UOL - Considera que os hábitos de alimentação do brasileiro são corretos?
Marina Fernie - Correto é uma palavra que depende muito do juízo de valor, mas acho que o brasileiro tem hábitos diferentes dos do resto do mundo. O brasileiro gosta muito mais de comida doce, gosta muito de comida mais salgada do que o resto do mundo.
O brasileiro é das pessoas mais preocupadas com a saúde, o bem-estar e a nutrição: 79% dos brasileiros colocam a nutrição e a saúde como uma prioridade. No resto do mundo, não é tão alto esse número.
O brasileiro se importa muito, por esse aspecto [saúde], mas por outro lado adora brigadeiro, adora comer doce, adora comida mais salgada. Então há uma dicotomia aí que para a indústria é difícil de resolver, porque a gente quer ajudar a promover hábitos mais saudáveis, mas ao mesmo tempo tem que ser aos poucos, para o consumidor entender, conseguir fazer essa mudança sem rejeitar os alimentos.
Há um papel muito importante da indústria em educar o consumidor e fornecer os alimentos que atendam às necessidades de saúde e bem-estar dele. É um desafio importante.
A indústria tem esse papel de educar o brasileiro para consumir uma comida mais saudável?
Com certeza, acho que o papel da indústria é muito importante em repensar a cadeia toda, desde o campo até o consumo, até o prato, até a mesa do consumidor. A indústria tem o papel de gerar também essa mudança, ajudar a ir no caminho certo.
A Unilever está realmente comprometida com o que chamamos de nutrição sustentável. Tem o pilar de bom para as pessoas e bom para o planeta –queremos fornecer alimentos que sejam realmente saudáveis e cuja produção seja feita de forma sustentável também. Temos essa preocupação para melhorar a vida dos pequenos agricultores, dos distribuidores, dos vendedores, repensando a cadeia desde o começo.
O segundo pilar é a fortificação alimentar. Existem vários lugares no mundo e no Brasil também onde há deficiências nutricionais, e proporcionamos alimentos que tentam combater essas deficiências.
Outro pilar é a culinária nutritiva. Queremos inspirar, ensinar as pessoas a cozinharem melhor, com ingredientes saudáveis, proporcionando alimentos gostosos e receitas boas.
Outro pilar é o desperdício. Há muito alimento sendo desperdiçado hoje. No mundo, 30% dos alimentos são desperdiçados. Quando você vê esse número e compara com a quantidade de pessoas que estão morrendo de fome, dá até raiva. Como indústria, temos também um papel de ajudar a diminuir esse desperdício na cadeia toda, desde a produção até a mesa.
Como oferecer um produto com menos sódio sem perder fatia de mercado?
Você com certeza olha quanto sódio os alimentos que você compra têm, mas na hora de experimentar muitas vezes pensa ‘ih, esse produto não é tão bom’. Então temos esse desafio de ter receitas nos nossos produtos que consigam entregar essa dicotomia – que sejam gostosos, mas com menos sódio. E é factível.
Não pode tirar radicalmente o sódio todo porque senão, obviamente, ninguém gostaria dos alimentos. O sal traz sabor, o sódio ajuda no sabor, mas é possível.
Por exemplo, lançamos agora a linha nova de temperos Knorr que tem 25% menos sódio, mas tem a maior quantidade de ervas do mercado, do segmento de temperos. É uma receita em que você compensa, tira sódio, coloca mais ervas e realmente faz um mix que dá certo.
A Unilever já teve uma experiência de tirar mais sódio e ver que as vendas caíram...
Há exemplos no passado, mas aprendemos que há como fazer gradualmente e qual é o caminho, qual é o segredo. Agora estamos conseguindo, estamos confiantes de que conseguimos, até 2020, ter 60% do nosso portfólio dentro dos padrões.
E não acaba por aí – a ideia é chegar a 100%. Todo produto que lançamos agora tem que estar dentro dos mais altos padrões nutricionais. É um compromisso forte.
A empresa adquiriu a Mãe Terra, que atua nessa linha de produtos nutritivos. Qual é a proposta?
A missão da Unilever no setor de alimentos é proporcionar alimentos que sejam saborosos, que façam bem e que sejam produzidos de uma forma sustentável. Esses são os três pilares. Têm que ser saborosos, porque se não é saboroso, não adianta, têm que fazer bem para a saúde e, ao mesmo tempo, a gente tem que cuidar do planeta.
Com essa missão em mente, a aquisição da Mãe Terra faz sentido total, porque é uma empresa que tem exatamente essa mesma missão de democratizar a comida natural e orgânica.
Vemos a aquisição da Mãe Terra nos ajudando a acelerar nosso crescimento nesse segmento de alimentos saudáveis e a proporcionar mais alimentos saudáveis a uma fatia maior da população.
Produtos mais saudáveis geralmente são mais caros. Acha que no futuro eles passarão a ser mais acessíveis para uma parcela maior da população?
É um processo. Quanto mais a indústria queira produzir alimentos naturais, orgânicos, mais suprimentos de ingredientes vai haver, mais agricultores vão para esse lugar, e aí ajuda a baixar o custo também. As práticas vão ser melhores, a agricultura vai ser mais inteligente, e vamos conseguir fazer produtos a um preço mais acessível.
Mas hoje, de qualquer forma, já estamos nesse caminho. Por exemplo, a Mãe Terra tem produtos, snacks, cookies, que custam R$ 2. Entre comer uma coxinha na rua e comer um pacotinho de cookies integrais, o preço é o mesmo.
Há também um pouco de preconceito de dizer que todos os alimentos naturais, orgânicos, são caros. Não necessariamente.
Muitas vezes sacrificamos margem para poder levar um produto a um preço acessível para que realmente mais pessoas conheçam a marca e queiram experimentar e entrar nessa onda mais saudável. É um trabalho que demora, mas estamos nesse caminho de democratizar e de garantir que consigamos trazer produtos naturais e orgânicos a um preço acessível.