
A Copa do Mundo da Rússia consolidou um conceito para o futebol que já é usado em outras modalidades e que tem a NBA, o basquete profissional norte-americano, como expoente: a montagem de um elenco em cima de um pilar formado por três jogadores fora de série.
França e Bélgica, que nesta terça (10) às 15h (de Brasília) decidem uma vaga na final do Mundial, conquistaram esse posto recheados de bons jogadores, mas com dois trios poderosos. De um lado, Pogba, Griezmann e Mbappé, gerações diferentes de franceses que se completam. Do outro, De Bruyne, Hazard e Lukaku, que seja com o time atacando, seja com o time defendendo, dão estabilidade a uma Bélgica que mostrou poder para se transformar taticamente e avançar na Copa do Mundo.
Essa mistura, com atletas que estão entre os melhores de suas posições, explica bastante como os dois times chegaram à semifinal e pareciam, sempre que estavam em campo, em estágio bem superior aos rivais que ficaram pelo caminho.
A NBA entendeu, pelo menos desde o início dos anos 2000, que o número três pode ser mágico. Monte seu elenco em cima de um trio forte e o resultado pode vir. Que pese títulos como os do Los Angeles Lakers baseado em Kobe Bryant ou do San Antonio Spurs com um elenco mais equilibrado, a chave das conquistas sempre acompanhava esse número mágico.
O Miami Heat trabalhou em cima de Lebron James, Dwyade Wade e Chris Bosh. Separados, haviam fracassado. Juntos, foram fundamentais nas conquistas de 2012 e 2013 e somaram quatro finais seguidas. Antes, o Boston Celtics, em 2008, saiu de uma fila de mais de 20 anos apostando em Paul Pierce, Kevin Garnett e Ray Allen.
O conceito do trio chegou ao ápice com o Golden State Warriors. O time da Califórnia era saco de pancadas até unir Stephen Curry, Klay Thompson e Draymond Green. Mas eles foram além e, a essa base já poderosa, juntaram um dos astros da liga, Kevin Durant. E não pararam por aí: para a próxima temporada assinaram com DeMarcus Cousins, outro All-Star, o que deve transformar a franquia em uma dinastia.
Franceses e belgas estão próximos do que os Warriors imaginam como time. Ache o trio, mas tenha atletas que complementem essa equipe. Na França, Pogba, Mbappé e Griezmann tem a companhia de atletas talentosos em todas as posições: no gol Lloris, na lateral Hernandez, na zaga Varane e Umtiti, no meio Kanté. O mesmo com os belgas, que aliados a Hazard, De Bruyne e Lukaku contam com Fellaini, Mertens, Courtois e Kompany.
São jogadores talentosos. Muitos jogam juntos em clubes, principalmente na Premier League, e se conhecem muito bem
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Pogba é volante. Griezmann é meia-atacante. Mbappé é atacante de velocidade. Três estilos que se completam em campo e que formam o tripé que levou a França até a semifinal. Os três são jovens, mas fazem parte de três gerações.
Griezmann é o mais velho, com 27 anos. Nascido em 1991, foi campeão do Europeu Sub-19 em 2010. Dessa geração, só ele sobreviveu para estar na Rússia -- outras estrelas, como Martial e Lacazette, não foram chamados por Didier Deschamps para a Copa-2018.
Pogba é de uma geração mais famosa, a de 1993. Eles foram campeões mundiais Sub-20 em 2013. Do elenco atual, aquele time tinha, além de Pogba, o goleiro Areola, o zagueiro Umtiti e o atacante Thauvin. Mbappé integra uma geração mais atual, a de 98, que faturou o Europeu Sub-19 em 2016.
Ou seja: o tripé na Copa da Rússia tem fundação em três equipes de sucesso na base. Agora, os três podem repetir isso no profissional. É bom lembrar: em 2016, chegaram próximos na Eurocopa da França. Mas Mbappé ainda não estava no elenco o time, como dono da casa, perdeu a final para Portugal.
