Guerreira indomável

De Okoye (Pantera Negra) a Michonne (Walking Dead), Danai Gurira se especializou em viver mulheres poderosas

Beatriz Amendola Do UOL, em São Paulo
Divulgação e Montagem/UOL

Nascida em uma cidade rural do meio oeste americano, chamada Grinnell (Iowa) e com menos de 10 mil habitantes, e criada no Zimbábue, Danai Gurira pouco via personagens negras à frente de produções do cinema e da TV.

Mas hoje, aos 40 anos, a atriz e escritora ocupa um posto privilegiado: ela acaba de estrear no grandioso Universo Cinematográfico da Marvel como Okoye, a leal e determinada líder da guarda real de "Pantera Negra" --a primeira mega produção de um filme de super-herói com um protagonista negro.

Danai também é um dos rostos mais conhecidos da TV. Desde 2012, ela impressiona os espectadores de "The Walking Dead" como Michonne, a guerreira durona habilidosíssima com katanas. Uma das mais queridas pelos fãs da série, ela voltará a ser vista a partir de domingo (25), quando a série retorna para a segunda metade de sua oitava temporada.

A evolução de Michonne

A Michonne de "Walking Dead" guarda muitas semelhanças com a Okoye de "Pantera Negra", sobretudo os princípios que ambas colocam acima de tudo.

"Você vê como Michonne consegue encontrar essa abordagem, se manter fiel a si mesma e manter sua integridade em um mundo que está sempre mudando", diz Danai em entrevista ao UOL. "Você nunca sabe quando vai encontrar um Negan (Jeffrey Dean Morgan), quando vai encontrar um Governador (David Morrissey), quantos zumbis você vai enfrentar amanhã. Há incertezas, mas ela mantém esse 'novo eu' que ela encontra".

E o "novo eu" da personagem, para a atriz, alcançou sua melhor versão nas últimas temporadas da série, o que coincidiu com sua abertura para o relacionamento com Rick (Andrew Lincoln) e a amizade com Carl (Chandler Riggs). "É uma versão melhor até do que ela era antes de o mundo ir pelos canos. E é muito empolgante fazer isso como atriz, descobrir e escavar uma personagem. Toda temporada, algo vai mudar e desafiá-la. Eu nunca estou só 'fazendo a Michonne'".

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Final feliz?

Há duas temporadas cambaleando no ritmo, "Walking Dead" viu as críticas negativas dos fãs e da mídia especializada aumentarem enquanto seus índices de audiência caíam (embora não o suficiente para tirá-la do posto de série mais vista da TV americana). Coincidência ou não, as conversas sobre um possível final da série também se tornaram mais frequentes, ainda que os executivos da emissora AMC garantam uma vida longuíssima para a produção. Mas esse final, quando chegar, será feliz?

Na estreia da oitava temporada, uma cena de felicidade doméstica envolvendo Michonne, Carl e um Rick barbudo deu esperanças aos fãs, apenas para demoli-las semanas depois, quando o adolescente foi mordido por um zumbi. Teria a série enganado os fãs? Uma reviravolta irá salvar Carl? Danai garante que o verdadeiro significado da cena ainda será revelado.

"É o que eles almejam, é tudo o que eu posso contar. É uma visão", explica. "Você tem que manter muito viva a visão daquilo pelo qual você está lutando. Isso vale para tudo, não importa se você está no apocalipse ou não. Qual o seu propósito? O que te motiva a chegar ao próximo dia? Tem que ter esse lugar aonde você quer chegar, um destino em mente. É uma pequena analogia para isso. Há um destino em mente, onde há paz, alegria, Rick pode andar com Judith e ver o que está acontecendo com a comunidade. É a beleza do que queremos e demos um gostinho para vocês".

Vida além de Hollywood

  • Zimbábue

    Danai se mudou da pequena cidade de Grinnel com sua família para o Zimbábue, terra natal de seus pais, quando tinha 5 anos. O país, à época, havia acabado de conquistar sua independência. Ela voltou aos Estados Unidos já adolescente, quando foi estudar psicologia na universidade. Depois de se formar, estudou atuação na prestigiosa New York University.

    Imagem: Chris Pizzello/Invision/AP
  • Broadway

    Além de atriz, Danai já é reconhecida por seu trabalho como dramaturga. Suas peças, cujas histórias contam os dramas de mulheres africanas, renderam uma série de prêmios à artista e já foram exibidas em palcos da Broadway e do Yale Theater. Sua última produção, "Eclipsed", teve a vencedora do Oscar Lupita Nyong'O no elenco e se tornou a primeira peça da Broadway a contar com um elenco e uma equipe formado apenas por mulheres negras.

