lavagem de dinheiro.

Condução da economia

Se durante os primeiros 12 anos da gestão petista, os índices econômicos do país foram positivos, tudo começou a mudar a partir da reeleição de Dilma Rousseff. 

Pressionada por uma economia que dava sinais de desaquecimento, Dilma tentou reverter a tendência de queda da atividade econômica, mas não obteve sucesso. 

Em 2015 e 2016, a economia brasileira registrou recessões expressivas. Em 2015, o PIB teve uma retração de 3,8%. Em 2016, a queda foi de 3,6%.

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Pontos baixos do PSDB

O crescimento econômico não foi vigoroso durante a gestão tucana. De acordo com o IBGE, nos oito anos em que FHC comandou o Brasil, a economia do país cresceu uma média de 2,4% ao ano. A média nos oito anos do governo Lula, por exemplo, foi de 4,08% ao ano.

Desemprego em alta

De acordo com a antiga PME (Pesquisa Mensal de Emprego), feita pelo IBGE, o desemprego se manteve relativamente alto durante a maior parte do governo FHC. Em dezembro de 2002, por exemplo, 10,5% da população estava desempregada.

Vulnerabilidade diante de crises internacionais

Apesar do controle da inflação e de um crescimento lento, mas constante da economia, o Brasil continuou vulnerável às crises internacionais dos anos 1990.

As crises do México, dos mercados asiáticos e da Rússia fizeram com que o Brasil recorresse a empréstimos junto ao FMI (Fundo Monetário Internacional) por três vezes para reforçar as reservas cambiais do país.

Esses empréstimos geraram várias manifestações e, à época, ficou famoso o slogan "Fora, FMI".

Pobreza

Outro dado no qual o PSDB não conseguiu avanços significativos foi com relação à redução da pobreza. Entre 1995 e 2002, o índice de pessoas que viviam com até US$ 1,90 por dia, segundo o Banco Mundial, até caiu, mas se manteve sempre acima dos 10%.

Em 1995, esse índice era de 13%. Subiu para 14,2% no ano seguinte e começou uma trajetória de queda. Em 2002, último ano do governo FHC, 10,2% da população brasileira estava nessa condição. 

Corrupção: embrião do mensalão e Lava Jato

Apesar de ter adotado uma bandeira de combate à corrupção ao longo dos últimos anos, o PSDB também se viu tragado por investigações relacionadas ao tema. 

Os três principais casos de corrupção envolvendo lideranças do PSDB são o mensalão tucano, o cartel do metrô de São Paulo e a Operação Lava Jato

O mensalão tucano foi investigado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) e pelo MPMG (Ministério Público de Minas Gerais). Segundo as investigações, o ex-governador mineiro Eduardo Azeredo (PSDB) liderou um esquema de desvio de recursos públicos para abastecer o caixa dois da sua campanha à reeleição em 1998.

Neste ano, Azeredo foi condenado em segunda instância pela Justiça mineira e foi preso. Ele nega as acusações. O mensalão tucano foi considerado pelos investigadores como o "embrião" do mensalão petista.

O cartel do metrô de São Paulo foi revelado por empresas que mantinham contrato com o governo do estado para a construção e fornecimento de trens. Segundo as investigações, um conjunto de empresas, entre elas a Siemens e Alstom, faziam parte de um cartel para manipular a concorrência para a construção de linhas de metrô em São Paulo e no Distrito Federal. Segundo delações do caso, o cartel teria funcionado durante os governos de Mário Covas e José Serra com o conhecimento e aval deles.

O caso foi alvo de denúncias pelo MPSP (Ministério Público de São Paulo) e ainda tramita na Justiça. 

Lava Jato

A Operação Lava Jato também atingiu o PSDB fortemente. Delações de executivos da Odebrecht implicaram líderes do partido como Aécio Neves, Aloysio Nunes, José Serra e Geraldo Alckmin. Segundo os delatores, a empreiteira pagou propina relacionada a contratos que ela manteve com o governo de São Paulo, entre elas trechos do Rodoanel. Inquéritos foram abertos, alguns já arquivados e, até agora, nenhum deles foi julgado. Alckmin, Serra e Nunes negaram qualquer participação com as irregularidades. 

