Você acha que sabe inglês

Brasileiro desiste no meio do curso porque pensa que já sabe, mas não tem fluência, diz presidente da CNA

Armando Pereira Filho Do UOL, em São Paulo
Lucas Lima/UOL
Simon Plestenjak/UOL Simon Plestenjak/UOL

Pesquisa da rede de ensino de línguas CNA revela que 14% dos brasileiros dizem ter estudado ou tido algum contato com inglês. Mas quando fazem um teste, apenas  2% se mostram fluentes. O presidente da rede, Décio Pecin, usa esses dados para apontar um erro comum entre alunos: achar que já dominam o idioma e abandonar o curso antes de atingir a fluência.

Outro problema é a ansiedade, querer tudo para já. "Aprender inglês é como fazer uma dieta. Precisa de um tempo mínimo para o resultado". Nesta entrevista, que faz parte da série UOL Líderes, Pecin fala da importância de aproveitar bem o seu tempo, analisa como a política afeta negativamente a educação e dá dicas de carreira.
 

Aprender inglês é como fazer dieta: precisa de tempo para funcionar

As pessoas querem aprender inglês, mas não têm paciência, querem resultados imediatos, sem muito esforço. "Precisam entender que é necessário um 'x' de horas para aprender, para se tornarem minimamente fluentes", diz Décio Pecin, presidente da rede de ensino de idiomas CNA e diretor de Treinamento, Cursos e Eventos da ABF (Associação Brasileira de Franchising).

Aprender inglês é parecido com fazer dieta. Para emagrecer, é uma conta matemática: tem de perder mais caloria do que ganha. Aprender inglês também é uma conta. Precisa de um mínimo de 400 horas de aula para se tornar minimamente fluente e estar apto a um teste internacional de primeira linha

O ponto, segundo Pecin, é que os estudantes param antes da hora. "Infelizmente, a maioria das pessoas, quando chega a um nível intermediário, desiste, sente-se à vontade no idioma e para o estudo. Mas não chegou ainda ao objetivo final, à fluência."

Ansiedade é o principal obstáculo para aprendizagem

Para ele, a maior questão é a pressa. "Há uma ansiedade de que tudo tem de acontecer muito rápido. A gente vive numa sociedade do instantâneo. Num clique, você resolve muita coisa. Tem o lado positivo, obviamente. Mas não é positivo para tudo. Na vida, não se resolve tudo em um clique, instantaneamente."

E o brasileiro precisa melhorar seu nível de inglês com profundidade para ser incluído no mercado global. "É fundamental para que as pessoas se desenvolvam na carreira e na vida. Temos uma enorme massa que não fala a segunda língua."

O Brasil é um país que em quase todos os indicadores de desenvolvimento humano e mais especificamente educação fica na segunda ou terceira divisão dos campeonatos mundiais. Com o inglês, não é diferente

Segundo pesquisa da CNA, 14% dizem ter estudado ou tido algum contato com inglês. Quando foi aplicado um teste, notou-se que os realmente fluentes são 1,5%, 2%. Em países como o Chile, esse domínio do inglês é de 5% a 10%.

Aprender uma língua exige esforço

Não tem tempo para estudar? Não terceirize, você é o responsável

"Não estudo porque não tenho tempo" é uma reclamação clássica. Para o presidente da rede de idiomas CNA, cada um deve cavar espaço na sua agenda. "Tempo é prioridade. Você é que faz a prioridade do seu tempo."

Vejo tanta gente que usa seu tempo escasso de forma tão útil e que está plantando nesse momento. Tanta gente dentro de metrô estudando, mas também vejo tanta gente desperdiçando. Tem de ter prioridade

As pessoas, quando tomam decisões na vida, precisam ter foco em cima de suas decisões e não terceirizar a culpa para outros, diz Décio Pecin.

Tanta gente que vem de classes sociais com menos chances de sucesso e chega lá. Tiro o chapéu para essas pessoas. São histórias de vida lindas. Essas pessoas deram valor a cada minuto

Em palestras para jovens, Pecin costuma bater na tecla e dizer: "Você é o protagonista da sua vida. Você tem de ditar para onde vai. Menos distração, mais foco. Você só vai colher aquilo que planta. Se plantar distração, vai colher isso. Se plantar determinação, vai colher [sucesso]."

Use bem o tempo que você tem

Educação tem de ficar longe da política para este país dar certo

A educação e até mesmo a política precisam de menos política e mais técnica, na visão do presidente da rede CNA, Décio Pecin.

