Em 7 de fevereiro de 2018, uma cerimônia reuniu 311 jovens na cidade de Yambio, no Sudão do Sul. Na ocasião, registrada nas fotos desta reportagem, parte dos 224 garotos e 87 garotas --algumas com filhos no colo-- entregaram suas armas. Todos trocaram seus uniformes por roupas civis, marcando assim o começo de uma nova fase. Foi quando se libertaram oficialmente de grupos armados, nos quais atuavam como crianças-soldado, para ingressarem em uma nova vida. Desta vez, considerada “normal”: família, estudos, cuidados médicos, brincadeiras.
Fica difícil, no entanto, falar em normalidade no país mais novo do mundo, que se tornou independente do Sudão em 2011. Com 13 milhões de pessoas e uma guerra civil iniciada em 2013, cerca de 4 milhões --quase um terço do país-- foram obrigadas a deixar suas casas nesses cinco anos. Em meio a uma grave crise humanitária, na qual a regra parece ser o caos, aquelas 311 crianças representam uma pequena parte do problema (ou, agora, da solução): estima-se que 19 mil menores tenham sido recrutados para lutar.
Numa conta complicada, levando em consideração a ilegalidade de usar crianças em combates, o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) coloca o Sudão do Sul no topo da lista dos países que mais recrutaram menores nos últimos anos --na sequência aparece a República Centro-Africana, com 10 mil.
Estamos falando de jovens malnutridos, fora da escola, separados de suas famílias e, em muitos casos, armados. Até com fuzis AK-47. Alguns recebem treinamento militar, outros ficam incumbidos de prestar serviços para líderes que, em muitos casos, não escolheram. As garotas são minoria nos grupos armados. E quase a totalidade (99%) entre as vítimas de pedofilia, nos poucos casos reportados no país.
Em seus relatos, as crianças-soldado falam em ataques violentos contra civis, assassinatos, estupros, torturas, saques, roubos e todo tipo de destruição --como atear fogo em uma casa cheia de pessoas. Ações típicas de guerra, aqui executadas por crianças e adolescentes.
Eles estão traumatizados, passaram por atrocidades. Não há simplesmente como sair da floresta e ingressar em uma vida normal. Muitos têm sangue em suas mãos: mataram a mãe de alguém, o filho de alguém
David Shearer, diretor da ONU no Sudão do Sul