O líder mais atingido pela Operação Lava Jato, porém, foi o senador Aécio Neves. Ele foi gravado pedindo dinheiro ao empresário Joesley Batista, do grupo J&F. Aécio nega irregularidades na sua relação com Joesley. Em abril deste ano, ele virou réu no STF por corrupção passiva e obstrução de Justiça.

Municípios onde cada partido venceu no primeiro turno

O fim da disputa entre PT e PSDB nas eleições presidenciais percebido neste ano foi resultado de uma somatória de fatores que incluíram acertos do PTerros do PSDB e o surgimento de um elemento relativamente novo na política brasileira: o fenômeno Jair Bolsonaro. Esse resumo foi feito por três cientistas políticos ouvidos pela reportagem do UOL: David Fleischer, da UnB (Universidade de Brasília), Carlos Pereira, da FGV (Fundação Getúlio Vargas), e André Borges, também da UnB.

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Acertos do PT

Os três especialistas ouvidos pelo UOL foram unânimes em afirmar que o PT se manteve competitivo no segundo turno porque conseguiu aproveitar quatro fatores: a rejeição ao governo do presidente Michel Temer (MDB), o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, a prisão do ex-presidente Lula e a insistência na manutenção da candidatura de Lula até o limite do possível. 

"O PT soube se aproveitar da enorme rejeição do governo Temer. A partir do impeachment de Dilma, o PT passou para a oposição e se aproveitou disso para se distanciar da crise econômica que começou no governo dela. Como Temer é um presidente muito rejeitado, o PT se apresenta como uma resposta a esse cenário", disse Carlos Pereira. 

André Borges afirmou que o PT conseguiu reverter a onda negativa gerada pelo afastamento de Dilma a partir da criação de uma narrativa de que o partido vem sendo perseguido. 

"Eu acho, sinceramente, que o impeachment da presidente Dilma foi positivo para o partido. Lideranças do próprio partido também afirmam isso de maneira informal. Isso ajudou a aglutinar parte da militância em torno do discurso de que o PT é alvo de perseguição. Foi um movimento muito bem construído pelo partido e que está dando resultado", afirmou Borges. 

Para David Fleischer, a prisão de Lula contribuiu para a construção da narrativa de perseguição ao PT. "A prisão do Lula vem sendo utilizada como exemplo dessa suposta perseguição de que o PT seria vítima. O Lula, que já era um grande líder político, se transformou em um líder presidiário, mas, ainda assim, um líder. 

André Borges acredita que a insistência do partido em manter Lula como candidato até o último momento também foi acertada. Antes de oficializar Fernando Haddad como candidato do PT, Lula era o "cabeça" de chapa. A troca só foi feita depois que TSE (Tribunal Superior Eleitoral) cassou o registro de candidatura de Lula com base na Lei da Ficha Limpa. 

"Essa insistência deu certo porque mobilizou o eleitorado e hoje a gente percebe que essa estratégia deu certo. A transferência de votos do Lula para o Haddad está acontecendo", explica Borges. 

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Erros do PSDB

A queda do PSDB não se deu apenas pelos méritos dos seus adversários. Os especialistas ouvidos pelo UOL avaliam que os tucanos cometeram diversos erros nos últimos tempos, o que ajudaria a explicar a perda de competitividade nestas eleições. 

Os principais equívocos do partido, na avaliação deles, foram: aliar-se ao governo de Michel Temer, relutar em punir líderes suspeitos de atos de corrupção, optar por um candidato do "establishment" em um momento em que haveria um clamor por um nome tido como "outsider" e não "abraçar" o discurso antipetista com o mesmo vigor que outros partidos.

Para André Borges, essa trajetória errada começa na escolha de Alckmin para candidato à Presidência. "Se o PSDB tivesse apresentado um candidato com um perfil mais outsider, que pudesse, de certa forma, atender a um desejo do eleitorado por caras novas na política, talvez o desempenho do partido fosse melhor", afirmou.

Borges não o menciona diretamente, mas o nome dentro do partido que mais chega perto desse perfil é o do ex-prefeito de São Paulo e candidato ao governo paulista João Doria.