Para melhorar o ensino em geral no país, não só de inglês, ele diz que o Ministério da Educação precisava "se aproximar mais das melhores práticas do mercado privado".

Ele critica políticas assistencialistas aplicadas isoladamente e diz que é preciso investir mais em educação. "Não podemos achar que só com distribuição de renda, limitada, a gente consegue melhorar o país. Você aquece o mercado interno por um determinado período, mas não consegue manter, porque o background disso não existe."

É preciso pensar educação de forma absolutamente profissional, séria, dedicada e longe da política para este país dar certo

Pecin diz que o país só muda com educação melhor. "A verdadeira revolução da nova classe média, de que se fala tanto nesses últimos dez anos, só vai acontecer quando estiver embasada em educação."

Lado técnico da política

O ideal, para Pecin, seria que até a política fosse menos política, do jeito que é feita hoje. "A política como um todo precisa se desvincular do lado político e ir para o lado técnico. Do jeito que é feito no Brasil, você pode estar cheio de bons conselhos e gente de bem do seu lado, mas é preciso mais do que isso. A maneira de fazer política no Brasil precisa mudar."

É necessário romper com o modelo de se fazer política por trocas, e tentar fazer por questões técnicas e competência

"Talvez, a gente esteja passando por esse momento agora. Talvez a gente precise passar por algumas feridas neste momento para poder na próxima geração ver coisas diferentes."

Para ele, educação precisa combinar qualidade e quantidade, não basta só um ou outro. Ele critica a aprovação automática de alunos, por exemplo.

Não adianta querer número para mostrar, relatórios bonitos para falar que a aprovação aumentou e a reprovação diminuiu, se você está simplesmente aprovando sem qualidade. É preciso educação sem intervenção política

Negócios afetados por política e economia

O setor de ensino de línguas, como todos os outros, sofreu impacto da crise político-econômica.

"Os dois últimos anos talvez tenham sido os mais difíceis do setor. Na média, a educação de idiomas sofreu queda de 10% nesse período, em alunos e faturamento."

Ele diz que começou a haver melhora no fim do ano passado e no primeiro trimestre deste ano. "A gente projetava um crescimento de 5% em 2017 e já estamos recalculando para cima."

Educação e política não combinam

A rede de idiomas CNA é assim

  • Fundação

    1973

  • Escolas

    600 no país (quatro unidades próprias)

  • Alunos

    400 mil

  • Cursos

    Inglês e espanhol

  • Funcionários

    170 diretos na administração nacional CNA, em São Paulo. Empregos indiretos: 12 mil nas escolas franqueadas pelo país

  • Faturamento em 2016

    R$ 700 milhões

  • Faturamento previsto em 2017

    R$ 770 milhões

  • Principais concorrentes

    Cultura Inglesa, Wizard, CCAA, Fisk

  • Mercado

    CNA possui 13% de market share

Eu queria tocar como Van Halen, mas isso exige disciplina e tempo

Muitas vezes, as pessoas depositam excesso de confiança na tecnologia para aprender alguma coisa. Só que o fator humano não pode ser deixado de lado, diz Décio Pecin, da CNA.

"A gente fala muito de desenvolvimento de tecnologia para mudar o aprendizado, mas a gente esquece de que o aluno continua o mesmo ser humano, que, lógico, evoluiu, mas não deixa de ser um ser humano. Num mundo cada vez mais high tech, a gente tem de continuar lidando com pessoas.", diz.

"As pessoas precisam entender que é necessária uma jornada para o aprendizado. Uma jornada de mínima determinação e comprometimento para que haja aprendizado com qualidade."

Eu gostaria de sentar na frente de um professor de guitarra e, em algumas aulas, tocar Van Halen. Talvez eu leve anos para tocar, talvez não consiga. É fundamental ter consciência de que, se eu quiser chegar àquele nivel, preciso de determinação, disciplina e muito investimento de tempo

Carreira de sucesso? Nunca pare de estudar

Para o presidente da CNA, quem quer ser um bom profissional e um executivo não deve parar nunca de estudar.

"Invista em você, nunca pare. Uma faculdade, duas, três, especializações, mestrado. Invista em educação. Vá atrás de boas referências e tire das pessoas que você convive o que de melhor você puder. Sempre há coisas muito boas nas pessoas do seu dia a dia. A gente costuma olhar para as coisas ruins das pessoas. Todo mundo tem virtudes, aproveite as virtudes delas, aprenda com elas e torne essas virtudes suas forças para se tornar melhor."

Lucas Lima/UOL

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