Força de vento e sol basta?

Energia eólica e solar são importantes, mas precisam ser combinadas com outras fontes, diz diretor da Comgás

Do UOL, em São Paulo
Simon Plestenjak/UOL e Arte/UOL
Simon Plestenjak/UOL Simon Plestenjak/UOL

Quem tem a força?

Haverá crise energética no Brasil? Fontes alternativas como o vento e o sol são capazes de gerar a força necessária para o país? Temas como esse são discutidos pelo diretor comercial da Comgás, Sergio Silva, em entrevista na série UOL Líderes.

Ele também fala sobre a expansão desde a privatização da empresa, em 1999, a concorrência com o gás de botijão e como a crise econômica impactou os investimentos.

Apagão no Brasil, energia eólica, solar e gás

UOL – O Brasil corre o risco de sofrer uma crise energética?

Sergio Silva – O Brasil, em termos de suprimento de energia, é um país de matriz centralizada. Hoje, falando de energia elétrica, tem uma característica de produção fortemente centralizada, baseada em usinas hidrelétricas, plantas termelétricas, uma pequena parte eólica e uma pequena parte solar, que está crescendo.

Mesmo que a parte renovável de eólica e solar cresça, e ela deve crescer realmente, ela não deverá ocupar uma parte tão forte da nossa matriz. E mesmo que venha a ocupar, ela tem uma característica de intermitência, ou seja, não é constante. À noite, não há geração solar, se não ventar, não há geração eólica [leia aqui o que especialistas dizem sobre isso: vento e sol são instáveis mesmo, mas há soluções, como baterias].

No momento em que houver essa intermitência, como vai fazer? É aí que o gás natural, que é uma fonte limpa e uma fonte de transição, terá – como tem em outras partes do mundo – um papel de solução.

Uma matriz muito baseada numa renovação por fontes renováveis, mas com o gás natural complementando essa geração. É nisso que acreditamos. E o gás natural vai complementar a partir do momento em que você instalar nos grandes empreendimentos soluções combinadas solar-gás e eólica-gás. Coisas desse tipo que já acontecem.

Quando falamos de gás natural, estamos falando de uma energia não renovável. Quais são as perspectivas de extração para os próximos anos?

O gás natural é proveniente dos campos de petróleo diretamente. Todo campo de petróleo pode estar ou não associado à produção de gás e, por necessidade, o gás natural é automaticamente extraído e conduzido via gasoduto para os grandes centros.

Esse gás natural distribuído em São Paulo, por exemplo, vem de diversas fontes. Vem da Bolívia, boa parte, e vem aqui do Brasil e virá em quantidades muitos maiores de toda essa oferta de pré-sal.

E é distribuído através de uma infraestrutura de gasodutos, de tubulações. Somente na nossa área de distribuição existem cerca de 15 mil quilômetros de gasodutos.

A indústria de gás natural fala em fonte limpa, você também falou aqui, mas não é 100% limpa, na verdade. O público não pode confundir, quando se fala assim?

Das fontes energéticas provenientes do petróleo, é o mais limpo sim. A queima do gás natural hoje em grandes fornos, ou nas diversas aplicações, é uma queima limpa, um metano.

Não é um produto renovável, mas de todos é o mais eficiente e o menos agressor ao meio ambiente. É por isso que nós entendemos, e as grandes associações mundiais também entendem, como uma fonte de transição.

É muito difícil você sair do óleo combustível, do petróleo, para o vento. No meio do caminho há de se construir uma ponte, e o gás natural é essa ponte.

E daqui a dez anos, qual será o papel do gás natural, num país com tantos problemas de infraestrutura? Nós acreditamos que as soluções de gás natural podem ajudar muito nessa transição para um perfil de fontes renováveis, porque ele ocupa essa matriz em países desenvolvidos como o Japão, Alemanha, Espanha, Estados Unidos.

E como aqui no Brasil o uso do gás natural ainda é muito incipiente, há um espaço enorme para que isso cresça.

Vento e sol não estão sempre lá

Após privatização, número de clientes subiu 9 vezes

UOL – Como está a oferta de gás natural no mundo?

Sergio Silva - Em relação ao desenvolvimento do gás natural, há muito a se fazer. Para você ter uma ideia, quando a Comgás foi privatizada, em 99, nós tínhamos 200 mil clientes, hoje temos quase 1,8 milhão de clientes. Quantos faltam para conectar? Oito, nove milhões.

Nós temos pela frente um portfólio muito grande para expandir o gás natural. E a oferta desse produto é enorme. Nós não somos mais tão dependentes da Bolívia assim. Quando você olha a perspectiva, toda a oferta de pré-sal, os terminais de GNL [gás natural] que já existem, há uma oferta abundante de gás natural no Brasil e no mundo.

