UOL – Em que momento você percebeu que era importante falar sobre diversidade na empresa?
Theo van der Loo – Sou muito engajado em relação à inclusão e à diversidade. Muitas vezes as pessoas perguntam: ‘mas fazer diversidade é bom para o negócio?’ Eu digo sempre: esquece o business case, porque mal não vai fazer, com certeza.
Chegar para uma empresa e dizer ‘vamos ter inclusão e diversidade porque é bom para o negócio’ não vai conquistar corações e mentes. Você vai conquistar as pessoas, os empregados e a sociedade se mostrar que quer inclusão e diversidade porque é o justo, é o correto.
Eu, pessoalmente, não tenho dúvidas de que vai ajudar a empresa também no futuro.
O Brasil ainda tem muito a fazer nessa área. Nós temos aqui na Bayer cinco grupos de afinidade: gênero, que são as mulheres, PCD, para pessoas com deficiência, temos os LGBTs, os negros, afrodescendentes, e recentemente, começamos o grupo que se chama gerações.
Estamos formando esses grupos de afinidade para criar um ambiente na empresa em que possamos ter a inclusão e a diversidade de uma forma contínua, como algo que não vai depender somente de um CEO, mas que seja uma coisa perene.
Conheci muitas pessoas engajadas e diria que eu só me arrependo de uma coisa, de não ter feito isso muito mais cedo na minha carreira.
Mas não adianta eu falar de inclusão e diversidade, se eu não falar também de educação. Sem uma educação melhor, não vamos conseguir aumentar a inclusão e a diversidade.
Acredita que isso é entrave para os processos de seleção nas empresas?
Quando falamos de inclusão de deficientes, de mais mulheres ou de mais negros, muitos veem como exclusão de outros grupos. Na realidade, não é exclusão.
Obviamente não estamos demitindo pessoas para contratar outras, mas, quando houver vagas, queremos que os gestores façam um esforço maior para procurar candidatos que fazem parte do grupo da diversidade. É isso o que nós estamos pedindo, não é para excluir, é justamente para incluir.
Esse é um desafio muito grande que nós temos, o de convencer mais pessoas que contratam todo dia a procurar candidatos para a diversidade.
Muitas vezes achamos que não temos nada a ver com isso. Está tudo errado? [As pessoas acham que] alguém vai resolver o problema. Eu acho assim: posso influenciar esse processo. Se todo mundo fizer a sua parte, vamos conseguir avançar. Mas, se um gestor achar que alguém vai fazer, e eu não preciso fazer nada, aí não vai funcionar.
Se é uma coisa boa e justa, por que estamos aqui falando sobre isso, por que não estamos já fazendo? Porque é difícil. A verdade é que é muito difícil gerar uma mudança do dia para a noite.
Temos hoje o sistema de cotas nas faculdades para negros. Nos Estados Unidos, o sistema foi feito para incluir a minoria. No Brasil, temos cotas para incluir a maioria da população. Isso diz que alguma coisa está errada. Como é que tem de fazer cota para incluir a maioria da população?
O que eu aprendi no caso dos afrodescendentes é que não querem nenhum favor. As pessoas negras com quem converso na empresa falam sempre: ‘nós queremos oportunidade, não queremos favores’.
Mas dizem que eles têm que ser muito melhores que os brancos ou os não negros para poderem ter uma oportunidade, para evoluírem. Têm que ser melhor, têm que se vestir melhor do que o branco, ou seja, tudo um pouco melhor.
Temos de ter essa consciência para poder realmente praticar inclusão e diversidade. E não só em relação aos afrodescendentes, estou falando de uma forma geral.
Sabemos que temos uma cota para PCDs, mas também não é uma coisa que funciona direito, porque algumas empresas têm dificuldade, em virtude da natureza do negócio.
Para uma empresa onde muita gente trabalha só ao telefone, por exemplo, talvez seja mais fácil incluir deficientes, mas, numa empresa em que as pessoas têm que se locomover muito, com vendedores que têm de circular pelo país inteiro, fica mais difícil.
O que as empresas precisam fazer para que, quando houver mais diversidade de funcionários, eles não fiquem estacionados na carreira e cheguem aos cargos de liderança?
Falar sobre esse tema já é um bom passo. É como uma propaganda: precisa continuar até convencer as pessoas, para que os empregados possam se apoderar desse tema e todos participem, não só alguns gestores.
Temos gestores aqui na Bayer que dizem: ‘eu tenho essa vaga e gostaria que fosse preenchida por uma pessoa do grupo da diversidade; vou esperar até vocês acharem uma pessoa’. Na área de recursos humanos, temos uma psicóloga afrodescendente que também ajuda nesse processo.
O preconceito existe. Sabemos que é uma coisa muitas vezes inconsciente, então tem de chamar as pessoas para a conversa, aumentar a conscientização sobre o preconceito e assegurar que tenha algum mecanismo para evitar que o preconceito aconteça na hora da contratação.
