Agora é que são elas?

Em 52 cidades, apenas mulheres disputam a prefeitura. Veja por que esse número ainda é baixo

Carlos Eduardo Cherem e Paula Bianchi Colaboração para o UOL, em Belo Horizonte e do UOL, no Rio
John Devolle / Getty Images

Entre os mais de 144 milhões de eleitores brasileiros que votarão em outubro, 52% são mulheres. No entanto, apenas 31,18% das candidaturas aos cargos de prefeito, vice e vereador são femininas --o percentual fica dentro da lei, que exige um mínimo de 30% de candidaturas femininas.

Nas eleições deste ano, 52 municípios brasileiros têm somente mulheres como candidatas a prefeitura --o dado foi obtido com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em levantamento realizado em meados de agosto. A equidade de gênero ainda está longe de ser alcançada: 3.815 dos 5.570 municípios têm apenas homens concorrendo, o que equivale a 68% do total.

Atualmente, as mulheres ocupam 10% das prefeituras e representam 12% dos vereadores nas câmaras municipais.

O país, segundo a socióloga e fundadora do Instituto Patrícia Galvão, Fátima Pacheco Jordão, está à frente apenas do Haiti no continente. Ela aponta que cerca de 70% das cidades brasileiras sequer têm mulheres concorrendo à prefeitura.

A não participação feminina é escandalosa Fátima Pacheco Jordão

Os empecilhos às candidaturas de mulheres começam, segundo Jordão, já dentro dos partidos.

“A legislação impõe ao menos 30% de candidaturas, mas não conseguimos conquistar nem os 30% de mulheres eleitas, muito menos os 51% que seriam o ideal e correspondem à proporcionalidade da mulher na sociedade brasileira”, afirma a geógrafa Rosa Estes Rossini, professora da USP (Universidade de São Paulo) que chama a atenção para a desproporção entre o número e a população do país.

Nem o PMB, Partido da Mulher Brasileira, alcança o percentual de candidaturas equivalente ao da população: a sigla tem 43% de mulheres concorrendo nesse pleito.

“Elas têm bons cargos no plano dos diretórios, mas quando se elegem para o Executivo são fortemente barradas por acordos das forças partidárias que são masculinas, patriarcais, machistas e desatualizadas”, afirma Jordão. “Os partidos chegam ao limite legal e me pergunto se o total dessas mulheres candidatas são de fato competitivas ou estão ali só como laranjas.”

Arte UOL

Duas mulheres, 3.275 eleitores

Pela primeira vez na história do município mineiro de 4.000 habitantes, Ribeirão Vermelho terá uma eleição disputada somente por mulheres em outubro. A cidade também será a única cidade de Minas Gerais, que vai eleger 853 prefeitos em outubro, a vivenciar essa situação.

Disputam os votos dos 3.275 eleitores ribeirenses, 52% composto por mulheres, a vice-prefeita Delma Batista de Souza (PT), 59, e a ex-prefeita Ana Rosa Mendonça Lasmar (PSD), 48, que ocupou o cargo por duas vezes.

"Estamos encarando um terceiro turno porque somos também mães e donas de casa. Acho que isso faz diferença para o município", afirma Lasmar. "A mulher é mais sensível e dá maior atenção às questões sociais".

"Isso é um diferencial e demonstra que na nossa cidade não existe preconceito na política. Ninguém acha estranho aqui isso de ter duas candidatas", diz Souza.

Divulgação/Prefeitura de Ribeirão Vermelho Divulgação/Prefeitura de Ribeirão Vermelho

Adversárias históricas de grupos que militam na política de Ribeirão Vermelho há décadas, elas têm um ponto em comum: não falam em obras em suas plataformas de campanha. Pelo contrário, ambas falam somente na manutenção, ampliação e melhoria da qualidade dos serviços na cidade.

Uma dessas mulheres será responsável pela aplicação do orçamento anual de R$ 7 milhões de um dos menores municípios de Minas Gerais, com 39 km² e a 270 km de Belo Horizonte.

No sul do Estado, ocupando a margem oposta à foz do Ribeirão Vermelho, o município tem a economia baseada na produção de milho e café, além da extração de areia.

O maior orgulho da população é abrigar um dos mais importantes acervos ferroviários do país. É na estação ferroviária de Ribeirão Vermelho que se encontra a maior rotunda (estrutura circular para inverter a direção dos trens) da América Latina.

O que elas querem

A candidata Ana Rosa Mendonça Lasmar não tem propostas específicas para a mulher no seu programa de governo. A ênfase é para atendimento a idosos e crianças. Ela propõe adotar a terceirização de serviços no município e princípios de práticas sustentáveis na administração.

A candidata promete atualizar mensalmente os salários dos servidores, "procurando exercer a melhor forma de governança para o município".

Já a proposta de governo de Delma Batista de Souza tem como bandeira o incremento da participação da população na decisão sobre onde, como e quando gastar, "garantindo que as decisões fluam mais rapidamente, por meio do orçamento participativo".

Embora seu programa de governo também não tenha políticas específicas para as mulheres, Delma afirma querer "garantir que mulheres, negros e negras, idosos, jovens e pessoas com deficiência possam desfrutar de tudo o que a cidade proporciona".