Somente em 2017 nós estamos investindo R$ 450 milhões. A tendência é que a continuemos estendendo essa rede – hoje, a Comgás já está presente em 80 municípios.

De que forma a crise econômica impacta esses planos?

Quando você está num negócio de infraestrutura, na minha visão, a infraestrutura não pode parar nunca. O país atravessou uma crise muito dura, está achando os seus caminhos, mas nós não interrompemos o investimento nesse caminho, porque a infraestrutura não pode pagar esse preço.

A infraestrutura é algo que o país tem que perseguir independente das turbulências. Nós mantivemos a ordem de crescimento da rede. O volume caiu – tivemos uma queda de volume baseada na redução da demanda que foi bastante sensível, ainda não recuperou esse patamar, mas hoje conseguimos avistar um patamar bastante positivo de retomada.

Sofrendo com (falta de) energia

Brasileiro já enfrentou muito problema de energia

UOL – O brasileiro de fato se preocupa em ter uma fonte renovável de energia?

Sérgio Silva - Engana-se quem acredita que o brasileiro aceita tudo. Eu acho que o nosso consumidor, talvez já escolado pelos vários problemas que enfrentou, exige um nível de serviço muito eficiente, exige uma solução que seja competitiva, que tenha baixo custo, mas, sobretudo, um serviço qualificado.

Percebemos isso muito bem nas exigências que os nossos consumidores nos fazem. Quando vamos à casa de um cliente e ele quer uma solução, ele quer entender, saber se é confiável, saber a qualidade.

Ele não quer saber qual é o preço, quer saber qual é o valor percebido, e isso em todos os segmentos, seja indústria, comércio, residência, seja de que nível for, o consumidor é extremamente exigente naquela oferta, e muito mais exigente depois, no pós-venda, na prestação de serviço, na experiência que ele quer ter.

Quais são as características do consumidor residencial e da indústria?

No Brasil, um tempo atrás, o gás natural era associado a dois segmentos: indústria – produto utilizado em fornos, caldeiras – e termogeração, ou seja, as termoelétricas a gás natural.

Hoje, todos os segmentos aqui da nossa área de concessão são atendidos pelo gás natural. Estou falando de casas e prédios, especificamente. Hoje, praticamente 80% dos prédios de São Paulo já são alimentados pelo gás natural.

A Comgás tem uma expansão muito forte em casas, sejam de classe A e B, ou mesmo de classes C e D, para uso em fogões, fornos, churrasqueiras, aquecimento de piscinas, climatização, todas as formas possíveis.

Um outro segmento fortemente atendido é o do comércio. Com isso, você está tirando caminhões das ruas, os antigos caminhões de GLP que levavam cilindros, aqueles das musiquinhas, que estão desaparecendo das cidades.

E há também o segmento automotivo, do gás natural veicular, que hoje voltou a crescer fortemente.

Qual é o custo de instalação, em média, em residências?

Uma ligação de gás natural varia de acordo com a residência. Uma residência típica de São Paulo, aqueles sobrados conjugados, é uma ligação de uns R$ 800. Agora se você tem uma casa maior pode chegar R$ 2.000.

As notícias sobre o aumento de gás de botijão impactam o mercado de gás natural?

Por que o gás de botijão tem aumentado? Esse produto ficou congelado por anos. A Petrobras hoje mudou sua política de preços e a tendência é o GLP não ser mais subsidiado, e ele está flutuando de acordo com as leis do mercado.

O preço do gás natural é controlado pela agência reguladora, não somos nós que definimos a tarifa, mas sim o regulador do estado, baseado no que ele quer para o desenvolvimento disso.

E o GLP, que nos últimos anos aumentou, ele tem essa tendência, porque é um custo logístico alto, é um produto que em boa parte também é importado, você tem que produzir em refinarias, tem que transportar para uma base distribuidora, tem que colocar em caminhão, alguém tem que carregar, colocar na sua casa...é uma cadeia de custos muito longa. Enquanto o gás natural vai diretamente do poço para a sua casa, passando por uma distribuidora.

A privatização e o crescimento

A Comgás é assim

  • Fundação

    1872

  • Funcionários diretos

    Cerca de 1.000

  • Empregos gerados indiretamente

    3.000

  • Número de clientes

    Mais de 1,7 milhão

  • Unidades

    Uma sede administrativa e um centro operacional em São Paulo Bases e escritórios operacionais em Campinas, Jundiaí, Santos, São José dos Campos.

  • Receita líquida em 2017

    R$ 5,5 bilhões

  • Principais concorrentes

    Consigaz, Ultragaz, Liquigás e Supergasbras

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