Carlos Pereira afirma que a aliança de primeira hora entre o PSDB e Michel Temer após o impeachment de Dilma trouxe mais prejuízos que benefícios aos tucanos: "O fato de o PSDB ter tido a responsabilidade de bancar o governo Temer e o impeachment deixou o partido muito fragilizado".

"Ele arcou com o custo principal de continuar num governo que, a um só tempo, era muito impopular e estava em meio a uma série de acusações de corrupção. Isso causou uma certa desilusão no eleitor do partido porque ele perdeu o discurso da ética", avalia.

Para David Fleischer, a série de acusações feitas a integrantes do partido como Aécio, Alckmin, Serra e Aloysio Nunes por executivos da Odebrecht e da J&F também esvaziou o partido.

"O PSDB usava um discurso ético muito forte, sobretudo durante os governos petistas, mas, quando essas acusações contra líderes vieram, o partido não soube reagir. Hesitou muito em afastar Aécio Neves da liderança do partido. Isso enviou uma mensagem ruim", afirmou.

Para Carlos Pereira, o PSDB também falhou ao não conseguir aglutinar os eleitores movidos pelo antipetismo.

"O PSDB foi incompetente ao se contrapor aos argumentos da extrema-direita movida, majoritariamente, por um sentimento de antipetismo muito forte. Na medida em que o partido não conseguiu se mostrar como uma alternativa verdadeira ao petismo, o PSDB viu surgirem alternativas na extrema-direita", explicou Pereira.

Para o senador e ex-presidente do PSDB, Tasso Jereissati (CE), o PSDB e todo o sistema político brasileiro precisam ser renovados. Logo após votar neste domingo (7), ele admitiu o fim da polarização entre tucanos e petistas. "Essa polarização acabou. Ainda tem o PT aí porque existe o Lula. Um partido em fim de linha também, como todo o sistema político brasileiro que tem de ter mais coerência e transparência", afirmou. 

"O futuro do PSDB é igual ao de todos os partidos políticos. O sistema político que está aí... o sistema partidário está falido e precisa de renovação", disse o senador tucano. 

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A ascensão de Bolsonaro

Em meio aos acertos do PT e os erros do PSDB, um elemento relativamente novo na política brasileira mexeu o tabuleiro até então comandado por petistas e tucanos: a ascensão de Jair Bolsonaro.

Impulsionado por sua popularidade nas redes sociais, o ex-deputado federal incorporou como ninguém o discurso antipetista e, mesmo com uma campanha modesta financeiramente, desbancou o PSDB no segundo turno.

Para Carlos Pereira, Bolsonaro acertou em cheio na construção da sua imagem antes de as eleições começarem. 

"Ele se colocou com um discurso de oposição, antipetista, antissistema e anticorrupção. Some isso à personalidade forte dele. Dessa forma, ele conseguiu preencher expectativas que estavam abertas para um grande grupo de eleitores que ficou em meio a todas essas crises", explicou. 

Fleischer concorda. Para ele, Bolsonaro apelou ao conservadorismo de parte do eleitorado. "O que Bolsonaro fez que deu certo? Ele bateu fortemente no PT e tem propostas e ideias bem mais conservadoras que o PSDB, por exemplo. Isso o diferenciou dos demais e animou os eleitores", explica o cientista político.

Fleischer diz ainda que Bolsonaro conseguiu falar como nenhum outro candidato com uma parte do eleitorado que não tem interesse em política. 

"Ele apareceu como um novo nome, embora tenha sido deputado por cinco mandatos, se mostra como um outsider, como se não fizesse parte da classe política tradicional. Essa imagem repercutiu", afirma. 

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Cenário após a eleição

Se em âmbito nacional a polarização entre PT e PSDB parece estar chegando ao fim, em âmbito regional, os dois partidos tendem a continuar relevantes.

O PT elegeu três governadores no primeiro turno destas eleições: Rui Costa (BA), Wellington Dias (PI) e Camilo Santana (CE). O partido ainda pode ganhar mais uma disputa no Rio Grande do Norte com a senadora Fátima Bezerra, que foi para o segundo turno contra Carlos Eduardo (PDT).

Se vencer, somará quatro governos estaduais. Uma pequena queda em relação a 2014, quando o partido abocanhou cinco estados: Minas Gerais, Bahia, Piauí, Acre e Ceará.

