Muito líder, pouca venda

2016 foi ruim de loja, teve dois "líderes" e explosão de tecnologia

Eugênio Augusto Brito, André Deliberato e Leonardo Felix Do UOL, em São Paulo (SP)
Lucas Lacaz Ruiz/Folhapress

Quem foi quem na "fila do pão" de carros em 2016?

Batemos um papo para relembrar os melhores e piores momentos do ano

Ano de aprendizado

À primeira vista, 2016 foi um ano complicado para indústria e mercado automotivos. 

Com o atrofiamento do mercado de novos, as vendas de carros de passeio e comerciais leves zero-quilômetro tendem a fechar o ano com queda de 17% a 20% ante 2015 nos principais segmentos. Em alguns nichos, a perda esbarra nos 50% -- e emplacar apenas metade de um ano que já não havia sido bom, como o anterior, é uma péssima leitura. 

Mas nada é assim preciso à primeira vista, nem a análise de um ano como 2016.

Se esperavam estar, na virada para 2017, entregando 4 milhões (ou mais) de unidades "zero-bala", encarar a realidade de 2 milhões de unidades (ou menos), mesmo nível da década passada, fez fabricantes se esforçarem para fazer a conta de 2016 fechar.

Regras automotivas definidas pelo último governo -- estabelecido em 2012 pela equipe de Dilma Rousseff, o Inovar-Auto é um plano de cinco anos que chega ao seu auge de metas de tecnologia e eficiência em 2017 -- também culminaram na melhoria (bem como no encarecimento) da frota nacional. E terão de ser revistas e ampliadas pelos novos governantes para 2018 e além. 

Albert Einstein, físico alemão que também ficou notório por suas frases de efeito, elencou no século passado as "Três Regras do (bom) Trabalho" como sendo "tirar a simplicidade da burocracia", "achar harmonia na discórdia" e "no meio da adversidade encontra-se a oportunidade" (em traduções livres).

São lições que as fabricantes tiraram do baú para sobreviver em 2016: quem pensou além e se preparou para a fase ruim já está colhendo os frutos e vai, certamente, ter bases mais sólidas para despontar quando o setor voltar a crescer.

Afinal, quem é líder?

Murilo Góes/UOL Murilo Góes/UOL

GM ganha sozinha

2016 promove uma situação curiosa. Considerando-se o ranking de carros de passeio da Fenabrave, a General Motors fecha o ano como líder incontestável, com 18% de participação. Na soma dos dois grandes segmentos (autos e comerciais leves), também: 17%. Onix (bicampeão geral), Prisma, Spin e S10 foram bons vendedores e guias desta "liderança sustentável" na opinião da marca. "Este foi também o ano em que conquistamos a liderança inconteste", afirmou Hermann Mahnke, gerente de marketing da empresa. Mas há quem faça outra conta...

Murilo Góes/UOL Murilo Góes/UOL

FCA ganha "em grupo"

... A FCA está reivindicando o topo do ranking para si, pois considera somadas as vendas de todas suas marcas (Fiat e Jeep, principalmente, mas também Chrysler, Dodge e RAM). Fiat (15,42%) e Jeep (2,87%), unidas, alcançam 18,3% de participação, fatia superior à da concorrente. De fato, pela Fenabrave, a "cabeça-de-chapa" Fiat lidera dentro do segmento de comerciais leves, como o sucesso das picapes Toro e da Strada. "A FCA se coloca como líder multibrand", afirmou Marco Antonio Lage, diretor da comunicação do grupo no país, durante balanço do ano.

Murilo Góes/UOL Murilo Góes/UOL

Grandes perdem juntas

De qualquer forma, o domínio do outrora "quarteto de ferro" GM, Fiat, Volkswagen e Ford caiu de vez. Calma: as quatro juntas ainda foram responsáveis por 53,3% dos emplacamentos entre janeiro e novembro -- o que é muito. Mas a fatia do bolo não para de cair e há novidade. Em "carros de passeio", a Hyundai já disputa carro a carro o posto de "vice" com Fiat (pouco mais de 11% para cada). E no geral (carros + comerciais leves) a marca sul-coreana tomou o quarto lugar da Ford (10% contra 9%, respectivamente). Toyota, Renault e Honda estão na cola e prometem crescer em 2017.

