Bala de prata

Atleta-militar Felipe Wu sobe ao pódio e tenta quebrar preconceito contra o seu esporte

Daniel Brito e Pedro Ivo de Almeida Do UOL, no Rio de Janeiro
Sam Greenwood/Getty Images
Eugene Hoshiko/AP Eugene Hoshiko/AP

A medalha de prata no tiro esportivo conquistada por Felipe Wu, a primeira do Brasil nos Jogos do Rio de Janeiro de 2016, pode ajudar o tiro esportivo a mudar usa imagem. É isso que acredita o atirador brasileiro, segundo colocado neste sábado (6) na pistola de ar 10 metros. Ele e os dirigentes do esporte querem tirar o estigma de que a modalidade seja violenta.

“Muita gente chama isso de armas, nós da comunidade do tiro esportivo chamamos de equipamento”, disse Durval Balen, presidente da CBTE (Confederação Brasileira de Tiro Esportivo), após o pódio em que Wu foi laureado. Foi a primeira vez, em 96 anos, que o país viu sua bandeira ao pódio olímpico desde que Afrânio da Costa e Guilherme Paraense conquistaram medalha nos Jogos Olímpicos da Antuérpia-1920. 

No âmbito financeiro, os atletas do tiro esportivo têm duas queixas, que ecoam entre os adeptos da modalidade. “Temos muito problemas para importar material, quando chega aqui no Brasil, vem com tanto imposto que fica quase inviável. Outro fator são os prazos: às vezes demora um ano para receber uma arma ou munição importada. Espero que este resultado mude essa realidade. E mude a mentalidade das pessoas, porque nossa confederação é uma das únicas que não tem patrocínio, porque as pessoas ainda ligam muito o tiro esportivo a outras questões”, afirmou Wu. 

 

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A primeira medalha dos militares

Felipe Wu é terceiro-sargento do Exército. Quase um terço dos 465 atletas brasileiros inscritos à Rio-2016 pertence a alguma das Forças Armadas, resultado de um programa de apoio ao alto rendimento encabeçado pelo Ministério da Defesa.
 
O grande motivo para eu ter entrado no Exército é que [sendo civil] eu não posso ter arma de fogo até os 25 anos, por causa da lei do desarmamento. Eu como militar posso ter arma a partir dos 18 anos.
 
Após conquistar a medalha de prata na pistola de ar, distância de 10 m, Felipe Wu prestou continência ao subir no pódio. “Não é porque ninguém pediu não, é por mim mesmo”, afirmou na última quinta-feira. 
 
A maioria dos atletas vinculados ao programa do Ministério não são militares de carreira, mas recebem um salário de cerca de R$ 3 mil para se dedicar exclusivamente a treinar.

Quem é Wu: de gambiarra para treinar a privilégio na Olimpíada

  • Começou cedo no tiro

    A descoberta do tiro esportivo aconteceu mais cedo do que ocorre com a maioria dos atletas. Filho de pais atiradores e instrutores da modalidade, Wu começou atirar desde pequeno. Aos oito anos, já tinha ensaiado alguns tiros, mas foi aos 12 que a brincadeira começou a ficar mais séria.

    Imagem: Wander Roberto/COB
  • Gambiarra para treinar

    Até a preparação para o Pan Toronto-2015, quando foi ouro, Felipe Wu adotava um sistema "caseiro" para treinar. Com ajuda do pai, montou um estande de tiro improvisado no quintal de sua casa, no bairro do Itaim (SP). Mas com uma distância um pouco menor (7 m) do que a metragem oficial da pistola de ar: 10 m.

    Imagem: Dennis Grombkowski/Getty
  • Namoro com atiradora

    Felipe Wu namora Rosane Budag - eles formam um dos casais do Team Brasil. Os dois não se separam nem na hora de dormir na Vila Olímpica. Juntos há dois anos e meio, receberam autorização especial do COB para dividirem o mesmo quarto no apartamento da equipe de tiro esportivo. Pelas regras da entidade, homens e mulheres não compartilham quarto.

    Imagem: Fabio Aleixo/UOL
  • Custo do equipamento

    Felipe Wu enfrentou dificuldades financeiras em sua preparação olímpica. Para competir em alto nível, ele compra suas armas no exterior, especialmente Alemanha e Suíça, onde uma pistola de ar não sai por menos de R$ 10 mil. Fora o custo da munição, cuja caixa chega a custar R$ 400,00 e não dura mais do que um treino.

    Imagem: Wander Roberto/COB
Sam Greenwood / Staff

As histórias da medalha

Wu não conseguiu dormir e avisa: comemoração, só no dia 10

Responsável por recolocar o Brasil no pódio olímpico do tiro esportivo após 96 anos, Felipe Wu ainda não conseguiu dormir de tanta felicidade pela conquista. O atirador que ficou com a prata na pistola de ar de 10 m no último sábado (6) pretende comemorar sua medalha só após o fim da competição da modalidade.

"Ontem eu saí do tiro, dei entrevista... Vim aqui para a Vila para comemorar com meus amigos. À noite mal consegui dormir. Quis responder todos os meus amigos que mandaram mensagens, foi bastante gente. Mas não celebrei direito, vou começar a comemorar mesmo a partir do dia 10, que é quando termina de fato minha competição"

O brasileiro terá nova chance de subir ao pódio na quarta-feira (10), quando disputa a categoria pistola de ar 50m.

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Torcida que atrapalha e ajuda

Eu ouvi o barulho na torcida, a buzina da Rússia, vi que um pouco depois teve uma confusão ou algo assim, mas eu sempre digo que eu tenho que pensar só em mim, no alvo e na arma. Até porque não existe regra que proíba o barulho

Felipe Wu

Felipe Wu, sobre a importância da medalha

A sensação é de dever cumprido. Batalhamos muito para ganhar essa medalha. Até hoje eu não achava que a torcida faria tanta diferença, mas na final foi muito legal essa energia

Felipe Wu

Felipe Wu, sobre o peso da torcida

Wu começou mal a competição

  • Emoção na eliminatória

    O caminho até a final não foi fácil para Felipe Wu. Mais cedo, a etapa classificatória já havia guardado doses de emoção para o brasileiro. Ele fez duas séries ruins e perdeu nove pontos, chegando a estar na 25ª posição entre 46 atletas. Recuperou-se a tempo de classificar à final, passando apenas em sétimo lugar com 580 pontos.

  • Os gritos da arquibancada

    A torcida brasileira fez diferença na final. Desde 2014, uma nova regra permite a livre manifestação dos torcedores no local de prova. "Wu, Wu, Wu", cantavam os brasileiros que, para os padrões do tiro esportivo, gritaram alto no Centro Olímpico de Tiro quando os adversários atiravam. Mas quando um russo puxou uma vuvuzela na hora errada, quase deu confusão na arquibancada.

  • Um beliscão no ouro

    Líder do ranking mundial da Federação Internacional de Tiro (ISSF), Felipe Wu disputou o lugar mais alto do pódio e colocou pressão no vietnamita Xuan Vinh Hoang nas últimas séries. Na última chance, Wu acertou o alvo antes do adversário, chegou a passá-lo, mas Hoang não cedeu à pressão e garantiu o ouro cravando 202.5, a melhor pontuação da categoria em uma final olímpica.

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