Prender corruptos ajuda país

Corrupção dá vergonha, mas prisão de culpados melhora imagem do Brasil, diz chefe do hotel Blue Tree

Do UOL, em São Paulo
Simon Plestenjak/UOL e Arte/UOL
Simon Plestenjak/UOL Simon Plestenjak/UOL

Imagem em recuperação

As muitas denúncias de corrupção expostas pela operação Lava Jato dão vergonha, mas a forma como o Brasil está reagindo aos crimes é vista com bons olhos. A opinião é de Chieko Aoki, fundadora da rede hoteleira Blue Tree, em conversa na série UOL Líderes. Ela não mencionou nome de nenhum político e concedeu a entrevista em janeiro deste ano, bem antes da prisão do ex-presidente Lula.

A executiva também avalia o peso da violência sobre o setor do turismo e fala como o Brasil pode aproveitar melhor o seu potencial para atrair visitantes com chamarizes como o futebol. Ela conta ainda como sua carreira se desenvolveu e aponta o que é necessário para que mais mulheres ocupem cargos de liderança nas empresas.

Lava Jato melhora imagem do país no exterior

UOL – As denúncias de corrupção impactam os investimentos?

Chieko Aoki – Esse negócio da Lava Jato, dos políticos, nós ficamos com vergonha, né? Fico extremamente com vergonha de ter um passaporte brasileiro, de ser brasileira e de estar acontecendo tudo isso no país, de existir gente que faz isso.

Quando eu fui ao Japão no ano passado, me perguntaram: “como é que está a Lava Jato?” E eu pensei: “ai, meu Deus, todo mundo me pergunta isso’. E então, disse: “pois é, o negócio está andando, graças a Deus, estão prendendo, está havendo julgamento etc.”

Os japoneses elogiaram, bateram palmas e falaram que o Brasil é um país em que acreditam, porque há tantos países, principalmente latino-americanos, onde o direito não é preservado, onde não existe o estado de direito e da democracia.

Vejam como o país de vocês é democrático, onde pessoas de alto escalão estão sendo questionadas e presas. Isso não acontece em qualquer país. Os outros países deram parabéns pela Lava Jato.

O fato em si é feio e deve ser recriminado, mas a forma como o país está reagindo, as mudanças estruturantes no meio de tudo isso, eles veem tudo isso e acham incrível o Brasil reagir, apesar de estar nessa maré de problemas. Não é como outros países que aceitam, reclamam e não buscam solução.

Fiquei muito orgulhosa de ouvir tudo isso, pelos parabéns pela Lava Jato e pelas reformas estruturantes que estamos fazendo. Espero que isso continue, essa imagem lá fora. 

Corrupção dá vergonha

Violência atrapalha turismo no país

UOL – Como vender os atrativos do Brasil em um cenário de violência?

Chieko Aoki –  Isso é uma coisa que precisa resolver. O turismo é uma atividade da paz. Onde não há paz não há turismo, ninguém quer fazer turismo em lugar onde há tiroteio. Uma cidade que é boa para o cidadão certamente é boa para o turismo. Onde é gostoso morar, é gostoso fazer turismo.

Por isso, as pessoas precisam ter a consciência de que, primeiro, a cidade precisa ser boa para o cidadão. E tão boa que eu também quero convidar os meus amigos para visitar. Essa é a lógica: não pode ser bom só para o estrangeiro, é preciso ser bom para quem mora, principalmente.

A crise econômica influencia na hora de investir no público emergente, que estava ganhando mais, já que a situação agora não é a mesma?

É interessante notar que o que mais impactou [o setor] não foram as famílias, foram as empresas, porque as empresas têm muita gente. Elas fizeram menos eventos, tiveram menos pessoas viajando, negociaram muito as tarifas. E como nosso grande mercado é de empresas, num primeiro momento, sentimos o impacto.

[Na área de] Resorts, não, porque as pessoas parcelam os pagamentos. O brasileiro é muito criativo. Se as crianças se acostumaram a ir a um determinado resort e querem ir, os pais se sacrificam –eu fico até com pena, nós até facilitamos bastante. Então caiu, mas caiu muito pouco –se as pessoas vinham duas vezes ao ano, vieram uma vez. Mas não acho que deixaram de vir por conta do custo, a não ser que a pessoa tivesse perdido o emprego.

Mas as empresas, sim, apertaram o cinto, o que eu também fiz e tem que fazer mesmo. Nós também negociamos tarifas, mas a coisa vai mudando, vai melhorando. Nada é para sempre. Nessa hora temos que estar com o cliente, se é um cliente fiel, fazemos, sim, uma tarifa melhor.

Diria que a crise econômica tem o mesmo impacto que a violência para o setor?

Na nossa empresa, não gostamos de justificativas nem de achar culpados. Primeiro, temos que ver se estamos fazendo a nossa parte. Nós cuidamos bem do nosso hóspede? Apesar de tudo isso, ele quer voltar para o Brasil? Isso é o importante. Cada um precisa fazer a sua parte, no seu negócio, no seu setor, e não esperar só a polícia.