Segredos da líder GM

Onix e Prisma tiveram profundas mudanças em 2016

Murilo Góes/UOL Murilo Góes/UOL

SUVs, sedãs e picapes

Levantamento feito pela consultoria automotiva Jato Dynamics, a pedido de UOL Carros, mostra que nem todos os segmentos sofreram com a crise. Mas também evidencia o quanto as classes mais baixas foram as mais afetadas por ela.

Veículos de carroceria hatch, que em 2012 representavam 49,5% do total de emplacamentos (e que um dia já foram chamados de "carros populares"), agora detêm fatia de 42,9%.

Já SUVs, sedãs e picapes -- a "boa onda" de 2016 -- cresceram percentualmente: os utilitários-esporte saltaram de 7,1% para 14,9% nesse mesmo período; os três-volumes, de 23,4% para 24,25%; e os utilitários com caçamba, de 11,5% para 13,3%.

"Quando um segmento cresce, dá segurança para o consumidor investir e isso acaba beneficiando todos os participantes, mesmo com aumento da concorrência. Foi o que ocorreu especialmente com os SUVs", explicou Joel Leite, especialista em mercado automotivo e colunista de UOL Carros.

Pela Fenabrave, a variação da balança é sensível demais: carros de passeio "perderam" 0,5%, enquanto comerciais leves (onde se encaixam parte dos queridinhos do mercado) "ganharam" 0,5%. Não existe ganhos ou perdas reais, mas já indicam uma tendência de mudança e valorização.

Exemplo da valorização dos utilitários esportivos, aliás, não falta: Honda HR-V (mais uma vez líder da categoria) e Jeep Renegade foram, em 2016, os dois modelos com menor índice de desvalorização, segundo estudo da AutoInforme. Ou seja: quem ainda compra para revender em um ou dois anos perde pouco com estes modelos.

Quem é quem na fila de 2016

  • Hatches

    42,91% (-7,03% em relação a 2012). Fonte: Jato Dynamics. Destaque para UOL Carros: Peugeot 208 1.2, o mais eficiente do país

    Imagem: Murilo Góes/UOL
  • Sedãs

    24,25% (+0,86% em relação a 2012). Fonte: Jato Dynamics. Destaque para UOL Carros: Honda Civic, redefinindo o segmento

    Imagem: Murilo Góes/UOL
  • SUVs

    14,91% (+7,79% em relação a 2012). Fonte: Jato Dynamics. Destaque para UOL Carros: Jeep Compass, com equipamentos e espaço

    Imagem: Murilo Góes/UOL
  • Picapes

    13,35% (+1,88% em relação a 2012). Fonte: Jato Dynamics. Destaque para UOL Carros: Fiat Toro, unindo versatilidade e força

    Imagem: Murilo Góes/UOL

Civic: turbo e equipamentos...a R$ 125 mil

Toro ou Duster Oroch?

Logo no começo do ano, dono de Montana avaliou

Tecnologia tem seu preço

Em um mercado tão seletivo e restrito, é preciso estar sempre com a linha de produtos fresca. Lançar novidade foi o "mantra" de 2016: foram 74 lançamentos ao longo do ano, somando modelos inéditos, trocas de gerações, reestilizações, novas versões ou atualizações de trens-de-força. Mais de uma apresentação por semana.

Saltos enormes foram dados: olhe para as novas gerações de Honda Civic e Chevrolet Cruze, por exemplo.

Mesmo o termo "reestilização", o "tapa no visual" no meio do ciclo de um carro, mudou de patamar em 2016: Chevrolet Tracker, Fiat Uno, Nissan Sentra tiveram de promover mudanças radicais em estilo e equipamentos para não perder espaço.

"Uma das saídas para vender foi apostar pesado em inovação e renovação. Nós, que já fomos acusados de ter carros jurássicos e de boicotar programas de excelência, como testes do Latin NCAP (a marca foi cobrada pelo consórcio de segurança em janeiro) e Programa de Etiquetagem do Inmetro (consumo e emissões), mudamos praticamente tudo em 2016", disse Hermann Mahnke, da GM.

