Papa medalhas

Aos 25 anos, Mayra Aguiar - que começou com 17 - é a primeira mulher no judô a repetir medalhas em Olimpíadas

Bruno Doro e Juliana Alencar Do UOL, no Rio de Janeiro
Danilo Verpa/NOPP
Danilo Verpa/Folha de S.Paulo Danilo Verpa/Folha de S.Paulo

Mayra Aguiar é uma acumuladora de medalhas. De Jogos Pan-Americanos. De Campeonatos Mundiais. De Jogos Olímpicos. Nesta quinta (11), ela acumulou mais uma. A de bronze da Rio-2016 é sua segunda medalha olímpica.

O judô é a modalidade que mais medalhas deu ao esporte brasileiro em Olimpíadas, mas repetir um pódio é raro. Até hoje, só três atletas tinham conseguido o feito. Aurélio Miguel foi ouro em Seul-1988 e bronze em Atlanta-1996. Tiago Camilo foi prata em Sydney-2000 e bronze em Pequim-2008. E Leandro Guilheiro conquistou dois bronzes, em Atenas-2004 e Pequim-2008. Mayra é a quarta.

Antes da performance que o público carioca assistiu na Rio-2016, ela ganhou o bronze em Londres. Há quatro anos, foi um resultado dramático. Após a derrota na semifinal, ela se machucou e lutou a semifinal com o braço dormente, com movimentos limitados. Mas venceu.

Em Campeonatos Mundiais, ela também é a maior vencedora do país. São quatro medalhas, incluindo o ouro na última edição, na Rússia. Aurélio Miguel, Sarah Menezes e Érika Miranda ficam em segundo lugar na lista, com três medalhas cada – e nenhum deles foi campeão, como Mayra.

Tudo isso coroa uma carreira precoce que começou aos seis anos e evoluiu em uma velocidade incrível. Aos 14 anos ela foi campeão mundial júnior, aos 17 estreava em Jogos Olímpicos, aos 19 foi vice-campeã mundial, aos 21 já tinha uma medalha olímpica e aos 23 era campeã mundial. Hoje, aos 25, segue acumulando conquistas.

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Talento precoce fez Mayra treinar com homens e encarar Ronda

Harry How/AFP Harry How/AFP

Balé, ginástica ou judô

Quando você é criança, é difícil fugir do estereótipo. Meninas fazem ballet ou ginástica, meninos jogam futebol ou lutam judô. Com Mayra Aguiar foi mais ou menos assim. Ela até tentou dançar ballet, fez ginástica, praticou atletismo. Mas o judô venceu no final. Ela começou aos seis anos e aos 11 chegou à Sogipa, clube que a formou.

 TORU HANAI/REUTERS TORU HANAI/REUTERS

Sparring de Derly

Desde criança, o biótipo de Mayra já chamava a atenção. Forte e grande, ela sempre lutou contra meninos. Mas em seu clube, isso chegou ao nível mais alto possível. Quando começou a se destacar, Mayra passou a treinar com o time de alto rendimento da Sogipa. E sabe quem era o principal nome daquela equipe? João Derly, bicampeão mundial em 2003 e 2007.

EFE/Esteban Cobo. EFE/Esteban Cobo.

Luta contra Ronda

Muito jovem, Mayra já era a melhor do Brasil. Ela foi campeã brasileira dos meio-médios (70kg) aos 15 anos, o que a levou para os Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro. E ela conseguiu algo que pouca gente esperava: chegar à decisão. O problema é que, do outro lado, estava outro fenômeno: Ronda Rousey, que anos depois se tornaria a primeira dona de um cinturão feminino do UFC. Mayra perdeu para a norte-americana e se contentou com a prata.

Lesões, trabalho de chão e a grande rival; conheça sua carreira

  • Herdeira de Edinanci

    Após estrear na Olimpíada em 2008, Mayra voltou ao Brasil e sofreu com o seu corpo. Ela operou o joelho e passou dez meses sem lutar. Ainda em fase de crescimento, ganhou peso e altura. Restava subir de categoria. Para o Brasil, não poderia ser melhor: 2008 foi a última Olimpíada de Edinanci Silva, que dominou a categoria meio-pesado no país por anos.

    Imagem: Lalo de Almeida/ Folhapress
  • Rivalidade com Kayla

    O nome de Mayra, nos meios do judô, vem sempre ao lado de oura judoca: Kayla Harrison. As duas protagonizam, hoje, a maior rivalidade do esporte no planeta. Já se enfrentaram em semifinal e final olímpica, final de campeonato mundial, decisões de Grand Slam. Com a mesma idade da brasileira, Kayla levou ouro na última Olimpíada.