Insegurança assusta os turistas

Mulher não deve só reclamar, tem de fazer também

UOL - De que forma o grupo Mulheres do Brasil, do qual a senhora faz parte, pode influenciar o cenário político, principalmente em um ano de eleições?

Chieko Aoki – Nós não somos partido político, mas ouvimos políticos que consideramos sérios, que têm uma proposta séria. E também não podemos pré-julgar pessoas nem grupos, queremos sempre ouvir. Mesmo na empresa, a melhor coisa é ouvir antes de decidir.

O ponto forte do Mulheres do Brasil é que são mulheres que querem ter voz ativa na sociedade. Nós não queremos só reclamar. O grupo tem alguns pontos inegociáveis, e um deles é não reclamar. Temos que ser protagonistas. Acha que há problema? O que podemos fazer para resolver isso?

Atuamos em vários comitês. Temos o comitê para combater a violência contra as mulheres, o comitê de igualdade racial –porque nós não podemos julgar as pessoas pela cor nem por nenhuma outra diferença–, temos também o ‘80 em 8’, que é fazer em oito anos o que levaria 80 anos para ser feito e ter mulheres em postos de liderança do país.

Há vários grupos fazendo ações sociais, um grupo cultural, que está valorizando a cultura brasileira. São 12 núcleos hoje que atuam nas várias frentes em que nós acreditamos que o Brasil precisa se transformar ou melhorar.

Queremos mostrar que as mulheres realmente têm esse papel importante na sociedade brasileira. Não podemos só dizer ‘eu tenho um papel importante’, temos que mostrar quais são as mudanças, que atividades temos feito: nós vamos ao Senado, onde está a questão da cota de 30% para mulheres nos conselhos das empresas [o projeto agora está sendo discutido na Câmara dos Deputados].

A Luiza Helena [Trajano, presidente do Magazine Luiza] fala um negócio muito bacana: ‘nós não podemos deixar a banda passar, temos que tocar na banda’.

Além da questão das cotas, o que mais deve ser levado em consideração para a mulher buscar posições de liderança nas empresas?

Nós temos o Vozes, que faz palestras com altas executivas, CEOs de empresas ou empreendedoras, que vão principalmente a escolas e faculdades da periferia e contam como muitas delas saíram do nada e chegaram lá.

É importante encorajarmos e inspirarmos um número maior de jovens, homens e mulheres, e mostrar que tudo pode acontecer na nossa vida quando realmente somos protagonistas, queremos, nos empenhamos, nos esforçamos para chegar a uma determinada meta.

Eu acho que é muito importante realizar ações em busca de uma nova juventude, com mais ambição, porque nós temos um momento, quando jovens, em que achamos que dinheiro cai do céu. Temos que conquistar as coisas com o nosso esforço, com a nossa educação, com o nosso trabalho.

E também ajudar aquelas que querem empreender. Ajudamos quem tem dificuldade, passamos nossa experiência e ajudamos a formar mais empreendedoras.

Como foi a sua trajetória?

Fiz direito e ia seguir essa carreira, mas casei, o meu marido tinha um hotel em sociedade, e o sócio saiu. Então, meu marido falou: ‘você fala português, vai lá e me ajuda.’

Mas o que mais me ajudou a começar a minha carreira foi ter muita vontade. Estou tendo uma oportunidade que não cai do céu todo dia, é a única que eu tenho, então vou me esforçar, vou montar uma equipe bacana e vou dar o meu melhor.

Eu tinha muita experiência em ter viajado muito pelo mundo e tinha noção do que era importante para o hóspede e o que eu poderia fazer para que a equipe se motivasse, porque sempre gostei muito de recursos humanos, de pessoas. E foi assim que comecei.

Há 20 anos montei a Blue Tree porque meu marido ficou doente e teve que vender os hotéis dele. Eu tinha uma equipe pequena, que queria continuar na hotelaria, e tinha investidores também que queriam que eu continuasse.

Como eu nunca havia sido uma boa esposa, sempre trabalhei, entre ser esposa e continuar com a carreira, escolhi a carreira. Foi assim.

A senhora disse que não foi uma boa esposa, porque estava sempre trabalhando. A senhora também não teve filhos. Existe essa questão de a mulher ficar dividida entre o trabalho e a casa. Qual é a sua visão?

Não existe o certo e o errado, isso depende muito das suas convicções e prioridades. Existe gente que diz: ‘durante dois anos eu vou me dedicar à família, mas vou continuar me atualizando para não ficar fora do mercado’. E existe gente que não se atualiza. Aí é difícil voltar.

Conheço pessoas que ficaram dois anos se dedicando aos filhos e depois voltaram, porque se atualizaram, não ficaram fora do mundo de negócios. Você pode não estar trabalhando efetivamente numa empresa, mas existem formas de se manter sempre atualizada e, para essas pessoas, a oportunidade sempre aparece.