    Imagem: Rob Kim/Getty Images
  • Aulas na África

    Danai é fluente em quatro línguas: inglês, francês e as africanas shona e xhosa. Além disso, a atriz já deu aulas de dramaturgia no Zimbábue, na Libéria e na África do Sul.

    Imagem: Getty Images

Poderosa

Kwaku Alston/Marvel Kwaku Alston/Marvel

"Pantera" e representatividade

Raridade em Hollywood com seu elenco majoritariamente negro (de dez atores principais, apenas dois são brancos), "Pantera Negra" se tornou em pouco tempo um filme de superlativos: classificado como "o melhor da Marvel" pela crítica especializado, arrecadou em quatro dias nos Estados Unidos impressionantes US$ 242 milhões --mais do que o malfadado "Liga da Justiça" conseguiu em dois meses.

Essa resposta incrível, o apoio e a empolgação que tenho recebido não vêm só de pessoas da diáspora africana, mas de pessoas em todos os lugares: afro-americanos, brancos, latinos. Todos estão animados com o filme, e isso reflete uma sede que está sendo saciada com esse tipo de representatividade.

Dois anos depois do escândalo do "Oscars so white", que criticava a ausência de atores negros e de outras etnias entre os indicados da edição 2016 da premiação, Danai se diz animada com a popularização de "narrativas poderosas", mas acredita que o essencial é que o espaço dado a elas se torne uma constante em Hollywood.

"Essas histórias finalmente estão recebendo um sinal verde, a ponto de as pessoas poderem ver e ouvir a partir da perspectiva de alguém que não é caucasiano, que é uma pessoa de cor, que tem muito a dizer e uma história complexa que precisa ser ouvida. É um momento empolgante, mas é uma jornada. Isso vai continuar por muito tempo? Vai e volta? Você tem que procurar uma consistência", ela diz.

Não dá, afinal, para que a representatividade seja um eterno trabalho de Sísifo, que a cada dia precisa recomeçar do zero.

"Na verdade, temos que chegar a um ponto em que isso [a representatividade] seja a norma, em que seja algo do qual nem precisemos falar; em que seja a norma que a representação seja variada, de uma forma consistente; em que estejamos escutando às pessoas igualmente. É onde precisamos chegar. É uma luta, e ainda estamos nessa jornada."

Danai Gurira

Alberto E. Rodriguez/Getty Images for Disney Alberto E. Rodriguez/Getty Images for Disney

Mulheres negras à frente

O cinema mainstream ainda não tem uma super-heroína negra como protagonista para chamar de sua, mas nas séries as atrizes afro-americanas vêm tomando a dianteira --um movimento do qual a própria Danai foi pioneira, quando estreou em 2012 como Michonne em "The Walking Dead" e logo se tornou um dos destaques da atração.

A ela se seguiram nomes como Kerry Washington ("Scandal") e Viola Davis ("How To Get Away With Murder"), que em 2015 se tornou a primeira negra a vencer o Emmy de melhor atriz em série dramática. "Acho que houve uma curva muito encorajadora em termos de mulheres negras estarem sendo mais representadas na tela. Me animei muito com 'Insecure', da Issa Rae, e vi alguns episódios de 'Ela Quer Tudo', que é derivada do filme de Spike Lee e é protagonizada por uma mulher negra e escrita por mulheres negras".

Outra amiga próxima de Danai, Sonequa Martin-Green (a Sasha de "The Walking Dead"), também conquistou um marco: ela se tornou a primeira protagonista negra da franquia "Star Trek" com a série "Discovery", que estreou no ano passado. "Para mim, isso é algo que você tem que parar 1 minuto e celebrar, é lindo. Você tem esse tipo de representação e você vê que alguém como Sonequa está lindamente equipada para liderar uma franquia. Abre um precedente que ninguém pode ignorar."

Na visão da artista, a indústria já entende que é benéfico ter mulheres de outras etnias no comando das histórias.

Isso finalmente está pegando de verdade. Quando você vê pessoas como Sonequa e a incrível Viola Davis, você sabe que há algo acontecendo. Quando eu estava na escola e assista à TV, eu não via nada disso que se vê agora. Essas pessoas literalmente não estavam lá. Eu tenho que celebrar isso

Onde ver mais Danai

Divulgação Divulgação

"All Eyez On Me" (2017)

Na biografia do famoso rapper Tupac Shakur, que morreu em 1996, a atriz dá vida à mãe dele, Afeni.

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"Mother of George" (2013)

Danai é Adenike, uma mulher nigeriana que vive em Nova York com o marido e sofre por não poder engravidar --o que a leva a tomar uma decisão que coloca sua família em risco.

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"O Visitante" (2007)

Um professor interpretado por Richard Jenkins retorna a seu apartamento em Nova York e se surpreende ao se deparar com um jovem casal de imigrantes, formado por Zainab (Danai) e Tarek (Haaz Sleiman).

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