Amazônia que arde

Com ação do homem e seca, 2017 atinge recordes de queimadas que devastam o maior bioma brasileiro

Carlos Madeiro Colaboração para o UOL, em Maceió
Bruno Kelly/Reuters

As queimadas na Amazônia estão deixando um rastro de destruição no principal bioma do país. Os números de 2017 chamam a atenção por recordes de focos. Até o dia 12 de outubro, foram registrados 116 mil focos de queimadas na Amazônia --48% de todas as queimadas registradas no Brasil.

O número cresceu significativamente a partir do segundo semestre, quando a estiagem acentua o problema. Não há apenas uma explicação para o avanço do fogo, mas a seca e a ação humana são apontadas como principais fatores para esse tipo de devastação.

Setembro foi o mês com maior número de queimadas já registrados na Amazônia desde que o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas  Espaciais) iniciou, em 1999, a contagem por monitoramento por satélite: 51.311 focos. O maior número até então tinha sido registrado sido registrado também em setembro de 2005, com 47.344 focos.

O Pará foi o grande foco do aumento dos incêndios florestais no maior bioma brasileiro. Apenas nos 10 primeiros meses, o Estado já registra mais incêndios que todos os anos cheios desde o início do monitoramento. 

Fonte: Programa de Monitoramenteo de Queimadas/Inpe
Rogério Assis/Greenpeace Rogério Assis/Greenpeace

Até outubro foram 50.708 focos de incêndios florestais nas terras paraenses, quase metade do total da Amazônia. O recorde até então tinha ocorrido em 2004, quando o ano inteiro teve 47.822.

Este ano, há um aumento de 145% no número de focos no Estado, em comparação com 2016. É o maior percentual de aumento entre todas as unidades da federação brasileiras. Somente em setembro, foram 25.004 incêndios florestais no Pará --aumento de 532% em relação a 2016.

Bruno Kelly/Reuters

Fogo que devasta

Queimadas

aumentam problemas pulmonares

É no Pará que está a cidade campeã em queimadas: São Félix do Xingu. Segundo a prefeitura, o número de atendimentos de saúde triplicou na rede pública a partir de agosto, especialmente com inalações em crianças e idosos pelo aumento de doenças pulmonares. Antes, eram quatro balões de oxigênio semanais, e com as queimadas esse número subiu para 12.

Juan Doblas, do Instituto Socioambiental, afirma que o aumento das queimadas pode ser explicado pelo avanço do desmatamento para criação de pastos no Pará

"Faz vários anos que o Pará é o segundo Estado que mais desmata. Nos últimos três, quatro anos, em particular, houve muita abertura de pastos, derrubada da floresta para plantar capim. O capim cresce e começa a atividade de pecuária. São milhares, milhares e milhares de hectares", avalia.

Doblas conta que as queimadas têm um objetivo bem definido.

[A queimada] elimina parasitas, renova o solo. Mas essa terra tem uma sustentabilidade muito baixa, não suporta muito esse ciclo. É o que vemos no leste do Pará, onde as terras estão bem degradadas"

Juan Doblas, do ISA
 

Secretaria do Meio Ambiente do Pará/Divulgação Secretaria do Meio Ambiente do Pará/Divulgação

A Secretaria do Meio Ambiente do Pará faz um trabalho de orientação sobre a limpeza de áreas de vegetação fora de reservas legais, para evitar o descontrole de queimadas. 

"Esses procedimentos visam mitigar possíveis impactos negativos oriundos das queimadas, como por exemplo, a perda de controle da área de queimada em função da preparação inadequada, que entre outros males, pode vir a gerar um incêndio florestal", explica Antônio Souza, diretor de Meteorologia e Hidrologia do órgão. 

Além do avanço nos meses anteriores, novembro já registra um aumento no número de focos de queimadas. Entre o dia 1º e dia 12 de novembro de 2017 o total de focos registrados no Pará alcançou a marca de 4.010 focos, ainda abaixo da média para todo o mês (5.100 focos), mas 23% acima do número de incêndios registrados no mesmo período de 2016, informa o diretor. 

Bruno Kelly/Reuters Bruno Kelly/Reuters

Seca e ação do homem

É difícil atribuir o avanço no número de queimadas a um único fator. Cristiane Mazzetti, especialista do Greenpeace do programa Desmatamento Zero, lista algumas das explicações: "Algumas regiões da Amazônia estão com uma quantidade de chuva abaixo do normal. Além disso, diria que está associado a processos de desmatamento e primeiro a retirada de madeira de maior valor, que são madeiras mais densas, e depois, para se concretizar o processo de limpeza da área, são feitas as queimadas".

Ela conta que o desmatamento contribuiu decisivamente para esse aumento no Pará. Em especial, em São Félix do Xingu.

São Felix tem uma grande desmatada, usa muito o fogo para pastagem, e parte desses focos pode se relacionar a reforma delas." 

Cristiane Mazzetti, do Greenpeace

Segundo Gabriel Constantino Zacharias, chefe do  Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais, o Prevfogo  do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis), os incêndios florestais em época de estiagem têm motivação humana em pelo menos 90% dos casos.

Para ele, o aumento da temperatura e as mudanças climáticas têm impactado a Amazônia diretamente. Um exemplo é a possibilidade do bioma em extinguir a queimada de forma própria.

"O incêndio na Amazônia poderia ser extinto naturalmente pela chuva, ou pelas águas, ou pela umidade da floresta; mas com a redução da umidade isso não ocorre", diz.

Mazzetti faz ainda um alerta preocupante. "A Amazônia, com as mudanças climáticas, tende a ficar mais seca, e o solo fica mais seco. Esse fator faz a floresta se tornar mais inflamável. Os períodos de queimadas tendem a ficar mais frequentes e intensos", diz.

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