Acho que depende muito da sua vontade, do que você é como pessoa, do que você quer para você. Um dia os filhos crescem, o marido pode morrer também ou separar, sei lá, a vida tem tantas surpresas... e no final você nasce sozinha e vai morrer sozinha.

O que você quer para você? Você quer crescer, quer sentir que deixou um legado, que criou alguma coisa ou que criou bem os filhos. É uma opção de cada um. Quem se dedica à família, eu não acho errado, também é uma excelente opção. Imagina se o mundo inteiro fosse igual, seríamos todos robôs.

Eu não sou boa esposa dentro do padrão, mas acho que para o meu marido fui uma esposa maravilhosa –pelo menos é o que ele dizia quando estava vivo. Para cada panela tem um tipo de tampa, e acho que tem que casar isso com a cultura da família, com o marido, com as prioridades.

Mulheres com voz ativa

O Blue Tree é assim

  • Ano de fundação

    1997

  • Funcionários diretos

    1.508

  • Total de unidades

    22 hotéis e resorts, mais de 4.000 apartamentos em 18 cidades

  • Principais concorrentes

    Bourbon, Accor, Atlantica Hotels

Fazer do futebol uma atração turística o ano todo

UOL – O Brasil teve recentemente eventos esportivos importantes para o turismo, a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Que aprendizado o setor tirou dessas experiências?

Chieko Aoki – O maior aprendizado foi que, apesar de todos os problemas do Brasil, investindo em turismo nós temos espaço no mundo. Tudo bem que houve a Copa, as Olimpíadas, mas por que não podemos ser um país de futebol o ano inteiro?

Se tantos países apreciam o futebol do Brasil, se você profissionalizar o futebol como um dos pontos turísticos, para que, quando o turista vier, ele tenha a oportunidade de jogar futebol... há campos onde é possível treinar. Eu sei que crianças vêm do Japão todos os anos treinar aqui no Brasil. Isso é turismo esportivo.

Turismo é você ter orgulho da sua cultura, olhar o que temos de melhor para apresentar e melhorar cada vez mais o que temos de bom. Porque lá fora a sinalização é boa, as instalações são boas, há shows, tecnologia.

E eu vejo, viajando em vários países, que o Brasil tem muita coisa boa. Há muitas coisas que podemos e devemos fazer, de forma organizada. Turismo é um investimento, no presente e no futuro, para consolidar a imagem e mostrar as possibilidades.

Qual é a maior exigência de quem se hospeda em hotel?

A exigência é fazer o básico bem feito. O hóspede espera não ter surpresas desagradáveis, só surpresas agradáveis. Na minha opinião, o que podemos oferecer de melhor é valorizar o tempo do hóspede. O tempo é uma coisa muito preciosa, e o hóspede não quer perder tempo.

Se houve algum erro, isso é uma perda de tempo. Se estiver tudo preparado antes, com antecipação, isso é um ganho de tempo. Isso engloba uma série de atitudes que nós temos que ter de antecipar e também de evitar problemas.

Pode dar exemplos dessas atitudes? O que seria uma surpresa desagradável?

Por exemplo: nós checamos todo o apartamento, para quando o hóspede chegar não haver nada fora do lugar. Estamos mudando todas as tomadas para que fiquem perto de onde a pessoa vai dormir, de onde vai trabalhar, para ela não ter que se locomover dentro do apartamento.

Estamos implantando o web check-in, um pré-check-in [pré-cadastro] que é feito antes de chegar ao hotel. Quando ele chega, é só pegar a chave. Há coisas em que a tecnologia facilita a nossa vida, mas, por outro lado, se contarmos só com a tecnologia, deixa de ter o calor humano.

Também não gosto que tenha hotel 100% [de ocupação] porque temos que ter apartamentos para acomodar de uma forma mais rápida e, às vezes, não há o quarto do jeito que o hóspede quer, e temos que mudar depois. Isso é um incômodo.

O cliente busca mais preço ou serviço?

Existem os dois tipos, mas, no final, quando tem um pouquinho mais de condição, a pessoa prefere ter um bom atendimento, uma coisa que funciona bem, que você confia que os lençóis são limpos, confia que o quarto está bem limpo, que vai ter um bom atendimento.

Como acha serão os hotéis daqui a 10, 20 anos?

Hoje as camareiras limpam. Acho que vai haver uma máquina que ‘vapt’, vai limpar o chão, vai encerar. Vai haver muita tecnologia para limpeza de apartamento, para ver a qualidade, para checar chuveiro, checar isso e checar aquilo.

Check-in e check-out, isso muitas empresas já estão fazendo, nós também estamos. A tecnologia vai ajudar muito nas atividades repetitivas, fáceis. E quem sabe alguma inovação que possa facilitar para podermos servir melhor, isso ainda não está do jeito que eu quero.

Simon Plestenjak/UOL e Arte/UOL

Curtiu? Compartilhe.

Topo