    Imagem: Gabriela Sabau/IJF
  • Muitas lesões

    A lesão de 2009 deixou Mayra afastada por muito tempo, mas o ciclo olímpico da Rio-2016 também foi complicado. Mayra operou o joelho e o cotovelo em 2012 e passou três anos lidando com lesões mais leves. Desde o ano passado, porém, o trabalho mais intenso de fisioterapia deu resultados.

    Imagem: EFE
  • Trabalho de chão

    Nas últimas semanas, Mayra Aguiar trabalhou muito com o técnico de chão da seleção brasileira (e da Sogipa, seu clube), Moacir Mendes. Campeão mundial de jiu-jitsu e ex-judoca da seleção brasileira, ele tentou melhorar a defesa da brasileira. O motivo? Nas últimas duas lutas contra Kayla Harrison, a norte-americana venceu com chave de braço.

    Imagem: Danilo Verpa/NOPP

15 minutos para levantar a cabeça e levar o 2º bronze olímpico

'Achei que não sentiria isso de novo'

Muito feliz. Tem que comemorar agora. Achei que não fosse ter esse sentimento de novo, mas é muito forte mesmo. É uma satisfação para o atleta conquistar uma medalha olímpica, é muito gratificante. Mais uma medalha de bronze para a conta.

Mayra Aguiar

Mayra Aguiar, após medalha de bronze

É um bom demais lutar em casa. Ainda sair com uma medalha olímpica em casa é muito bom. Meus amigos estão aqui, consegui vê-los. A gente se supera todo dia, a rotina é muito cansativa. Muitos lutam, se doam tanto e nem conseguem chegar.

Mayra Aguiar

Mayra Aguiar, sobre luta em casa

Raiva a gente não pode ter em uma luta, porque senão a gente acaba errando muito. Na semifinal, eu pequei em pensar demais. Pensei muito na pegada e ela acabou me complicando. Foi muito difícil ter que virar a cabeça, esquecer aquela luta e sair vitoriosa

Mayra Aguiar

Mayra Aguiar, em relação à semifinal

Harry How/Getty Images Harry How/Getty Images

Mayra se isolou por medalha no Rio

Mayra Aguiar é discreta. Mas a característica foi levada às últimas consequências na preparação á Rio-2016. A judoca gaúcha se isolou como pôde nos dias que antecederam a competição. Apenas a mãe e o namorado conseguiram falar com a medalhista na véspera das finais.

"A gente nem manda mensagem mais porque Mayra prefere se concentrar antes. Faz dois dias que eu não falo com ela, por exemplo. Das redes sociais então ela larga mesmo. Não quer se distrair lendo o que as pessoas falam dela", explicou a irmã, a ex-judoca Hellen Aguiar.

Pelo sonho de medalha, Rafaela Nitz foi uma das amigas "negligenciadas" nos últimos meses. "São mais de 4 anos de trabalho, ela teve problemas de lesões. Esses últimos tempos ficou até difícil vê-la, só a encontrei duas vezes neste ano. Mas a gente entende", conta.

Mayra passou os últimos dias lendo. Está numa fase em que anda com dois livros na mochila, diz a mãe Leila Aguiar. "Esses dias ela estava com a biografia do Steve Jobs. Ela gosta de ler histórias inspiradoras", revela a irmã

O papel da família na conquista

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Irmã inspirou entrada no judô

Um ano e meio mais velha, a irmã Hellen Aguiar inspirou Mayra a lutar judô. Ainda menina, já tinha passado por ginástica artística e balé. Não deu muito certo em nenhuma das duas atividades. "Coloquei nos dois porque ela era muito estabanada", explica a mãe. "Mas não teve jeito pra isso. Uma vez me pediu para ir ao judô. Gostou, foi fazendo. Mayra queria competir, como a irmã. E ela encheu a paciência do professor dela até que ele me convencesse a autorizar que ela participasse de competições."

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Apoio da mãe nos empecilhos

Em 2012, Mayra passou por duas cirurgias delicadas. Morando sozinha desde os 17 anos, teve que contar com o apoio da mãe para fazer o básico. "Foi um período difícil para ela. Sempre foi muito independente e, de repente, tinha que contar comigo até para tomar banho", lembra dona Leila, que admite sofrer com acidentes de percurso. "Olho roxo dói na gente também", diz. "Disse para ela passar no outro olho um corretivo na mesma cor."

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