Como mudamos o mundo?

Nove líderes religiosos e um ateu apresentam, em artigos, sugestões para construirmos uma sociedade melhor

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"Só conseguirei se olhar para o outro"

Dom Murilo S.R. Krieger, arcebispo católico da Arquidiocese de São Salvador da Bahia*

A pergunta “O que posso fazer para mudar o mundo?” supõe que o mundo precisa ser mudado. Concordo com essa premissa. Também eu não estou contente com o mundo em que vivo. Contudo, longe de me incluir no grupo dos pessimistas, sou alegre, sinto-me bem, gosto de me relacionar e de viver. Como, porém, estar satisfeito com um mundo que conseguiu globalizar a economia, as ciências, a arte etc., mas não conseguiu globalizar a solidariedade, a partilha, a justiça etc.?

É preciso fazer alguma coisa. Mas o quê, se sou limitado e não tenho os poderes de um presidente dos Estados Unidos, não sou o dono da Microsoft e nem consigo, nos meios de comunicação, o espaço de um Neymar ou de uma Ivete Sangalo?

Diante da imensidão de desafios que encontro ao longo da vida, sinto, como qualquer cidadão, que também poderia ter a tentação experimentada por Severino, no poema “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de Melo Neto. A um dado momento, o retirante pergunta a alguém se vale a pena continuar vivendo, diante de uma vida tão severina. Ouviu, então, como resposta: é melhor lutar com as mãos do que deixá-las abandonadas para trás.

Sim, navegar é preciso; todavia, contrariando o poeta italiano Petrarca (século 14), estou convencido de que também viver é preciso.

Mas, o que fazer diante dos tsunamis que enfrentamos no dia a dia? A vida me ensinou que as grandes transformações do mundo nasceram de pessoas que tiveram a capacidade de sonhar grande e repartiram seus sonhos com outras pessoas que, por sua vez, os assumiram como seus. E há sonho mais belo do que aquele que diz respeito a uma vida que seja melhor para todos e não apenas para alguns?

Como veem, já estou me posicionando. Tenho a convicção de que só conseguirei mudar o mundo se olhar o outro --isto é, cada pessoa-- como um irmão ou uma irmã. Se para Sartre “o inferno são os outros”, para mim os outros me completam, me enriquecem, me ajudam a conhecer meus limites e despertam em mim mil energias. Longe de ver o outro como um adversário ou inimigo, vejo-o como um irmão que torna a minha vida melhor. Não viveria contente numa ilha isolada e inacessível aos outros, mesmo que nela eu tivesse à disposição tudo aquilo de que necessito.

Dou minha colaboração para mudar o mundo à medida que trabalho e luto para fazer dele uma casa para todos --insisto, para todos, e não apenas para um grupo

Há quase 60 anos a maioria dos países do mundo assinou a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Foi um gesto louvável, que fez nascer a esperança no coração de muitos. Mas são necessários ainda muitos outros passos para que a esperança se torne realidade.

Enquanto houver pessoas ou famílias que não têm pão, casa, escola, saúde e emprego, não poderei abandonar minhas mãos para trás. Alegro-me ao ver se multiplicarem iniciativas que despertam em multidões o desejo de assumirem trabalhos voluntários. Tais pessoas deixam um rastro de luz à sua passagem.

Vivo num mundo que vê se multiplicarem marcas de violência por toda a parte. Bem dizia um dos personagens de Guimarães Rosa, em “Grande Sertão, Veredas”: “Viver é muito perigoso!”. Em contrapartida, animo-me com dom Helder Câmara, com a afirmação que é como que um resumo de sua vida: “Feliz de quem tem mil razões para viver!”.

Não tenho medo do futuro, porque descubro, a cada passo, o quanto de capacidade para o bem há no coração humano. Aprendi com meu mestre e senhor, Jesus Cristo, que é preciso conjugar, a cada dia, verbos como amar, doar-se, repartir, perdoar, respeitar, conviver etc. São “verbos” difíceis de se colocar em prática, eu sei, eu os experimento. Mas Jesus nunca afirmou que segui-lo e imitá-lo seria fácil. Conto, para isso, com Sua ajuda e procuro anunciá-Lo, pois compreendo cada vez melhor sua autoapresentação: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”.

É isso que enche minha vida de alegria; é isso que eu quero que todos experimentem. Anunciar Seu Evangelho é a melhor maneira que encontro para mudar o mundo, tornando-o melhor, muito melhor.

* Dom Murilo S.R. Krieger, 74, é arcebispo católico da Arquidiocese de São Salvador da Bahia, primaz do Brasil. Catarinense de Brusque, é religioso, membro da Congregação dos Padres do Coração de Jesus e vice-presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).

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"Melhore a si mesmo"

Ajahn Mudito, da Sociedade Budista do Brasil

"Ao contrário do que muita gente pensa, não acho que faltem pessoas querendo fazer o bem; o que falta são pessoas capacitadas a fazê-lo", afirma o monge Ajahn Mudito

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"Buscar a prática do respeito às diferenças à diversidade"

Pai Guimarães, sacerdote umbandista na Abratu

"Cabe a cada um de nós iniciar uma busca incansável na prática do respeito às diferenças e um profundo respeito à religiosidade e às escolhas que cada um faz", diz o sacerdote

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"Relacionar a vida que se tem ao que uma mudança pode proporcionar"

Sheik Abdel Hamid Metwally, líder religioso da Mesquita Brasil

"A maior parte dos pesquisadores aponta a existência de uma força interna que ajuda a concretizar a mudança, porém muitos de nós a ignoramos", afirma Sheik Metwally

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"O primeiro passo é começar consigo mesmo"

Jorge Godinho Barreto Nery, presidente da Federação Espírita Brasileira

"Nesta caminhada de união, a paciência, o respeito, a benevolência, a tolerância se fazem essenciais na prática genuína do bem e no exercício da caridade", diz Jorge Nery

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"Quem é capaz de amar é forte e tem este poder"

Dom Damaskinos Mansour, da Arquidiocese Ortodoxa Antioquina de São Paulo

"O amor é o rei das virtudes e nos dá a vitória, especialmente quando começamos a vivê-lo em nós mesmos e o praticamos em nossas relações com nossos semelhantes", afirma o arcebispo

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"Superar o desconhecimento e a nossa tendência a ilusão"

Daniel Sottomaior, presidente da Atea

"As ilusões cognitivas estão em todos os lugares. Na política, na medicina, na religião, nos relacionamentos pessoais", afirma presidente da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos

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"Atitude ritual e o comportamento social devem ser coerentes"

Michel Schlesinger, da Congregação Israelita Paulista

"Quando não deturpadas, as condutas religiosas ajudam o indivíduo a ordenar sua escala de valores e redirecionar suas atitudes", afirma o rabino

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Antonello Veneri Antonello Veneri

"Nunca perder a capacidade de me indignar com as mazelas humanas"

Mãe Stella de Oxossi, ialorixá do candomblé

"Ninguém, até hoje, conseguiu mudar o todo, apenas a parte; quero dizer que consigo, com muito esforço, mudar apenas a mim mesma e, assim, tento atingir o mundo", diz Mãe Stella

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"Acreditar que as pessoas podem mudar"

Paulo Eduardo Gomes Vieira, pastor presidente da Primeira Igreja Batista de São Paulo

"Deixar de acreditar significa render-se ao conformismo. Deixar de acreditar significa cruzar os braços e se conformar com o caos", diz o pastor

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