Claro, a corrida por carros mais eficientes foi impulsionada pelo Inovar Auto. Graças à fase final do programa governamental de estímulo ao setor, as fabricantes iniciaram uma forte corrida por motores mais eficientes e econômicos, quase sempre optando por opções com 3-cilindros ou turbo.

Infelizmente a evolução cobrando o preço -- ou as marcas cobram caro do consumidor: nos últimos anos, vimos um aumento expressivo no patamar de preço. Não existe mais carro novo no Brasil abaixo de R$ 30 mil; é difícil achar até mesmo uma boa opção abaixo de R$ 40 mil; qualquer aventureiro já custa mais de R$ 60 mil; e sedãs médios estão já chegaram (e cruzaram) à linha dos R$ 100 mil.

Cruze e Sentra flertam com luxo

Sedãs são cheios de tecnologia e têm visual interessante

Eduardo Knapp/Folhapress Eduardo Knapp/Folhapress

Quem venceu 2016? O seminovo

Mas, afinal, se nada é horizontal, tudo é cíclico, e se as pessoas ainda dependem de transporte, quem cresceu em 2016?

Olhe para o mercado de carros usad... ops, seminovos. 

"Falta de confiança e crédito", como resumiu Antonio Megale, presidente da Anfavea, tiraram o ânimo do mercado de novos. "O consumidor está com medo de se endividar, e aquele que não está tem dificuldades para financiar", enumerou o executivo.

Segundo a entidade, o índice de financiamento de zero-quilômetro em 2016 ficou pouca coisa acima de 50% do total de vendas, bem abaixo da média histórica (entre 60 e 65%).

Sem crédito, o consumidor e com preços de carros novos estratosféricos, o comprador olhou para trás, para o passado: foi procurar o mercado de usados.

"Em 2016 tivemos um fenômeno de valorização do usado. O brasileiro amadureceu nesse sentido, e aprendeu a analisar melhor as opções que têm", analisou o especialista Joel Leite.

Só o segmento de seminovos -- veículos com três anos de uso ou menos, que ainda possuem garantia de fábrica -- cresceu mais de 20% este ano.

Percebeu o cálculo? Novos caíram 20%, usad... ops, seminovos cresceram 20%. São eles quem darão as cartas por um tempo. 

Quem perdeu 2016? As chinesas

Se já apontamos quem conseguiu ganhar -- ou ao menos minimizar as perdas -- em 2016, a dúvida que resta é: e quem mais perdeu?

A resposta é direta: as marcas chinesas. Impactadas pela crise e sem condições de responder a ela com a mesma velocidade, as marcas do país asiático atrofiaram e perderam muita, muita força.

Por um lado, a JAC desistiu da fábrica. Agora, depende totalmente do sucesso do suvinho T5 CVT para não ter o mesmo fim da Geely: encerrar as atividades locais.

Por outro lado, a Chery tinha fábrica e "esqueceu" de fazer carros: investiu até o momento R$ 1,2 bilhão no país, mas vai terminar o ano com ínfimas 2 mil unidades vendidas.

"Nosso maior erro foi apostar no filão de entrada, justamente o mais afetado", admitiu Luis Curi, vice-presidente da Chery. "O que resta fazer agora é tentar estancar prejuízos", seguiu o executivo. Prepare-se: a marca quer renascer em 2017 apostando tudo em SUVs e sedãs -- a meta é vender 10 mil carros, sendo 6,5 mil produzidos em Jacareí (SP), uma fábrica de 150 mil unidades/ano.

"Só vamos poder voltar a pensar em volume grande assim depois de 2020", confessou Curi.

A Lifan, que traz apenas um modelo do Uruguai, foi quem se saiu melhor: continua a ter o espaçoso X60 como trunfo para manter a operação viável.

JAC aposta tudo em T5 CVT para se reerguer; saiba como anda

Curtiu? Compartilhe.

Topo