A República Velha, ou Primeira República, foi o nome dado ao período entre a proclamação da República, em 1889, e a chamada Revolução de 1930, que levou ao poder o gaúcho Getúlio Vargas.
O sistema político era, na época, dominado pelas oligarquias rurais de São Paulo e Minas Gerais, que se alternavam na Presidência da República, ganhando o apelido de política do café (SP) com leite (MG). Nem mulheres, nem analfabetos votavam.
É essa República Velha que Jessé Souza vê fazer de tudo para permanecer ou voltar. O povo, ora, não importa, diz.
"Como foi que o Brasil foi interpretado, esse é o ponto. A concepção que o Brasil tem não nasceu em 1500, nasceu na década de 1930, aqui em São Paulo. Claro, houve algumas tentativas antes, mas essa ideia de Sergio Buarque (de Holanda), 'Olha, o Brasil vem de Portugal' (expressa em parte no livro "Raízes do Brasil"), e depois o Raymundo Faoro (jurista, historiador, com o livro "Os Donos do Poder: Formação do Patronato Político Brasileiro", lançado na década de 1950), vai dar, de modo absurdo, que a corrupção vem de Portugal, no século 14. Só se pode falar em corrupção no sentido moderno a partir da Revolução Francesa (1789).
Por quê? Porque aí se tem o tema da soberania popular. Ou seja, o povo só passa a ser dono de uma coisa que o particular pode roubar a partir do século 18. Mas Faoro diz que essa coisa existia desde o século 14, e o país inteiro acredita. Ensina-se que a nação inteira é de ladrão, de corrupto e tal, de povo preguiçoso, tendente à corrupção. Isso é um crime.
Por que essas ideias foram escolhidas? Porque é a elite, que fez as universidades, inclusive a mais importante, a USP (Universidade de São Paulo), que vai, no fundo, disseminar essas ideias. Se pegar a linha que sai de Sérgio Buarque para (o sociólogo e político) Fernando Henrique Cardoso (PSDB) se vê que é a mesma. Sérgio Buarque elabora, e Fernando Henrique realiza essa mesma ideia, nos anos de 1990 (quando FHC foi presidente da República, de 1995 a 2002). 'Ah, então vamos perseguir os coronéis nordestinos.' Como se o roubo fosse lá, o roubo é aqui, em São Paulo, que controla a economia. O patrimonialismo do Estado (ideia da apropriação do Estado brasileiro por uma elite, que faz do patrimônio público seu patrimônio particular) quer dizer 'vamos enxugar e privatizar o Estado'."
O povo não pode votar e o Estado é meu.
"No fundo, para mim, é uma ideia só. A elite quer continuar a República Velha, que já era ela mesma uma forma de continuar a escravidão com outros meios. A República Velha quer se manter. Essa elite quer o Estado para seu banco particular, para roubar. Para se apropriar do orçamento, e é isso que a dívida pública faz, porque 80% dessa dívida pública com certeza é fraude, papel sujo. Por que a reação contra uma auditoria? Se for dívida real, audita. Se não quer auditar, e ninguém quer, óbvio que é roubo. Outros países que fizeram auditoria diminuíram em quase 50% a dívida pública.
Outro ponto da República Velha é o combate à soberania popular. A eleição que teve mais gente na República Velha não chegou a 5% (de participação da população). É isso que esse pessoal quer. Lula (PT) está preso por conta disso (o ex-presidente foi condenado por lavagem de dinheiro e corrupção passiva no caso do apartamento tríplex em Guarujá-SP). Esse pessoal não pode ter representação. É a manutenção da República Velha durante 100 anos: esse é o projeto dessa elite. 'O povo não pode votar e o Estado é meu.'"