O PSDB, por sua vez, não conseguiu eleger nenhum governador no primeiro turno dessas eleições, mas está na disputa de seis governos estaduais no segundo turno.

Em São Paulo com João Doria; em Minas Gerais com Antonio Anastasia; em Mato Grosso do Sul com Reinaldo Azambuja; no Rio Grande do Sul com Eduardo Leite; em Rondônia com Expedito Júnior; e em Roraima com José de Anchieta.

Se vencer todas as disputas no segundo turno, o PSDB vai aumentar sua presença nos estados em relação a 2014, quando conseguiu eleger cinco governadores.

Na Câmara dos Deputados, PT e PSDB perderam cadeiras neste ano em relação a 2014, mas o PT tem uma larga vantagem sobre os tucanos. 

O PT elegeu 56 deputados federais em 2018, contra 70 em 2014, ou 20% a menos. Mesmo com essa queda, elegeu a maior bancada da Câmara dos Deputados. 

O PSDB, por sua vez, elegeu apenas 29 deputados, contra 54 em 2014, ou seja, perdeu quase metade de seus quadros.

No Senado, o PSDB e PT continuarão como forças médias. Os dois partidos elegeram a mesma quantidade de senadores neste ano: quatro para cada lado.

Pelo PT, foram eleitos Paulo Paim (RS), Humberto Costa (PE), Rogério Carvalho (SE) e Jaques Wagner (BA). Pelo lado tucano, foram eleitos: Rodrigo Cunha (AL), Plínio Valério (AM), Mara Gabrili (SP) e Izalci Lucas (DF).

Na comparação com 2010, quando também foram disputadas dois terços das vagas do Senado, tanto o PT quanto o PSDB perderam espaço. Em 2010, o PT havia elegido 11 senadores, enquanto PSDB elegeu cinco.

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Sem o azul?

Será que a queda do PSDB no cenário nacional e a ascensão de Bolsonaro selarão o fim da polarização entre PT e PSDB?

Os cientistas políticos ouvidos pelo UOL dizem que ainda é cedo para fazer esse tipo de previsão. Tudo vai depender de uma série de fatores extremamente entrelaçados e imprevisíveis, entre eles: o resultado das eleições no segundo turno, a organização das bancadas eleitas pelo PT e o pelo PSDB no Congresso, a quantidade de governos estaduais vencidos por partido e a habilidade de Bolsonaro em formar um grupo político em torno de si ganhando ou perdendo as eleições.

"É muito difícil prever se o PSDB deixará de ser protagonista apenas porque não chegou ao segundo turno. No passado, eles perderam eleições, mas continuaram a ter importância no Parlamento e no controle de estados importantes como São Paulo e Minas Gerais. Tudo vai depender da força que o partido tiver ao final da disputa como um todo", afirmou André Borges.

Para Carlos Pereira, o protagonismo do PSDB no futuro vai depender da sua capacidade de renovação

"O PSDB terá que passar por um processo de renovação com o surgimento de novas lideranças. Talvez, o grupo conhecido como 'cabeças-pretas', de políticos mais jovens, consiga fazer essa transição. Se eles forem numerosos, pode ser que sejam uma fonte de energia nova", afirmou.  

Para David Fleischer, o PSDB pode conseguir se transformar no principal aglutinador do chamado "centrão", um grupo de partidos pequenos sem viés ideológico bem definido cujas bancadas são necessárias para aprovar propostas de interesse do governo.

"Se o PSDB fizer essa articulação, esse trabalho de conciliação de interesses, é possível que consiga se manter relevante e competitivo em 2022. O problema é que essa competição é difícil porque já tem partidos como o MDB que atuam há muito tempo fazendo esse papel", disse.

Para André Borges, é cedo para decretar o fim do protagonismo do PSDB no cenário nacional, sobretudo porque ele diz não acreditar que Bolsonaro será capaz de formar um grupo político consistente em torno de si mesmo.

"Acho que pode ter uma oscilação, mas não vejo uma grande mudança porque o Bolsonaro tem um partido nanico e, hoje, não tem condição de lançar candidatos a deputados federais ou governadores. A subida de Bolsonaro não representa, na minha avaliação, o surgimento de uma nova força política porque ele tem uma campanha muito personalista", avalia.

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