Pogba empilha títulos individuais, como o de melhor jogador do Mundial Sub-20 de 2013, e o de jogador revelação da Copa de 2014. Em campo, é uma espécie de ponte de ligação entre um setor defensivo competente, com Varane e Umtiti, e um ataque que finalmente encontrou um jogador decisivo em Mbappé.
Griezmann alterna bons e maus momentos em campo, mas faz uma Copa do Mundo decente. A presença de Mbappé como referência o deixou com mais liberdade em campo, admitiu recentemente. Ele tem também uma importância significativa ao grupo porque, do trio, é quem representa o elenco fora de campo, ao lado de Varane, Lloris e Giroud. "Formamos um elenco coeso, acredito, que vive um bom ambiente e que, dentro de campo, se complementa", já disse durante a Copa Didier Deschamps.
O desde já histórico duelo contra o Brasil, que permitiu à Bélgica voltar a uma semi de Copa após 32 anos, foi o primeiro no torneio em que Roberto Martínez de fato posicionou Lukaku, De Bruyne e Hazard como um trio ofensivo mais definido. Até então, o meia do Manchester City atuava mais recuado para que o atacante Mertens tivesse vaga na equipe.
Martínez surpreendeu Tite ao definir Lukaku, normalmente atacante, como ponta direita. Os dois trabalharam juntos no Everton, o que permitiu ao treinador um conhecimento mais amplo sobre as possibilidades com o jogador que foi terror para Marcelo, Fernandinho e Miranda. De Bruyne, antes quase um volante, foi o jogador perto da área como um falso nove. Hazard não saiu da ponta esquerda.
A história das Copas mostra que é entre os 24 e 28 anos que normalmente os jogadores vivem seu ápice físico, técnico e mental para brilhar no mais alto nível de exigência internacional. Os desempenhos de Espanha, em 2010, e principalmente da Alemanha, em 2014, confirmam essa tendência que, na semi da Copa, se aplica de forma clara para os rivais da semifinal de São Petersburgo.
Grande parte desses jogadores belgas e franceses passou pela última Copa e pela última Euro, o que ofereceu experiências valiosas para um amadurecimento. O roteiro é similar ao da Alemanha que foi à semifinal de 2010 com uma base jovem para, quatro anos depois, ganhar no Brasil com Neuer aos 28 anos, Khedira aos 27, Özil, Hummels e Boateng aos 25 anos e ainda Müller e Kroos com 24.
As protagonistas da primeira semifinal carregam uma semelhança: deixaram de fora da Copa nomes badalados no cenário mundial. França e Bélgica têm quase uma seleção inteira formada por estrelas ausentes na Rússia.
Os casos mais emblemáticos acontecem na equipe de Didier Deschamps. O técnico francês não levou Benzema, que já não defende o país desde 2015, e viu Rabiot se juntar à relação de polêmicos. O meia do PSG não quis ficar entre os suplentes e abriu mão do sonho da Copa. Martial, Kurzawa e Lacazette foram preteridos por questões técnicas, enquanto Payet se lesionou.
Os problemas que poderiam se desenhar por conta das ausências, no entanto, foram espantadas pelo treinador. A aposta em nomes jovens como Kylian Mbappé deu resultado. Além do atacante, os defensores Lucas Hernández e Pavard lideraram os franceses até a semifinal.
Na Bélgica, a grande ausência é Nainggolan, da Roma. O treinador Roberto Martínez assegurou que a decisão se deu por questão de ordem técnica, rechaçando que os problemas disciplinares anteriores do craque tenham pesado. Em resposta, o meia informou que não defenderia mais o país.
Jordan Lukaku, irmão de Romelu, também acabou preterido, bem como Defour, Benteke e Origi. Os últimos três, após boas passagens pela seleção, perderam espaço no time nos últimos anos.