Quem são elas

  • Ana Rosa Mendonça Lasmar (PSD)

    Eleita prefeita de Ribeirão Vermelho pela primeira vez em 2000, aos 31 anos, a bióloga Ana Rosa Mendonça Lasmar foi reeleita em 2004. À época, era filiada ao PTB. Ela diz querer repetir o feito do pai, Nilton Lasmar, que foi prefeito de Ribeirão Vermelho por três vezes

    Imagem: Divulgação
  • Delma Batista de Souza (PT)

    A vice-prefeita de Ribeirão Vermelho, Delma Batista de Souza, 59, nasceu no município e entrou para a política após a graduação em pedagogia na Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), filiando-se ao PT. Foi eleita vereadora no município em duas ocasiões --2001 e 2004

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Equidade de gênero na política

Wilton Júnior/Estadão Conteúdo Wilton Júnior/Estadão Conteúdo

O legado de Dilma

A eleição de Dilma Rousseff foi um marco para o protagonismo feminino ao colocar pela primeira vez uma mulher no mais alto posto de poder do país, afirma a socióloga Fátima Pacheco Jordão.

Antes de Dilma, o Brasil nunca teve tantas mulheres projetadas nos espaços de ministérios, instituições importantes. Fátima Pacheco Jordão

"Basta ver a reação inesperada quando Michel Temer não coloca mulheres em seu governo. Há dez anos, isso seria visto com naturalidade”, afirma, ao lembrar a polêmica envolvendo o ministério montado apenas por homens pelo peemedebista.

Com o impeachment e a crise no PT, a “força de candidatura” do partido se enfraquece, segundo Jordão, e isso tende a diminuir o número de mulheres eleitas neste pleito, uma vez que a legenda costuma ter um grande número de candidatas. "Imagino que isso se reflita mais na base, em que estão a maior parte das candidatas mulheres do partido", explica.

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Um objetivo a ser alcançado

Pensando em ampliar a participação feminina na política nacional, um grupo de mulheres, lideradas pela filósofa Márcia Tiburi, criou, em 2015, o #PartidA. O movimento funciona como um partido e tem como objetivo impulsionar a presença de mulheres na política, mas não é oficialmente registrado para disputar eleições.

"A partidA é uma roda, uma reunião entre feministas, uma conversa sobre feminismo e uma conversa que tinha como objetivo reunir pessoas para empoderá-las, para protagonizar essas pessoas para ocupar o governo”, explica Tiburi.

Outros municípios só com candidatas mulheres

  • Ocauçu (SP)

    Em Ocauçu, distante 425 km da capital paulista, a candidata a reeleição no município, Alessandra Colombo Marana (PSDB), só não tomará posse se a eleição for anulada. Ela é a única candidata a prefeita na cidade com 3.559 eleitores.

  • Nova Granada (SP)

    Em Nova Granada (SP), a 472 km de São Paulo e com 15.608 eleitores (50% mulheres), a prefeita Ana Célia Ribeiro Arroyo Salvador (PSD) vai apoiar nas urnas a única candidata da cidade, a médica Tânia Liana Toledo Yugar (PSB).

  • Farol (PR)

    A prefeita de Farol, Ângela Maria Moreira Kraus (PSDB), vai tentar a reeleição contra a candidata Dirnei de Fátima Gandolfi Carneiro (PMDB). O município tem 2.654 eleitores (50% são mulheres) e fica a 381 km de distância de Curitiba.

  • Brasileira (PI)

    No município de Brasileira, a candidata Carmen Gean Veras de Menezes (PP) busca votos junto aos 6.494 eleitores do município, a 180 km de Teresina, para vencer o pleito contra a prefeita Paula Miranda Amorim Araújo (PSD), que tenta a reeleição.

  • Estrela Velha (RS)

    Em Estrela Velha, Cecília Montagner Ceolin (PSB) é candidata única. O município, com 2.986 eleitores (47% mulheres), fica a 267 km de Porto Alegre.

Elas já fizeram história

  • Angela Merkel

    A chanceler, que comanda a Alemanha desde 2005, foi eleita pela Forbes a mulher mais influente do mundo novamente em 2016.

    Imagem: EFE/Wolfgang Kumm
  • Michelle Bachelet

    Primeira presidente mulher do Chile e reeleita em 2014, Bachelet também foi a primeira presidente da ONU Mulheres.

    Imagem: Mario Ruiz/EFE
  • Hillary Clinton

    Candidata democrata ao governo dos Estados Unidos, pode ser tornar a primeira presidente mulher do país. Ex-mulher do ex-presidente Bill Clinton, foi secretária de Estado do governo Barack Obama.

    Imagem: Justin Sullivan/Getty Images/AFP
  • Michelle Obama

    Advogada, a primeira-dama dos Estados Unidos aproveitou a projeção do cargo para apoiar causas como a necessidade de exercícios físicos e se posicionar contra o racismo.

    Imagem: Amanda Lucidon/ TWH
  • Christine Lagarde

    Primeira mulher a assumir o comando do FMI (Fundo Monetário Internacional) e ex-ministra das Finanças da França. Foi reeleita no começo do ano para mais um período de cinco anos no comando do fundo.

    Imagem: AFP
  • Dilma Rousseff

    Primeira mulher a presidir o Brasil. Perdeu o cargo no dia 31 de agosto, após o senado decidir pelo impeachment da então presidente

    Imagem: Gabriela Biló/Estadão Conteúdo

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