Da forma como foi feita, a emancipação dos servos tinha um objetivo claro: impedir um fluxo em massa de camponeses para as cidades. Mas era fácil para os camponeses deixarem as terras temporariamente e trabalhar por empreitada na construção, na mineração ou até mesmo nas cidades, afirma Sheila Fitzpatrick em sua obra. Com mais empregos nas cidades, o movimento pendular entre o campo e a cidade tornou-se cada vez mais comum.
Uma em cada duas famílias camponesas tinha ao menos um integrante que deixava a vila para trabalhar nos centros urbanos. Assim, a classe operária russa e a camponesa se confundiam. O número de camponeses que deixava as aldeias para trabalhar fora das terras era maior do que a população urbana industrial --3 milhões.
"A Rússia investiu fortemente na expansão industrial no fim do século 19. No começo do século 20, os centros urbanos se expandiram rapidamente --a vida e a cultura urbana, além da crescente sociedade civil, emergiram. Os camponeses começaram a se mudar para as cidades, alugar alojamentos e formaram grupos para vender sua mão de obra coletivamente", diz Andy Willimott, autor de "Living the Revolution: Urban Communes & Soviet Socialism" (Vivendo a Revolução: Comunas Urbanas e Socialismo Soviético, em tradução livre).
A população das cidades era pobre e suas condições de trabalho eram precárias. "Os operários tinham que pagar multas por material destruído, por exemplo. Era uma situação de miséria generalizada, tanto no campo como nas cidades", diz Coggiola, da USP.
"Trabalhadores mais organizados se voltaram para os sindicatos, o que resultou em uma forma de encontrar uma voz e uma sensação de pertencimento dentro desta paisagem urbana ainda em desenvolvimento", afirma Willimott. "Em pequenos grupos, uma cidadania urbana e a identidade dos trabalhadores eram formadas."
E é neste cenário que a Primeira Guerra eclodiu.
A Rússia entra na guerra com o maior Exército da Europa --formado em sua maioria por camponeses, e sofre perdas esmagadoras. Foram mais de 5 milhões de mortes entre 1914 e 1917 e um fluxo caótico de refugiados à medida que os alemães invadiam o território russo. Como toda a produção era voltada para a manutenção das tropas, começa a fome nas cidades --e, com ela, os protestos. O czar Nicolau 2º cai em fevereiro de 1917, e o Governo Provisório assume --até ser derrubado pelos bolcheviques, no final de 1917.