A placa no portão avisa: só é permitido circular entre 6h e 18h. "Se alguém ficar doente aqui à noite, é obrigado a morrer, porque eles não deixam passar", diz Guilherme Ferreira de Sousa, 60, morador e liderança em Aldeia, a comunidade que teve todas as saídas fechadas pela Estrondo.
Em cada parada, todos precisam apresentar documento de identidade, o caminho que será percorrido, o destino final e a data de regresso. Quem não dá as informações não passa.
A cena difere da descrita na explicação dada pelo advogado da Estrondo, Celso Sanderson, à Promotoria de Justiça Regional Ambiental em 2012 --na época, havia apenas uma guarita.
Segundo Sanderson, a guarita tinha "como objetivo exclusivamente garantir a segurança da propriedade e da reserva legal, não visando de forma alguma exercer algum tipo de controle sobre as comunidades ou constrangê-las". Por telefone, o funcionário Daniel, da Estrondo, disse que a empresa não se manifestaria.
Há suspeitas de que a matrícula mãe da Estrondo, que engloba todo o empreendimento, seja fraudulenta -isso porque em 1999 a empresa entrou no "Livro Branco da Grilagem de Terras no Brasil", do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
O Incra informou, por nota, que os imóveis da Estrondo "vêm passando no crivo dos normativos do instituto no que se refere ao cadastro e certificação" e que as "questões do domínio do imóvel rural e sua titularidade cabem ao cartório e ao governo do Estado".
Em 2009, a Estrondo foi flagrada com trabalho análogo à escravidão, como mostrou a Repórter Brasil. Por trás da Estrondo, está o gaúcho Ronald Guimarães Levinsohn.
A trajetória de Levinsohn é recheada de polêmicas milionárias, como a derrocada na década de 80 da Caderneta de Poupança e Crédito Imobiliário Delfin, então a maior do país, e, recentemente, da UniverCidade, no Rio.
Pouco conhecido das comunidades geraizeiras, o gaúcho vive recluso na Gávea, bairro nobre no Rio de Janeiro. Em 2017, Levinsohn -- conhecido por ser "o conquistador do oeste baiano"-- tornou-se réu por desvios de recursos de fundos de pensão na Operação Recomeço, desmembramento da força-tarefa da Operação Lava Jato, como informou o MP do Rio, em nota.
À União, deve R$ 470 milhões, de acordo com os dados públicos consultados pela reportagem no site da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
Procurados várias vezes nos telefones da Estrondo, da empresa Colina e do escritório de advocacia, nem Levinsohn nem a Estrondo se manifestaram.