Às vezes também somos muito rígidos na contratação. A igualdade é quando tratamos todo mundo igual. Mas eu pergunto: se no passado, PCDs e negros nunca foram tratados como iguais, será que é suficiente começar a fazer isso a partir de hoje? Ou temos que, de certa forma, ajudar um pouco mais? Para que todo mundo tenha mais ou menos a mesma oportunidade e, no caso da falta de algum curso de inglês, ou de uma pessoa que não morou fora do Brasil, ela não seja excluída.
Para 250 vagas de estagiários, nós recebemos mais ou menos 65 mil inscrições por ano, e é um grande desafio fazer essa seleção.
No caso de uma pessoa afrodescendente, na hora da inscrição, ela pode colocar, se quiser, ser afrodescendente ou não. Isso facilita na seleção de candidatos afrodescendentes. Então, se o inglês não for perfeito, não vou ficar olhando os detalhes, vamos ver se tem potencial e se tem talento. Se falta alguma coisa, vamos tentar oferecer esse algo a mais aqui.
Quando comecei a tocar nesse tema, fiz um post no LinkedIn e foi muito interessante o feedback de pessoas que pediram para eu continuar. Eu não sou protagonista, obviamente, mas quero ajudar na causa. Há também algumas coisas que não posso falar, que é melhor uma pessoa negra falar, mas acho que há coisas que eu devo falar, porque, se eu falar, as pessoas vão ouvir.
O post que eu publiquei, se fosse escrito por uma pessoa negra, ia ser classificado de mimimi, mas, como foi uma pessoa branca que colocou, um CEO de uma empresa, falam ‘isso aqui é uma coisa um pouco diferente’. Tanto é que muitos jornais me ligaram.
Eu não tinha intenção de criar tanto alarde, mas aí vi que a coisa era muito pior do que havia imaginado, a realidade é essa. Eu me assustei no início, mas vi que havia começado uma coisa que não podia parar mais.
Algumas pessoas também me mandaram mensagens dizendo: ‘Teo, você é muito corajoso’. Para fazer o certo e o justo, não tem de ter coragem. É fácil fazer o certo e o justo. Coragem é quando você é um dos poucos que faz, e eu ainda me sinto bastante sozinho nesse aspecto.
Há muitos colegas que aplaudem, mas dar aquele passo e a própria empresa começar a fazer, já é um pouco mais difícil.
Você mencionou que não poderia falar algumas coisas, teria de ser uma pessoa negra a dizer. Pode dar um exemplo?
No começo, eu não sabia como lidar com o tema. O que fiz foi conversar com os negros, conversar com LGBTs e com as pessoas com deficiência e com as mulheres. Quando começa a conversar, você fica mais à vontade para fazer as perguntas difíceis.
No caso dos afrodescendentes, convidei duas pessoas da minha confiança para tomar um café e perguntei 'o que que eu faço?' Me falaram, ‘continua o que você está fazendo, conversa com a gente’. Aí eu disse: 'mas eu não sei o que eu falo, se falo negro, falo afrodescendente, afrobrasileiro, preto' ‘Fala o que você achar melhor, mas fale da gente, fale COM a gente, converse com a gente'.
Aí que surgiu também o comentário, ‘nós não queremos favores, queremos só oportunidade para demonstrar nosso talento, nosso conhecimento’. Isso ficou muito marcado.
Qual é o cenário de diversidade hoje na Bayer e onde pretendem chegar?
Hoje, 36% são mulheres – algumas áreas são formadas 85% por mulheres, o que também não é bom, tem de ter em cada área um pouco de diversidade, porque faz bem para o negócio. Diria que, com relação às mulheres, estamos bem até o nível de gerente. Diretor para cima ainda falta, podemos fazer um pouco mais.
Com os deficientes, estamos quase cumprindo a cota. Temos muitos aprendizes que são deficientes, é um acordo que fizemos com o Ministério do Trabalho, junto com o Sesi, para fazer um treinamento com essas pessoas. Algumas ficam aqui e outras acabam indo para o mercado. Então, temos também um papel com os jovens aprendizes para eles ingressarem no mercado de trabalho, e a maioria são pessoas com deficiência.
Os estagiários que entram para a inclusão racial, temos atualmente 23% - a média até recentemente era de 17%, e queremos chegar a 35%, 40%, daqui a alguns anos, porque, se mais pessoas vão se formar na faculdade, automaticamente temos de ter também mais candidatos.
Temos poucos afrodescendentes no nível de gerente para cima. São poucos comparando com as mulheres, por exemplo. Temos muitos afrodescendentes nas fábricas. Sabemos que na alta gerência há muito pouco, talvez três ou quatro. É uma área em que vamos ter de avançar bastante.
No total, temos 21% de afrodescendentes, quase 5% de PCDs e 10% de LGBTs.